CILADA

Toda cidade tem seus encantos. Algumas se destacam pelo turismo, outras pelo mercantilismo, outras por suas belezas naturais e ainda outras são possuidoras de atraentes complexos industriais. Enfim, cada qual cativa sua população e seus excursionistas com o que supostamente tem de melhor.

Em meio às grifes, salões e festas encontrava-se Louise. Uma morena jovem e atraente, dona de uma pele que, quando tocada, assemelhava-se ao veludo. Seus cabelos castanhos acobreados, levemente ondulados e de agradável maciez, deslizavam sobre os ombros encobrindo-os como pura seda. Possuía olhos penetrantes, que davam a impressão de ler a alma de quem os fitasse.

Extremamente vaidosa, procurava estar sempre em dia com sua beleza. Cuidava-se com cautela, pois tinha em mente um único fim: tornar-se cobiçada e se deixar possuir por quem a almejasse. Mas, por trás deste desígnio havia uma charada... Era uma das mulheres mais bonitas, desejadas e ambiciosas da cidade, sempre vista sob escolta dos homens mais ricos e importantes da sociedade local. Todos desfilavam em sua companhia tão orgulhosos, que a exibiam como quem expõe um troféu.

Louise, por sua vez, os via apenas como simples objetos de prazer e lascívia. Brinquedinhos, talvez. Ao deitar-se com eles, sentia que uma força a envolvia e a transformava em uma espécie de maga, capaz de submetê-los a seus caprichos. Num dado momento, porém, seus amantes adotavam o mesmo rosto: A face do homem que para ela era simbolizava o inatingível.

A “retribuição” pelas noites de amor era certa: roupas, jóias, dinheiro... Quem a possuísse nunca esqueceria a forma como ela amava; era única e pessoal. Louise conhecia todos os pontos de prazer de seus amantes e deixava-os alucinados em cada encontro, pois sabia que sempre voltariam a procurá-la.

Consideraria-se a mais feliz e completa das mulheres se não lhe faltasse algo que a preenchesse por inteiro: o amor de Lucas. O único que não se deixou seduzir pelos encantos de Louise, que, por diversas vezes, insistira para que se “conhecessem melhor”.

Lucas era noivo e amava Cecília. Mas, como todo homem é instigado pelo apetite carnal, sentia-se balançado todas as vezes que, sutilmente, Louise o procurava. Trabalhava em uma joalheria e, sempre que possível, era agraciado pela presença da bela Louise. Tímido, cauteloso, pacato e integralmente correto em tudo o que fazia, era o contrário de Louise que acreditava na atração dos opostos.

Seria um dia comum para ela, não fosse a vontade incontrolável de ir ao centro comercial donde sempre saía carregada com imensas sacolas. Realizados seus desejos consumistas, foi até o carro, guardou seus pertences no porta-malas, olhou-se fixamente no retrovisor, sorrindo sarcasticamente. Então dirigiu-se à joalheria onde Lucas trabalhava.

Naquela tarde, encontrava-se indefinidamente linda. Sua morenice se destacava no traje branco ligeiramente sexy e profundamente sedutor que cobria seu corpo. Estava extremamente atraente e roubava olhares de homens e mulheres que por ela passavam.

Lucas arrumava uma prateleira nos fundos da loja quando percebeu a presença de alguém à porta e, percorrendo com um olhar curioso a entrada da loja, assistiu a entrada triunfal daquela mulher que trazia nos olhos a verdadeira razão que a induzira estar naquele lugar.

Lucas sentiu tremer as entranhas, pois nunca a vira tão linda como naquele momento. Louise o presenteou com o melhor e mais bonito de seus sorrisos e o cumprimentou afavelmente, solicitando que lhe fossem apresentadas as jóias mais bonitas que possuía. Nervoso e embaraçado, Lucas sentia-se perdido diante de Louise que, interiormente, divertia-se com a cena que provocara e sentia-se cada vez mais excitada. Olhava-o com tal penetração, que Lucas sentia-se despido desde já.

Então, pôs em prática seu plano maquiavélico. Solicitou o toillete e, sendo conduzida por Lucas, simulou uma torção no tornozelo. Lamentando-se, apoiou-se nele que, gentilmente, a tomou nos braços e a levou a uma saleta depositando-a delicadamente sobre um divã. Perguntou-lhe se desejava algo ou em que poderia ajudá-la. Louise pediu-lhe que retirasse seus sapatos, pois a dor era insuportável. Obedeceu prontamente e, sentindo em suas mãos as pernas sedosas daquela magnífica mulher, mostrou-se ligeiramente perturbado.

Percebendo que a situação em que o colocara lhe era favorável, Louise pegou as suas mãos de Lucas, solicitando-lhe uma massagem local. Que situação para ele... Sentia-se embaraçado e não sabia o que fazer: se atendia ao pedido de Louise ou se a levava ao ortopedista mais próximo. Mas, como grande era a insistência dela, não via outro remédio senão atendê-la.

Iniciou-se a sessão de massagens. Lucas ainda não a tinha tocado com tanta intimidade, mas Louise o deixara tão fora de si, que quando retomou a consciência, já estava acariciando suas coxas. Quis parar, mas suas mãos e seus sentidos não o obedeciam mais e ao olhar para ela, via seu próprio reflexo em seus belos olhos.

