O dia em que joguei nas águas da praça
Era de manhã. Eu tinha dormido sem querer, ou melhor, sem opção na tua casa. Acordei primeiro e fui direto para sala voltar a ficar deitado e mexer no celular. Em seguida, tu acordas com aquele mesmo bom humor de sempre. A vida parecia uma pluma nos teus pés. Deu um bom dia com sorriso; convidou-me para passear na praça e tomar um café fora. Aceitei. Tomei um banho rápido e coloquei uma roupa confortável, mas fria e neutra. A manhã estava gelada. Logo após, foi ele fazer o mesmo processo. Já estava acostumado com o frio, então foi mais leve. Então saimos.
No caminho, ele foi puxando assunto comigo. Ele tem realmente uma boa lábia e gostamos de filosofar sobre as nossas vidas. Eu fui escutando e respondendo pouco durante o trajeto. Eu estava apático, seco. Por um tempo, ele ficou quieto ao perceber minha falta de prosa. Eu estava em outro plano. A sensação que tinha era que só tinha eu e uma outra voz, só para não sentir a solidão.
Perto da praça, ele oferece um café da manhã. Pão de queijo com chocolate quente. Uma boa pedida para esquecer a neblina fria que nos cobria. Eu nego a oferta, e pago o meu próprio café. Assim que saímos da lanchonete, caminhos em direção a praça, onde contamos nossos passos entre o verde cinzento e lago da praça. Ele me convida a sentar na beira da praça e sentamos.
O pequeno horizonte nos fazia entrar profundamente em nossas vidas. Ficamos em transe. Eu olhava o espelho d'água com serenidade. Era apenas eu naquela imagem. Logo, ele aparece e me pergunta da minha quietude. Eu desvio minha rota. Suspeitara que ainda estivesse com a raiva da negativa que me deu no dia do aniversário. Eu discordei, pois já tínhamos conversamos e isso seria uma bobagem. Ele insistiu com a mesma pergunta e - no fim - abri meu coração. Disse-lhe que fiz o possível para segurar uma amizade que, devia ter estagnado no passado. Ao envolver o amor e sexo, nos perdemos. Eu não suportei. Não digo pelo fato de ter sido objeto, mas dele ter se arrependido de mim. Foi uma dor inconsolável. Fora isso, eu já tinha notado que não tinha espaço na vida dele, pois nunca era lembrado, sendo que dizia: "devemos valorizar, tirar um tempo para nossos amigos antigos". Uma falácia usada contra mim. Fiz dele uma flor, que um dia tanto amei e cuidei, mas que tinha uma vida. Joguei-o no lago da praça, para nunca mais lembrar da tua existência. Eu o amo, mas não gosto mais. Nossas presenças não nos cabe. Vamos desejar apenas o bem.
Diante do meu desabafo, ele ficou sem fazer uma reação no rosto. Apenas ficou sereno. Apesar de negar que nunca me esqueceu e que era do gênio dele fazer isso, ele sabia bem que suas palavras não penetrariam em mim. "Que seja a tua vontade". Eu o agradeci por tudo que me fez. Não guardo mágoas, mas não nos merecemos juntos. Nos levantamos e fomos caminhando, quietos e lívidos para casa dele. Nem nos olhávamos. Nossas janelas estavam fechadas.
Ao chegar em casa, arrumei minhas coisas. Ele ficou na sala. Não queria dividir espaço comigo. Os irmãos dele entram no quarto e questionam se vou embora. Digo que sim. Eles pedem para que eu fique, mas inventei que precisava voltar. O garoto nem se manisfestou. Peguei minha mochila e deixei na sala. Ele entrou no quarto e trancou.
Ao me despedir dos irmãos dele e agradecer, eu bati em seu quarto e disse que precisava me falar com ele. Não fui respondido. Bati novamente. Ele abriu. Deitado na cama e com a alma seca, disse que devemos estar felizes, agora estamos livres. Torceremos um pelo outro, mas não seremos mais confidentes e nem frequentarei mais a casa. Ele me ignorou. Era o que precisava dizer. Perguntei se poderia dar um beijo na bochecha e apenas respondeu com um balanço de sim. Beijo-o e foi selo final. A flor finamente trafega pelas águas livremente. Peguei as minhas coisas e disse: "cuidem-se".
Antes de ir à rodoviária, fui novamente a praça em que nos juramos. Me lembrei de quando ele me apresentou e éramos as almas gêmeas; os amigos de vidas passadas. O verde clareava em contraste ao sol. Um quadro perfeito. Hoje foi o nosso desencontro. O local perdeu sentido, mas estava em paz. Com a palma da minha mão, beijei o chão que sentamos. Senti o coração e os ventos. Disse: "vá! Vai longe. Que passamos guardar as boas memórias". Fui embora para minha casa.
Meses mais tarde, em meio a novas histórias, estava rindo e vivendo o momento. Sem querer, deparo-me com ele. Nos cumprimentamos a distância. Fomos bem secos. Voltamos ao desconhecimento. Ele seguiu a rota. Eu continuei minha prosa, tentando me lembrar quem era ele.