O colóquio

Maria nutria por Cris grande carinho e gratidão, pois em vários momentos a amiga foi um presente, e sabia que era recíproco. Em vista disso, a necessidade de um diálogo, de esclarecer qualquer mal entendido ou dúvidas que pairasse entre elas. Assim, convidou-a à sua casa.

Cris sobe as escadas em silêncio logo atrás de Maria como quem acabou de perder um ente querido. Uma sombra negra se acerca delas. Ali, onde outrora encontravam-se com alegria... Entram, quase abruptamente! Nunca tiveram cerimônia, no entanto, Cris para diante do sofá. Maria diz a amiga para sentar-se. Ela olha-a profundamente como quem quer arrancar uma confissão. Com os olhos em furor dirige-se a Maria: - Diz! E Maria tenta dialogar. Porém, embaraça-se com as frases, pois sem o hábito de embates seu vocabulário lhe escapa, fazendo com que pareça culpada.

Conta as razões que a fizeram adiar a conversa, pois percebe que a única acusação cabível é o fato de não ter lhe exposto o acontecido no momento em que Cris julgou ser apropriado. Porém, nota que qualquer justificativa será em vão, já que a amiga está em carne viva. A dor dela é dilacerante, um autoflagelo, golpeia-se imaginariamente e afirma estar em luto. As lágrimas vez ou outra lavam a sua face, como se escorressem memórias de um verde-mar...

Cris, embora diga não querer falar dele, o assunto foi ele o tempo todo, afinal, o causador, de que consequência ainda não se sabe... Em estado de penúria, de uma dor que esteve estanque por anos, agora à flor da pele, não por tudo que o sujeito lhe causou, mas por temer tê-lo perdido para sempre, parece. Noutras épocas Maria presenciou essa dor, só que agora mais grave, pois ainda que não fosse de sua vontade fora envolvida. E há de carregar a culpa por existir.

Em sofreguidão, quase ao término da conversa Maria oferece um café, para que a despedida não pareça um fim. A princípio Cris não aceita, ainda assim, ao longo do diálogo, Maria oferece novamente e ela não recusa.

Logo, fica nítido que Maria foi um "bode expiatório" na história dos dois. Ela crê que o infeliz alcançou seu objetivo de alguma maneira ao lançar a isca, ainda que, contrariamente, tenha caído sobre si também. Por conta disso, a amizade das duas que tanto o incomodou, se não findou, coisa que só o tempo dirá, ficou deveras estremecida.

Tenta girar a chave para ir embora, mas Maria apropria-se suavemente e abre a porta, lembrando uma superstição... Cris põe termo à conversa e diz a amiga que precisa de um tempo reclusa, e que ainda dançarão juntas nas areias da praia. E afirma: Deixa passar esse "frio", deixa chegar o verão... E despedem-se, sem um sorriso, sequer...

Nalva Sol
Enviado por Nalva Sol em 19/08/2016
Reeditado em 31/10/2016
Código do texto: T5733746
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