gatumanos

Naquele tempo o dia tinha apenas dois momentos, o nascer e o pôr-do-sol. O resto do Tempo estava parado.
Naquele tempo não havia rios tingidos de sangue nem mares atulhados de lixo.
Naquele tempo a vingança chegara em naves vindas de um ponto perdido doutra galáxia.
Naquele tempo tudo era feito de raiz sem excessos nem defeitos.
Naquele tempo o Rei do planeta cuidava da sua casa.
Naquele tempo a moeda de troca era a sabedoria.
Naquele tempo o Homem ajoelhava e os animais e plantas suspiravam de alívio.
Naquele tempo as armas era as palavras.
Naquele tempo as palavras picavam a carne como garras,
amarravam as mãos como cordas
armavam as bocas como balas.
Naquele tempo a morte era limpa, simples e implacável,
num único golpe de sangue silencioso.
Naquele tempo o Rei da Terra convidava o vento a entrar e a sair conforme as suas conveniências.
As trevas chamavam às trevas o que era das trevas.
A luz chamava à luz o que era da luz.
O esquecimento chamava ao esquecimento o que era do esquecimento.
Tudo era ordenado e conhecido. Mas não era conhecido do Homem.
Naquele tempo o Homem era um punhado de cinzas a arrefecer na noite.
Naquele tempo o fogo jamais poderia existir sem ser domado.
Naquele tempo o medo estava em vias de extinção.  A raiva tinha sido erradicada sem vacinas.
Naquele tempo o Tempo estava parado. Tinha desistido de atacar.
 
AnaMarques
Enviado por AnaMarques em 23/12/2016
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