86.400
 
         O Sopro Divino espalhou vida pela face do universo, criaturas das mais diversas espécies povoaram a grande aldeia global promovendo um ambiente multicolorido de cheiros, de sons, de pensamentos e, por que não dizer: de amores.
         Dos viventes espalhados pelo Sopro, um, em especial, candidata-se ao maioral, ao perfeito, mesmo cheio de imperfeições; ao infalível, mesmo permeado de falências; esse ser é o homem.
         O bicho homem, na condição de superior, de dotado de inteligência, de sentimentos múltiplos: ódio, amor, coragem, covardia; desenvolveu um infinito arsenal de criações terrenas, dentre tantas, temos os diversos sistemas numéricos, culminando neste momento com o nascimento do meu personagem, 86.400.
         Surgido de um conjunto infinito, o dos números naturais, ele é: magnífico, esplendoroso, invencível, belo, formoso; transcende todos os limites do saber, é imponente e dominador de todas as coisas.
         O que o 86.400 é capaz de realizar, de engenhar, de materializar? É capacitado, simplesmente, para fazer todas as realizações, ele é digno de toda a nossa reverência e deferência, é uma síntese apoteótica, uma verdadeira deificação.
         O 86.400 vive perto de nós? Onde ele mora? Ele é factível? Sim, ele vive grudadinho a todos nós, humanos de todas as tribos, de todas as nações, de todos os credos, é indissociável de todas as criaturas movíveis e inamovíveis.
         Ele personifica a síntese do faz tudo, de que nós não podemos desprezá-lo, magnificamente ele governa todas as nossas ações, é o governante máximo, é: tirano, republicano, parlamentarista, democrata; tem aliados em todas as rodas de pensamentos e ideologias; além de ser discente e docente de todas as faixas de estudo, desde a mais baixa até as loucuras dos corolários inéditos do doutorado.
         Como estudioso das entranhas da alma e da psique, é 10 elevada a potência enésima mais forte que Freud, sabe tudo de nossos labirintos retorcidos de nossas vontades e vaidades, além de conhecer e dominar todas as nossas crenças e religiões do mundo, possui o domínio de todas as formas de metamoforses e miscigenações, é um verdadeiro mago no trato das misturas das infinitas porções da vida.
         O meu personagem deste conto maravilhoso é tão glorioso, que se repete quase que infinitamente, diria milhares de vezes, sem, contudo, ser enfadonho, ser apático, ser inepto, ser corriqueiro, ser desprezível. 
         O 86.400 é tão especial, que de tudo que falei d’ ele até agora, vou imergir no mundo do paradoxo, da contradição, contando-lhes um segredo: ele é tudo isso que relatei até agora, mas, é também: boçal, altivo, autocrático, dominador, pois não aceita nada de diferente daquilo que ele determinar.
       Assim sendo, finalmente, apresento-lhes o 86.400!!!! Simplesmente é um número magnífico, esplendoroso, divino, que representa a quantidade de segundos que nosso Deus, Poderoso e Misericordioso, Arquiteto Maior deposita todos os dias n’uma conta bancária chamada Vida.
      Depósito esse, que nós empreendedores mundanos e terrenos e, mais ninguém sobre a face da terra, pode aplicar, pode ceder para outro humano, pode hipotecar, pode especular.
         Na condição de humanos, só temos uma opção: usá-los; usá-los intensamente com sabedoria, com maestria, com dignidade, com ética, com moral e com escrúpulos; incondicionalmente não cedendo às facilidades e benesses do mal, jamais caindo na teoria do maniqueísmo e, sim, mergulhando de forma inequívoca, retilínea e linear nos mares da sensatez, do respeito ao próximo, do instinto gregário e da dignidade humana, até porque, talvez, não sejamos merecedor de mais um depósito de 86.400.