O resultado

Tentava se lembrar dos momentos alegres em que viveu. Dos amigos. Da família. De quem esteve ao lado nas pequenas alegrias da vida. Percebeu como essas pequenas alegrias, esses pequenos momentos, são tão importantes no fim. Não queria partir, pelo menos não ali, daquele jeito.

Era inútil qualquer esforço que não fosse o mental. Pensar era apenas o que lhe restava. Lembrou-se dos filmes que assistira na juventude. Da luz no fim do túnel, da aureola sobre a cabeça e das asas de anjo. Lembrou-se também das representações do inferno. Ele que odiava calor. Lamentou-se por ser tão tarde e não poder fazer uma boa ação e assim comover o porteiro do céu para que o deixasse entrar.

Distraiu-se a pensar nas possíveis companhias que encontraria no tormento eterno. Tantas figuras ilustres. Astros do rock, intelectuais sem religião. Mas encontraria também com Hitler, Pinochet, o que logo o deixou triste.

Pensou que talvez esses desgraçados maiores ficassem separados dos pequenos pecadores. Não é possível que ele, uma figura tão boba, que na vida só cometeu os pecados de não ir à missa aos domingos, beber de vez em quando, usar o santo nome de Deus em vão e saciar, quando lhe desse na telha, sua volúpia, sem muito critério. Divertiu-se em pensar nisso tudo, sorriu até.

Mas agora não adiantava, estava ali e não tinha mais jeito. Aos poucos chamavam os nomes. Começou a se desesperar, pois o seu logo chegaria. O que fazer num momento tão difícil?

Os nomes continuavam a ser chamados. Seu coração se apertava ainda mais. E agora? Era o fim. Pois era. Chamaram seu nome. Levantou-se da cadeira e foi conduzido por um longo corredor iluminado por uma luz branca, sendo escoltado uma figura trajando-se de igual brancura.

No fim do corredor a porta se abriu e deu para uma sala onde um homem de barbas e cabelos grisalhos o aguardava. Mandou que se sentasse e leu em uma ficha o seu nome, num tom que o inquiria sobre a veracidade dessa informação. Ele prontamente confirmou. Seu coração estava disparado. Temia o pior.

Ele não resistiu, teve de perguntar: “Então doutor, é câncer?” O médico, filho da puta que é, responde: “Não, sou áries.” “O exame, deu câncer?” “É apenas uma inflamação, mas receio que terá de ficar sem beber por ao menos vinte dias.” Foi embora triste do consultório.

Gilberto Junior
Enviado por Gilberto Junior em 09/04/2017
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