A poltrona lilás

Da janela de minha casa, olho espantado a vida que pulsa á minha volta...

Lá fora, a despeito de minhas vontades e das minhas necessidades...A vida segue com seu ritmo naturalmente.

-É um pouco de vaidade e egoismo pensar que deveria ser diferente;a vida voltar a sua atenção para mim.E se não estivesse tão envolvido com a vontade de ser notado, acharia que este pensamento;tão embrenhado dentro de mim, um pecado chulo!

Mas eu encastelado, aprisionado em meu mundo,o que mais posso esperar?

Penso em levantar ãncora e com meu barquinho procurar novas praias...

Penso em colocar a mochila nas costas e procurar novas paradas; penso e apenas isso!

Desmontar acampamento,mochila nas costas, a frente do mar da vida, colocar meu barquinho nas águas, forçar a sua entrada nas águas, remar!Quanto trabalho!

-Esforço inútil!

E o peso do que me prende aqui?-A minha âncora!

E o passado, ainda em mim tão presente...

As lembrançasa, os amores vividos,resolvidos,os mal-resolvidos,os inacabados... Os mal começados, os natimortos e o vivo, que insiste que existe,que força meu peito a pulsar como um louco... Que me transforma a tristeza em riso,o riso em lágrimas, as lágrimas em sorrisos,o existir em vida e o resto em cotidiano.

Quanto a mochila ás costas, a alpargata nos pés,a estrada...

Quanto ao mar revolto das plagas sem fim das estradas...Será que eu realmente preciso viver esta empreitada?

Qual o peso em minha mochila,que penso que posso carregar?

Qual alpargata é ideal para proteger meus pés durante a jornada?

Qual o tamanho da estrada que eu quero percorrer?

Quantas perguntas, e assim divago, de pensamento em pensamento,nalfragando dentro das vontades insatisfeitas...

Insuspeitas covardias,fugas!

E assim volto á janela, um vento frio me toca a pele pálida!As cortinas dançam a minha frente, presas a parede.

Retrocedo, volto para dentro do aposento,me sento na poltrona lilás...Nem ao menos fechei a janela. É por ela que alguma vida me toca!É por ela que alguma morte me escapa!

Nos ouvidos um som de tempestade, uma penumbra vai inundando as minhas retinas, vou me recolhendo ainda mais a minha poltrona lilás,que acaloradsa vai me acolhendo...

Lá fora há vida e há a tempestade!

Eu cá amofinado, poltrona-homem,homem-poltrona, mimetizado espero.

Sou o homem lilás!