-MAÇONARIA: SOBRE MESTRES E APRENDIZES
SOBRE MESTRES E APRENDIZES
Esta é a história de dois monges do budismo zen, a quem chamaremos de Humildade e Sabedoria.
Humildade era um monge analfabeto, que por não ter aprendido a ler e escrever, foi destacado para os serviços mais humildes que havia no mosteiro. Lavava as batinas dos outros monges, fazia a faxina, limpava as latrinas, ajudava na cozinha, podava as plantas do jardim, cuidava do moinho de orações e fazia todo tipo de trabalho subalterno que havia no mosteiro.
Trabalhava como um doido e mal tinha tempo para participar das orações rituais e assim pouco aprendia sobre a doutrina zen e sobre a liturgia que a acompanhava. Dessa forma, não fazia progresso na rígida hierarquia do mosteiro e ninguém, nem ele mesmo, esperava que Humildade se tornasse, um dia, um verdadeiro monge. Quando tentava, timidamente, participar das seções litúrgicas, era ridicularizado pelos mestres, que viam nele um aprendiz relapso.
Sabedoria, ao contrário, era o mais sábio monge que havia no mosteiro. Conhecia de cabo a rabo todos os ensinamentos e rituais. Sabia recitar de cor todos os sutras e mantras sagrados da religião, e era tido como o próximo Venerando Mestre do mosteiro.
Um dia, o Venerando Mestre do mosteiro pediu aos seus discípulos, como lição do dia, que escrevessem um pequeno poema para mostrar o que haviam aprendido acerca da doutrina do zen budismo. Todos escreveram os seus poemas, e a maioria deles era de ótima qualidade. Tanto que o Venerando Mestre pretendia fazer uma coletânea com eles para servir de ensinamento aos noviços.
Mas o poema mais esperado era o de Sabedoria, a quem se creditava ser o mais judicioso dos monges daquele mosteiro. Pois além de sábio e conhecedor profundo da doutrina zen, todos o tinham como um grande poeta.
E ele escreveu um belo poema que dizia:
“ O corpo é a árvore da sabedoria,
E o espírito é como um espelho brilhante.
Devemos espaná-lo e limpá-lo sem cessar
Para que nele jamais grude o pó.”
Todos os monges do mosteiro acharam o poema uma joia de sabedoria. Pediram que fosse colocado no quadro de orações para que todos os dias pudessem lê-lo e recitá-lo como mantra. O próprio venerando mestre o felicitou pelo belo trabalho.
Humildade, sendo analfabeto, não conseguia ler o gabado poema. Então pediu a um monge que o lesse para ele. Assim que o colega terminou a leitura, ele pensou um pouco e disse: “Gostaria também de fazer um poema sobre esse tema. Poderias escrever o que estou pensando?”
Ele ditou e o colega escreveu:
“O corpo não pode ser a árvore de sabedoria
Nem o espírito um espelho brilhante.
Pois se, na verdade, ambos são mera ilusão,
Onde, neles, há de grudar o pó?”
Os demais monges, ao ler o curioso poema, ficaram perplexos. Inclusive o próprio Sabedoria, que se sentiu, em princípio, afrontado pela crítica latente que o poema do monge analfabeto veiculava. E com certa arrogância, arrancou o papel do quadro e o rasgou.
Durante alguns dias Sabedoria meditou. Finalmente, uma noite, ele foi à cozinha, onde Humildade cozinhava o arroz para o jantar e perguntou a ele, com cara de poucos amigos:
― Já cozinhastes o teu arroz?
―Sim ― respondeu Humildade, sem se alterar. ―Podes ver que meu arroz é branco, mas precisa ser limpo ― completou, com um sorriso.
― Vem comigo ―, ordenou Sabedoria.
E os dois monges sumiram na noite escura. Desde aquele momento, ninguém, naquele mosteiro, os viu mais.
Dez anos depois, Humildade voltou ao mosteiro para receber a sua ordenação como Venerando Mestre. Junto dele vinha Sabedoria, agora convertido em seu leal discípulo.
