A MENINA E A COBRA
Conto de:
Flávio Cavalcante
Conto de:
Flávio Cavalcante
O estranho gosto daquela menina que mora na casa do lado esquerdo da padaria. Não me recordo o nome dela, mas Deus me livre nunca me aproximar daquele lugar tão temido por todos. Dizem que ela adotou e até dorme com uma enorme cobra que ela trata com muito amor e carinho. Eu nunca vi, mas todos da rua comentam e como diz o mais antigo dito popular que a voz do povo é a voz de Deus, passei a acreditar que maus os comentários faziam sentido. É um mistério e confesso que fiquei na curiosidade de saber se é verdade ou não. A menina e a cobra é uma história ou um estória? Dizem que ambas são afins, como irmãs gêmeas; a menina entende a cobra e a cobra entende e obediente à menina. Ela gosta da cobra e a cobra se amarra nela como quem está agradecendo o carinho recebido pela anfitriã.
Numa certa manhã fui passando pela porta da casa da menina. O portão estava entreaberto e ouvi um gemido do qual nunca ouvi nada parecido e me peguei pensando? Será o gemido é de fato da menina? Ou será o que gemido vem da cobra? Aquilo me preocupou mais uma vez. O filme não parou de passar na minha mente. Os gemidos martelavam dentro dos meus ouvidos me torturando cada vez mais. Algo me perguntava se a cobra estava acuando a menina ou a menina estava maltratando a cobra? Parei diante do portão e pensei duas vezes se ia ao encontro da menina que podia estar com a cobra.
Uma loucura dessa forma acho que também nunca aconteceu com alguém. Pois aconteceu comigo. Será que eu estava ficando louco, esquizofrênico, com o tremor que subia desde as minha entranhas até nuca? Meus dentes gritavam de bater um no outro. Um frio repentino veio de onde eu não sabia em pleno sol causticante. Será que seria medo cobra da menina ou de a menina aparecer repentinamente com cobra?
Não conseguia sair do lugar. Minha pernas estavam travadas em ter reações tão contundentes e repentinas, o que não me deixa de hipótese alguma abandonar aquele local, logo na hora que a porta da menina e a cobra estava entreaberta. Um turbilhão de informações tomaram conta do meu ser. Será que a menina saiu ou será que a cobra fugiu? O suor então descia gélido pela minha coluna vertebral e desceu me fazendo arrepiar até os finos pelos que ainda adornavam à bunda, tentando vencer o medo da cobra e rezando que a menina aparecesse sem a dita cuja.
Por azar meu, o vento soprou mais forte do que o esperando e o ranger do portão entreaberto delatando naquele momento do meu suplício que estava urgentemente precisando de algum lubrificante em suas dobradiças, fez-me ter uma leve sensação de uma cólica abdominal. Pensei que a cobra rasteirava pelas brechas daquele velho portão e estava querendo me dar um abraço mostrando suas presas afiadas. Tentei gritar chamando a menina mas o medo tomou conta do meu ser, arregalando os meus olhos tensos e já brilhando de molhados por causa daquele momento de terror. Nesse instante eu não mais sabia se era o medo da cobra ou era a maldita cólica que aumentava gradativamente. Nem soltar uma bufa eu podia, porque aconteceria duas situações constrangedoras; chamaria a atenção da cobra ou morreria de vergonha vendo a menina ouvindo o zumbido de um orifício morrendo de medo da cobra. Contudo por outro lado, poderia receber da menina pelo menos um papel limpa bunda. E se a menina não aparecesse?
O relógio não parava de correr com seus ponteiros, a menina com a maldita cobra não dava nem o ar da graça, minhas cólicas abdominais chegaram ao limite máximo que o ser humano pudesse aguentar. O resultado surpreendente desta saga da menina e a cobra resultou em acordar com o um odor nauseabundo dentro do meu quarto e com os quatro dedos da minha sogra marcados na cara me chamando de porco imundo. Estava eu esvaído em cocô, ainda tonto sem saber nem onde estava. A única coisa que eu tinha lembrança era a vontade louca de saber se existia de fato a menina e a cobra.
Flávio Cavalcante