A Dança dos Servos
Aos poucos levantei-me com tontura, no fundo do que parecia uma cela minúscula, apesar de ter um aspecto familiar, tinha certeza de que jamais estivera ali, ao tocar na grade, ela se abriu lentamente, deparei-me com um imenso corredor sem janelas, apenas um raio de luz fraco vindo de uma porta na outra extremidade, que dava acesso a um outra passagem ainda mais estreita, porem mais comprida, com outra porta no final, assim sucessivamente, lembro de ter passado por pelo menos sete corredores que oscilavam as proporções de tamanho, e o locais onde as portas se localizavam.
Creio que era uma espécie de labirinto, embora houvesse poucas alternativas de rota, talvez a Intenção de quem construiu, não fosse deixar perdido aquele que por ali se aventurasse, mas sim o desestimular a voltar .
Nos últimos corredores, a luz brilhava com mais intensidade e já se podia ouvir um ruído constante de vozes resmungando, uma espécie de coral desafinado que oscilava entre gritos e sussurros abafados por um mordaça.
Da ultima porta, parei sobre a soleira e fiquei a observar com máximo de descrição, temendo ser algo que pudesse comprometer a minha segurança, notei que era um tipo de festividade ou celebração. Com receio e sendo extremamente cauteloso postei-me a diante. Para minha surpresa, não ouve reação alguma das pessoas ante a repentina aparição.
Era um salão, tão grande que não poderia calcular seu tamanho apenas com os olhos, impossível também constatar a sua altura, face a uma concentração de nevoa que cobria toda a sua extensão.
Pequenos lustres com velas, presos a correntes que desciam da nevoa, e emitiam sombras fantasmagóricas das pessoas que vagavam em gestos ensaiados, bailando em uma coreografia indefinida. Trajavam roupas alegóricas de várias cores e formatos. A expressão facial era uma espécie de máscara padrão, com um sorriso uniforme e plastificado que remetia a uma felicidade doentia, de quem flerta com a face mais vil da natureza humana . Os olhos, eram profundos e opacos, apenas um vazio mórbido. Pensei ser uma encenação, espetáculo ou um ritual religioso, mas não consegui chegar a qualquer conclusão imediata, exceto de que aquilo desencadeava um profundo desconforto na alma.
Alguns vagantes perceberam minha presença, mas mostravam-se indiferentes. A multidão preenchia o lugar, ate onde a vista alcançava, saltos rodopios, acrobacias, não de forma sincronizada, mas os movimentos eram exatamente iguais, alguns o executavam com a leveza de bailarinos profissionais, outros de maneira desajeitada e sem classe alguma. Era uma sucessão de passos e gestos que compunham uma marcha aparentemente caótica, mas quando observada minunciosamente, notava que havia uma ordem definida, a suposta dança, além de desespero, expressava uma profunda solidão, cada um bailava como se ignorasse tudo ao redor, e por mais sinistro que pudesse parecer, não havia hostilidade.
O ruído uníssono feito pelos murmúrios, davam ao lugar o aspecto de uma prisão, ou sanatório, e aquele estranho carnaval se assemelhava a delírios que por vários momentos pensei, não ser fruto de minha imaginação.
A impressão era que aquelas criaturas estavam fadadas a cumprir uma sentença. Toda a alegoria e as mascaras já não disfarçavam o pranto emitido.
Senti-me familiarizado ao caminhar pela multidão. O nada que preenchia os olhos daquelas mascaras, de certo modo refletiam o vazio em mim, motivo este que poderia ser a justificativa da indiferença deles ante a minha presença.
De repente tudo parou, o silencio tomou conta, e todos permaneceram inertes em diferentes posições todo ruído cessou de maneria abrupta, não ouvia se quer o barulho da respiração ou farfalhar dos tecidos.As corrente que seguravam os lustres foram recolhidas lentamente, adentrando a relva que tomava o lugar, ate a escuridão preencher por completo, a medida que o breu consumia, senti a gravidade cair e o corpo ser tomado por uma leveza que fez-me involuntariamente levitar. em um acesso de panico não me ative a ver o que ocorreu com aquelas pessoas. Não encontrei nenhum explicação racional capaz de justificar, exceto que, poderia eu estar eu diante de uma irrefreável consequência, Este foi o ultimo pensamento que tive antes do vazio consumir-me por inteiro.