Louise tomou suas mãos e as beijou. Em seguida, o fez tocar em seus lábios macios, carnudos e extraordinariamente sensuais. Ele não acreditava no estava acontecendo. Por que sentia seu corpo queimar de desejo por esta mulher? Lutava contra si mesmo, mas Louise o tocava com tanto encanto, que acabou se rendendo aos seus próprios desejos. Notando a rendição de seu amado, Louise beijou-o com avidez, olhou-o fixamente, calçou os pés e se foi.

Lucas ficou prostrado no chão, sem entender o que acabara de acontecer. Sentia-se usado e enganado por aquela mulher. Estava completamente em suas mãos, tinha-se doado àquele momento e não esperava tal atitude de Louise. Afinal, o que ela quis me mostrar? – refletia. Permaneceu pensativo durante todo o dia, querendo desvendar o enigma que se formara em sua mente.

Louise permanecia serena e confiante com que acabara de fazer. Sorria como há tempos não fazia, tratando de arrumar seu quarto, depositando flores e aromatizantes, além de pôr um novo edredom em sua cama e vinho para gelar. Estava bastante animada e sabia que, logo, logo, concluiria o ato que iniciara. Escolheu sua lingerie mais sexy e seus melhores perfumes. Vestiu-se, penteou-se sensualmente e aguardava ansiosa pelo incerto.

Por outro lado, Lucas entendeu a suposta “jogada” de Louise e decidiu, também, fazer parte do jogo. À noite, dirigiu-se ao apartamento dela. Ao lhe abrir a porta, convidando-o a embrenhar-se no recinto, Louise estranhou a forma segura com a qual Lucas se apresentou, mas o que importava? Ele estava lá, diante dela, em sua casa e quem sabe estaria, também, em sua cama.

Conversaram pouco e Louise, astutamente, dissimulou um pedido de desculpas, seguido por uma súplica que simbolizava uma forma de sentir-se perdoada. Lucas levantou-se e, dirigindo-se ao aparelho de som, escolheu uma trilha sonora romântica. Voltou-se para Louise que o observava atentamente. Ele pegou suas mãos e as beijou, solicitando-lhe permissão para uma dança. Ela não acreditava no que acontecia. Seria o mesmo homem? Tudo não passaria de um sonho?

Enfim, estavam dançando e seus corpos já estavam atraídos e penetrados mutuamente pelo desejo ardente do sexo. Beijaram-se e, de forma voraz, despiram-se como se estivessem esperando há um longo tempo este acontecimento. O corpo de Louise era bastante convidativo ao toque e a exploração e Lucas, que nunca tinha possuído uma mulher com tantas virtudes físicas, não poderia deixar de experimentá-lo e nele satisfazer-se, desde os lábios à genitália. Era um corpo novo e desconhecido, que logo tratou de deixar mais evidente para si.

No chão da sala havia um tapete incrivelmente confortável, tanto que quem pisasse nele não poderia ver seus próprios dedos. E ali mesmo fizeram amor. Se amaram, se consumiram, se devoraram... Era uma mistura de desejo e premiação, cobiça e bel-prazer. Era inexplicável o que sentiam... Durante toda a noite e no desenrolar da madrugada, seus corpos não cansavam de se descobrir, nem de explorar os cômodos da casa: sala, quarto, banheiro...

Nada e nenhum lugar escaparam de presenciar a forma como se amavam. Louise vivia a realização de mais um de seus caprichos, enquanto Lucas a experimentava inteiramente.

Encontravam-se extasiados sobre a cama quando, friamente, ele levantou-se e começou a se vestir. Louise não entendeu o porquê daquela atitude e pediu para que ficasse mais um pouco. Afinal, aquele seria o início de tudo, a primeira de muitas outras noites... – tentava comunicar-lhe.

Ele a olhou fixamente, lançando-lhe um olhar seco e gelado que a penetrou, percorrendo seu íntimo. Virou-se, beijou-lhe a testa, dizendo que ela já tivera o que queria, “uma noite de amor” com mais um de seus objetos de prazer e que não fazia sentido algum que ele permanecesse ali, pois tudo havia sido consumado.

Impulsivamente, Louise o segurou pelo braço e disse que o amava de forma sincera e verdadeira e que o fato de ele estar ali, significava que também a amava, a deseja, a queria. Mas, Lucas estava seguro de seus sentimentos e deixou muito claro o que sentia por ela: NADA. Tudo não passou de sexo...

Transtornada e incrédula no que via e ouvia, não conseguia raciocinar, tampouco organizar suas idéias. Estava abalada demais para impedi-lo de ir embora, ao vê-lo cruzar a porta.

Em pé, em meio à sala, completamente despida de corpo e alma, permaneceu silenciosa, até o momento em que se lançou ao chão percebendo que havia desafiado o próprio destino e, tentando trapaceá-lo, fora enganada por ele.

O laço que armara para Lucas transformou-se em uma armadilha para si mesma, que a aprisionou em um cárcere de amor e ódio. Dois sentimentos que marcham lado a lado sem se misturar. Caíra na emboscada cruel do amor, num precipício de onde jamais sairia. Imergiu-se num poço de lágrimas e dor, que a fizeram perceber que havia caído em sua própria CILADA.

Lenna Ventura
Enviado por Lenna Ventura em 20/07/2007
Código do texto: T572256
Copyright © 2007. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.