On my mind

Sentado em uma mesa, daquelas com luzes apenas sobre ela, provando sua bebida favorita, mangas dobradas até o cotovelo. O banco de couro, lembra a pele que tocara uma única vez. Um sorriso, discreto, recorre à sua boca. Foi bom. Não, ótimo.

Ele diria... extasiante..

Havia um pianista, dos bons, tocando jazz, ou blues, tanto faz porque a vontade era não estar ali, apenas lá. O silêncio ocultava as outras mesas, talvez dos mesmo pensamentos que os seus. A loirice do cabelo dela eram lembranças irrefutáveis que algo o transformara, ou pelo menos o fazia lembrar de bons momentos dentre tantos ruins. Fiquemos só com os bons.

A bebida que sorvia lembrava o gosto do beijo molhado, que compunha uma melodia, que ele cantarolava quase todo o tempo. Sua mão abraçava o copo como fez com ela, e ela com ele. Um encanto sussurado para aquele momento. Estava só. Não, estava acompanhado do pensamento. Então estava bem.

Mordia o canto dos lábios, um misto de mania e prazer, quando o momento pedia. Seus pés acompanhavam a canção solitária dedilhada pelo pianista. Naquela vez dançavam, juntinhos, coincidência ou não, a mesma música de agora. Pediu outra bebida, queria fumar, mas não andava com seu cachimbo. Era intrusivo demais, e também ali não era permitido. Mas se permite sonhar?

As horas foram indo, minuto a minuto, fazendo horas. Parecia um tempo enorme. O sorriso continuava a passear sobre sua boca, como um rei vitorioso, incisivo, resoluto. A luz continuava a iluminar seu mundo, que era a mesa, o assento, o copo e... bom, faltava seu par.

Meticulosamente mexia na bebida, que se agitava como ondas mansas sobre as pedras...de gelo. A dança suave dos pés lhe causava um compasso, como os passos entre os dela. Por que não lhe disse algo para que ficasse? Que mulher misteriosa era aquela que fazia tudo parecer um, digamos quadro bem terminado, uma música bem feita..

Bom, agora tudo se foi e era hora de voltar. Para seu mundo real.

A música que lhe fez esse efeito de filósofo pensante?

Claro, Georgia on my mind de Ray Charles. Claro! Ela habitava seus pensamentos, mesmo que tão longe como a Geórgia.

Scrittore
Enviado por Scrittore em 02/10/2016
Reeditado em 16/04/2018
Código do texto: T5779346
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