MATANÇA

“Porque a meu lado tudo se faz tarde:amor, gozo, ventura”.(Hilda Hilst)

Pastosidades. O que além-gozo? Nojo. O mesmo asco que nos acompanha em todos os mesmos instantes momentâneos da vida. Nojo colado às quatro extremidades da vida e além. Flashes de felicidade????? Como sabê-la velicidade fida felicida vidicidade vida felicidade????????? Como onde quando a certeza de que o que sinto é Isso?

Aguilhões, agulhas, farpas. Objetos pontiagudos-mil saídos do corpo de uma fêmea. Funduras peles pêlos seios sorrisos. Tudo aquilo que Corpos cortantes, fagulhas, facas podem ofertar à dor. Rima perfeita. E sua negação.

Matança. Assim a chamavam. Coisas da mãe. Caridade, a mãe. Mulher-fera que se fez mãe adormecendo o corpo-faca. Como todas as fêmeas que saem do cio de viver e se entregam à lucidez pálida do estado mater. Matrimônio-morte. Estado de sítio este, adorado pelas mulheres e de onde fogem as loucas, estas sim lúcidas de verdade. Obscenamente, como dizia outra louca, desconhecida. Apaixonadamente.

Por que mãe? Por que não Violeta, Lua, Estela? Nomes diáfanos. Sãos. Amora? Rosa? Nomes macios, fragrantes? Por que não um nome divino?

A linguagem não é culpada da existência da realidade, minha filha. Você foi a melhor coisa de minha vida, melhor que experimentar, melhor que viver, melhor que tudo. E quando uma coisa nos é tão cara, o que se espera é sempre a realidade concretude dos homens.

Logo soube das referências. Dos objetos do mundo. Logo soube da necessidade que as palavras têm de complementos. Complemento nominal.

A primeira vez que amou-sofreu. Uma flor no jardim. Eu a quero, pensou. Não é bonita, bem não cheira, mas a quero. Tocou-lhe as hastes, corolas. Floridos corpo coração. Exalando um perfume doido que a fez cair. Eu a quero, eu a quero. Eu a quero. Repetiu até adormecer ao lado da amada-objeto.

Acordou no meio-noite e correu ao encontro da amada. O tombo. O grito. O asco. Amada sendo beijada por outro. Então é verdade? Isso existe?

Apanhou pedras paus palavras gestos. Tudo o que pode ferir e matar. Matou-os. Amada e amante. Flor branca, sem perfume, agora rubra cheirando à vida.

Prometeu: nunca mais me ferirão. De amanhecer toda minha delicadeza. De morte todo meu amor. Que eu fira antes de me ferir. Que eu mate antes de amar.

Se agiu como prometeu a si mesma? Não é sabido. Certeza é que todos agimos assim.

Mas sempre encontrou complementos nominais.

Seguiu seguindo as vias corporais possíveis, evitando qualquer contato-odor-vermelho. Qualquer que a lembrasse complementos. Sempre os encontrava: de saudade, de mãe, de amante, de desejo, de amanhecer, de animais, de árvores. O mesmo próprio para todos: Matança.

A mesma pergunta-resposta em toda sua caminhada de Matança: o que vem a ser isso de sonho e verdade? Vilicidade vidicidade vidacidade felicida felicivida felivida fida feda vida felicidade. A fala da mãe: A linguagem não é culpada da existência da realidade, minha filha.

O complemento último, quase objeto direto: matança de Matança. Sentimento único vida via vazia. Percebeu tarde que não se pode viver sem vermelho-vivaz. Apenas quando viu vida escoando de seu corpo-faca embainhado gritou: ainda amo aquela flor.

sahm rodrigues
Enviado por sahm rodrigues em 10/07/2007
Código do texto: T558898
Copyright © 2007. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.