Gira pro Sol, Violeta!
— Bom dia!
Violeta ouviu, mas achou que devia ser com outra. A voz insistiu:
— Ei! Bom dia!
Ela, que andava sempre cabisbaixa, esticou o pescoço e imediatamente arregalou os olhos. Um girassol enorme, em vez de girar para o sol, resolvera girar para sua sombra.
— Olá! — Ele abriu um sorriso nada amarelo.
— Oi... — Violeta respondeu num fio de voz. Antes que pudesse evitar, seu olhar assustadiço fugiu para a grama.
— Viu que dia lindo? — a voz continuou animada, apesar do corte seco.
— Vi...
— Mas você não gosta muito de sol, né?
— Não...
— OK, já vi que você não gosta muito de conversa também... — ele murmurou. — Vou te deixar em paz, então.
— Tá...
Girassol não desistiu. Na esperança de que Violeta se abrisse um mínimo que fosse, sussurrava-lhe um “bom dia” toda manhã, mas nada de ela lhe dar bola. "Que diabo de flor tímida", resmungava consigo, sem saber como pretextar uma aproximação. Pareciam opostos em tudo: tamanho, cor, temperamento. Ele grande, aberto, colorido daquele amarelo quente como o sol, sempre em busca da luz; ela pequena, fechada, fria na cor e na conversa, sempre escondida nas sombras. Monocromática, monossilábica, monorcórdia... monótona. Mas o girassol seiva boa, encarregando-se da missão de ajudar a violeta medrosa, deu um tempo num dos seus bronzeados vespertinos para esticar sua sombra até ela.
— Obrigada. — Dessa vez ela arriscou uma olhadela de esguelha, ainda toda séria. Fosse uma bromélia ou tulipa exuberante, poderia até ter puxado conversa, mas não passava de uma violeta sem-graça.
— Imagina. — Ele abriu de novo seu sorrisão contagiante. — Melhor mesmo eu evitar esse sol direto nos miolos, ou ainda acabo pegando um câncer de pétala. Também preciso de uma sombrinha de vez em quando!
Isso fez Violeta abrir seu primeiro sorriso. Girassol, agora mais seguro de si e já querendo fazer média com a família da moça, espiou o arbusto onde se aglomeravam cerca de meia dúzia de violetas fechadas e tristonhas, cada qual encolhida na sua sombra. Complicado. Era melhor ficar na dele e deixar que o tempo trouxesse uma troca maior de palavras, ideias, confidências. Outro dia se esticou de novo, dessa vez sem qualquer pretexto além da vontade de ficar junto. Não era manhãzinha, quando ainda não despertamos por completo, nem noite, quando já estamos cansados. Era começo de tarde, o ápice do dia, da vitalidade, da energia. Violeta não sabia o que diriam, mas se o próprio Girassol estava lá, todo oferecido, todo quente, tanto física como cromaticamente... "Ora, estamos todos no mesmo jardim", pensou, chegando-se mais para perto também. Caules e folhas se roçaram, pétalas farfalharam. Deus, que coisa boa! Estava resolvido. Violeta, que apesar de tímida era curiosa, e apesar de curiosa era cautelosa, embarcou com reserva na aventura colorida.
A manhã seguinte foi diferente de todas que já conhecera, iluminada talvez, além do sol, pelo seu próprio sorriso radiante, que a segunda irmã a acordar logo notou e chamou uma outra para ver:
— Vi! Vi! A Vivi desabrochou!
Violeta estava mais bonita que nunca. A maior parte da família recebeu a notícia com festa; a menor, pequenininha, com críticas sussurradas nas sombras, de nariz torcido — coincidência ou não, vindas logo das irmãs mais murchinhas. Girassol, por seu lado, não poderia estar mais feliz. Toda tarde esticava-se para Violeta, para aquele abraço gostoso. No decorrer de um ano, viam-se entrosados como sequer um dia acreditaram possível: ele aprendera a apreciar um pouco de sombra e tranquilidade; ela, sol e diversão.
Descobriam, afinal, que talvez não fossem tão diferentes quanto se pensava.