(REEDITADO: adaptado do livro Cem Contos Zen, compilados por Massaharo Taniguchi)
SOBRE MESTRES E APRENDIZES
Esta é a história de dois monges do budismo zen, a quem chamaremos de Humildade e Sabedoria.
Humildade era um monge analfabeto, que por não ter aprendido a ler e escrever, foi destacado para os serviços mais humildes que havia no mosteiro. Lavava as batinas dos outros monges, fazia a faxina, limpava as latrinas, ajudava na cozinha, podava as plantas do jardim, cuidava do moinho de orações e fazia todo tipo de trabalho subalterno que havia no mosteiro.
Trabalhava como um doido e mal tinha tempo para participar das orações rituais e assim pouco aprendia sobre a doutrina zen e sobre a liturgia que a acompanhava. Dessa forma, não fazia progresso na rígida hierarquia do mosteiro e ninguém, nem ele mesmo, esperava que Humildade se tornasse, um dia, um verdadeiro monge. Quando tentava, timidamente, participar das seções litúrgicas, era ridicularizado pelos mestres, que viam nele um aprendiz relapso.
Sabedoria, ao contrário, era o mais sábio monge que havia no mosteiro. Conhecia de cabo a rabo todos os ensinamentos e rituais. Sabia recitar de cor todos os sutras e mantras sagrados da religião, e era tido como o próximo Venerando Mestre do mosteiro.
Um dia, o Venerando Mestre do mosteiro pediu aos seus discípulos, como lição do dia, que escrevessem um pequeno poema para mostrar o que haviam aprendido acerca da doutrina do zen budismo. Todos escreveram os seus poemas, e a maioria deles era de ótima qualidade. Tanto que o Venerando Mestre pretendia fazer uma coletânea com eles para servir de ensinamento aos noviços.
Mas o poema mais esperado era o de Sabedoria, a quem se creditava ser o mais judicioso dos monges daquele mosteiro. Pois além de sábio e conhecedor profundo da doutrina zen, todos o tinham como um grande poeta.
E ele escreveu um belo poema que dizia:
“ O corpo é a árvore da sabedoria,
E o espírito é como um espelho brilhante.
Devemos espaná-lo e limpá-lo sem cessar
Para que nele jamais grude o pó.”
Todos os monges do mosteiro acharam o poema uma joia de sabedoria. Pediram que fosse colocado no quadro de orações para que todos os dias pudessem lê-lo e recitá-lo como mantra. O próprio venerando mestre o felicitou pelo belo trabalho.
Humildade, sendo analfabeto, não conseguia ler o gabado poema. Então pediu a um monge que o lesse para ele. Assim que o colega terminou a leitura, ele pensou um pouco e disse: “Gostaria também de fazer um poema sobre esse tema. Poderias escrever o que estou pensando?”
Ele ditou e o colega escreveu:
“O corpo não pode ser a árvore de sabedoria
Nem o espírito um espelho brilhante.
Pois se, na verdade, ambos são mera ilusão,
Onde, neles, há de grudar o pó?”
Os demais monges, ao ler o curioso poema, ficaram perplexos. Inclusive o próprio Sabedoria, que se sentiu, em princípio, afrontado pela crítica latente que o poema do monge analfabeto veiculava. E com certa arrogância, arrancou o papel do quadro e o rasgou.
Durante alguns dias Sabedoria meditou. Finalmente, uma noite, ele foi à cozinha, onde Humildade cozinhava o arroz para o jantar e perguntou a ele, com cara de poucos amigos:
― Já cozinhastes o teu arroz?
―Sim ― respondeu Humildade, sem se alterar. ―Podes ver que meu arroz é branco, mas precisa ser limpo ― completou, com um sorriso.
― Vem comigo ―, ordenou Sabedoria.
E os dois monges sumiram na noite escura. Desde aquele momento, ninguém, naquele mosteiro, os viu mais.
Dez anos depois, Humildade voltou ao mosteiro para receber a sua ordenação como Venerando Mestre. Junto dele vinha Sabedoria, agora convertido em seu leal discípulo.
(REEDITADO: adaptado do livro Cem Contos Zen, compilados por Massaharo Taniguchi)