O MENINO CALADO.

O MENINO CALADO.

Era um menino raquítico, os olhos protusos guarnecendo um nariz pontudo que sobrepunha os grossos beiços, era educado sabia comportar na sociedade, falava pouco e quando falava já tinha passado a fala cuidadosamente por um filtro, tinha medo de ferir com palavras as outras crianças, sempre achou que a palavra corta mais que navalha de macaco. Nasceu num pequeno sitio, sua casa era simples mas ele via nela uma mansão,era um menino pensativo, sempre pensou que o que faz a casa são as pitadas de amor que cada um deposita em cada canto.Sua avó contava bons janeiros, e desde que entendia sempre o via ensinando com bons exemplos, seu avô era calado e tinha feição parecida com a sua, sempre calado a observar o mundo ,por ele nada escapava sem o registro da mente. O pai era meio treteiro , gostava de engambelar a mãe, tinha olhos para outras mulheres, a mãe sim, essa era uma santa, cuidava da casa, batia uma enxada, uma foice, moia cana para o melado, era uma mulher pura, digna de ganhar os adornos de ser mãe.O menino foi crescendo naquele meio noventa e oito por cento digno de desenvolver anjos. Foi ganhando corpo, a feição pouco mudou, ganhou pelos nas partes, uma barbicha rala no queixo , poucas espinhas no rosto, coisas que pouco mudou sua face. Sempre observando as coisas , gostava de ouvir padre Genaro lendo a homília, chegava a pegar o papel, mas nada via,como teve vontade de achar naquela página as histórias, queria pega-las com os rabos dos olhos e transforma-las em rios de felicidades, fixava o papel, nada além da folha.Foi introduzido no cabo do arado, nas coivaras , tornou-se um mestre no compasso da plantação, fazia bem a leitura do terreno e nele botava a semente adequada . Virou retireiro numa fazenda, sempre calado, cumpridor de suas tarefas, virou homem de confiança do patrão, se vinha um mal querencia ele alisava com belos ensinamentos. Era um rapazote bem sucedido, sua fama foi engordando, nos encontro dos grandes nas festas do gado, seu nome era badalado. Ele sempre um bom observador, mas uma coisa lhe faltava, queria ver as historias deitadas nas páginas, aquilo sim era conhecer grandezas. Pensava, mas Deus sabe das coisas. Um dia nestas labutas do homem do campo,conheceu numa casa agropecuária o senhor professor dono de uma grande estancia nos arredores, e conversa vai, conversa vem, o professor Antero gostando da sua prosa, perguntou seu nome,e o jovem foi incisivo, sonho, o professor coçou a longa barba, fixou a cara desajustada do jovem, leu a serenidade do teu olhar e progrediu a conversa. Sonho? Nunca ouvi falar de ninguém com este nome , forçou a barra , o jovem então explicou , meu nome de igreja e tabelionato é Ataliba Pontes, sou sonho, porque vivo de sonho, o professor encantado, com tamanha sabedoria , apertou o parafuso, torceu bem a chave, arrancar confissão daquela boca de fato era abrir mistérios. Ousou mais , sem pular etapa, chegou no cerne da madeira.

E qual seu maior sonho, o jovem pôs luz nos olhos , queria ver o mundo como ele de fato é, o mundo que está escondido nas páginas, o mundo que padre Genaro enxerga, o mundo dos tribunais, este aqui esparramado nesta saca de fertilizante, e apontou os dedos mostrando as orientações do fabricante. O professor sentiu a faca cravar o coração, entendeu que o jovem queria abrir os olhos. Abraçou o jovem e ali selaram o pacto da retirada das nuvens que encobre céus . Dedicou partes das noites ao jovem, eram letras subindo e descendo,livros saindo das prateleiras, união de silabas, frases, pequenos textos, resenhas, foram anos de prazeres, união de prazeres,o de ensinar e o de aprender. o jovem sempre assíduo, não perdia um momento, começou a ler placas, letreiros de sacos de surtimentos, mergulhou em Machado de Assis, Jorge Amado, e tantos outros, um mergulho sem fim, o mundo ia abrindo as páginas , cresceu, mostrando paisagens, botando possibilidades no seu pensamento. Professor Antero acompanhava de perto, e ajudando a retirar as pedras,os caminhos iam se abrindo, o céu descia em cada página que se abria, Ataliba não era mais cego via o mundo escondido das letras, não era mais só sonhos , agora era sonhos e realização. Ingressou na faculdade , era um moedor de paginas . formou-se em direito , virou catedrático , orador respeitado , quando ia aos grandes discursos sempre via o professor nas entrelinhas. Uma coisa que carrega para a vida é seu silêncio, grande observador, ia sempre a igreja com seus familiares, agora sim podia deitar os olhos nas homilias, não perdeu os costumes do campo, sabia ouvir, quando ia para o campo tirava os esses das palavras, não queria pisar nos antepassados. Casou com uma caipira de poucas letras, deu a ela seu mundo, não despertou olhos para outras mulheres, seu caráter era de uma via só, o mesmo do campo, bom observador, calado, ainda hoje colhe sabedoria do professor Antero , o tempo vai passando, vai moendo as épocas , Ataliba vai construindo sua evolução, não se da por satisfeito, acredita que sempre há mundos a serem descobertos.

Divino Ângelo Rola
Enviado por Divino Ângelo Rola em 03/02/2016
Reeditado em 04/02/2016
Código do texto: T5532621
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