A viagem indesejada.
A moto deslizava pelo asfalto, ora visível, ora quase imperceptível. Somente a lua determinava o que se podia ou não enxergar. O frio cortante faria simples mortais desistir. Ele acelerava. Fronteiras entre estados eram vencidas. Na escuridão da noite olhos de fantasmas marcando a falta de acostamento nas estradas. Eram animais das fazendas que viviam em vastos pastos que cercavam as pistas.
Na curva fechada um enorme caminhão, na contramão, vem em sua direção. O seu anjo da guarda com a velocidade de um super-herói transfere o traçado da moto para o acostamento esburacado. Alguns solavancos e a viajem volta a rotina.
O frio continua castigando os vivos. E a viagem não pode ser interrompida.
Centenas de quilômetros de estrada já foram percorridas, e, a noite insiste em não dar lugar ao dia.
Seu estomago grita para que ele pare. Não houve e continua.
Ele tem que fazer a entrega. É uma questão de vida ou morte. Sua família esta em perigo.
Disseram: entrega e serão soltos. Falhe e eles morrerão.
Sua esposa ainda não completara vinte e três anos e sua filhinha ainda de colo servia de combustível para seu coração ferido manter a coragem.
Sob a pressão daquele momento inusitado, nem mesmo olhara o que estava na pequena mochila. Colocou-a nas costas e saiu desesperado com os olhos em lágrimas.
Não se conformava! Homem modesto e humilde; apenas vinte e seis anos, uma vida inteira a ser construída. Sempre fizera da sua vida uma seqüência de ações corretas. Nunca roubara. Nunca havia prejudicado alguém. Sem passagem pela policia. Trabalhador exemplar Por que eu? Fazia-se esta pergunta o tempo todo. Rezava para que tudo desse certo. Queria voltar para sua modesta casa de dois cômodos e abraçar a esposa. E certamente brincar com sua filha querida, seu maior tesouro.
Adorava sua moto comprada a prazo. Uma longa jornada de trinta e seis meses quase no fim.
O tempo estava ficando curto. O relógio marcava duas horas e meia para chegar ao ponto determinado. Faltavam trezentos quilômetros para o local da entrega. O medo tomou conta dos seus pensamentos. A possibilidade de não conseguir fez o suor descer pelo seu rosto.
Deus! Gritou como um urso ferido e acelerou. Cento e cinqüenta, duzentos, duzentos e cinqüenta por hora.
Faltavam poucos quilômetros.
O dia estava amanhecendo. Finalmente a noite cedera. Pássaros. Muitos pássaros anunciavam a esperança de que tudo acabaria bem.
O lago, uma das referências, estava sendo contornado; parecia o mar de tão grande. As vistas não alcançavam suas margens. A curva sinuosa em alta velocidade acompanhava as artérias do coração, que funcionavam em alta freqüência.
Surpresa! Placas com voz de comando: diminua a velocidade. Várias placas.
Junto com a última. O ultimato. Pare! Era de novo o inesperado! Uma barreira surgida do nada. Ele acelerou tudo. O máximo possível...
Um tiro singrou o ar. A moto, agora manchada de vermelho escuro, tombou e o silêncio tomou conta daquela viagem indesejada.
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