AMIGOS IMAGINÁRIOS
Ana Clara cresceu no interior do Rio Grande do Sul. Desde pequenina demonstrou fascínio pelo período do plantio do trigo. Acompanhava os passos do seu desenvolvimento: germinação da semente à emergência da plantinha na superfície; aparecimento das primeiras folhas verdadeiras; os perfilhos; espigamento e maturação do grão, na companhia do bisavô Gael, que a chamava de Fadinha do Trigo.
Nos passeios pela lavoura, levava Mago, seu fiel amigo, um gato que adotara quando bebezinho, e um banquinho para descansarem as pernas.
Em dias chuvosos, Ana Clara ficava cabisbaixa. O bisa procurava distraí-la, lendo-lhe os clássicos da literatura.
Seu Gael, por várias vezes, deparou-se com a menina, no meio do trigal, a reproduzir os contos de fada. Quando questionada, respondia:
– Eles gostam tanto quanto eu.
– Eles quem, meu amor?
– O trigal, o Mago e os amiguinhos que vêm brincar comigo.
– Quem?
– Bisa, os meus amigos são diferentes de nós no falar e no vestir-se, mas eu os admiro; dão-me alegria e felicidade.
– Que bom! Quero conhecê-los!
– Vovô Gael está ficando velhinho. Quantas vezes já compartilhou de nossas brincadeiras! Coitadinho, está esquecido.
Seu Gael, pensativo, dirigiu-se, aos seus aposentos. Ana Clara precisava conviver com crianças da sua idade. Acreditava ter ela superado a fase dos amigos imaginários. Estaria contrabalançando perdas?
Constatar a nitidez com que a menininha via os amiguinhos foi preocupante. Dispensava os mesmos cuidados que recebia. Precisava colocá-la numa escolinha.
No dia seguinte, na hora do café, comentou-lhe que iriam a um colégio. Ana Clara perguntou:
– Posso levar os meus amiguinhos e o Mago?
– Hoje, não.
– Então não quero. Eles não sabem se virar sozinhos. Eu lhes dou amor e felicidade. Deixa? Deixa? Tu me amas e eu te amo. Juntos, somos uma família.
Ana Clara, após beijar seu Gael, correu na direção do trigal seguida por Mago.
– Venham! Venham! A vida nos chama.
– A que mundo pertence esta menina? Além de transpassar pureza e bem aventurança, cristaliza tudo e todos com simplicidade e doçura.
Após o almoço, o bisa e Ana Clara foram ao colégio. Tão logo chegaram, seu Gael foi explicando à diretora que estavam ali para matricular a garotinha. Era muito só e, nos últimos tempos, andava às voltas com amigos imaginários. Concluiu dizendo que, ao informá-la de sua decisão, ela, rapidamente, perguntou se poderia levar os amiguinhos e o Mago à escola.
– Senhora Diretora, como podes ver, minha bisneta está fantasiando muito. Talvez, eu seja o culpado, leio todo dia contos de fadas a ela.
– Seu Gael, os amiguinhos de Ana Clara aceitaram o convite e estão aqui.
– Senhora, não sou bobo nem louco. Me respeite.
– Calma, senhor. Eu também consigo vê-los. São seres espirituais e não irão atrapalhá-la em nada. Eles ainda precisam passar mais um tempo entre nós. Depois de cumprirem suas missões, seguirão seus caminhos.