A morte de Brad Pitt

Este mundo parece mesmo um planeta de fantasmas, acontecem coisas inacreditáveis até para os que já estão mortos e enterrados. O que vou lhes contar é absolutamente verdadeiro. Aconteceu na casa do mais novo morador da minha rua. Um galego de quase dois metros de altura, casado com uma morena de causar inveja até na ex-globeleza Valéria Valenssa.

Quando ele esteve na nossa quadra pela primeira vez procurando uma casa para comprar ou alugar, o morador mais antigo “o síndico”, teve a brilhante ideia de lhe dizer que nossa pacata rua era perigosa e mal assombrada. Contou ainda, que os assaltos são uma constante no local, assim como os pedintes que passam de meia em meia hora implorando por um prato de comida. Desse modo, aconselhou ao ilustre galego que comprasse dois cachorros bravos e que lhes fossem ensinado a arte do ataque para que não houvessem surpresas desagradáveis e visitantes indesejáveis entrando em sua casa sem ser convidado.

O cidadão, apesar de grande, escutou atentamente o conselho do antigo morador, prova disso, comprou em uma loja especializada em cães, dois carniceiros da raça rottweiler: um macho e uma fêmea. Quem os via tinha a nítida impressão de estar vendo duas magníficas esculturas negras, tal era a elegância retilínea e admirável, em que eles ficavam defrontes a casa.

Por ironia do destino e talvez por falta de sorte, o galego foi morar justo ao lado do prestativo “sindico” que tinha em sua casa como cão de guarda, um pequeno e azarento poodle que atendia pelos mimos de sua mulher pelo codinome: Brad Pitt. Era um cachorrinho incrivelmente cuidado, andava no carro sempre no banco da frente ou no colo de sua dona. Toda semana era levado ao veterinário para que fossem aparados os pelos e as unhas. Sabia com precisão o exato momento em que seus donos estavam chegando em casa. Era o xodó de toda a família, uma família composta de pai, mãe e duas filhas. Seu aniversário era comemorado em grande estilo: com festas barulhentas e animadas.

Mas a preocupação geral dos moradores era a de que os rottweilers pudessem escapar e, num ato de insanidade, atacassem os que estivessem transitando por ali. Raramente alguém se atrevia a passar pela calçada da casa do galego, até porque na grade havia uma placa enorme com a seguinte frase: "cão feroz". Alguns, como eu e o carteiro, prendiam a respiração quando estavam frente a frente com os desafetos negros.

Infelizmente, como nem tudo é banquete, certo dia quando chegava em casa, o galego viu que seus cães estavam brincando com o poodle de jogá-lo de um lado para outro. Nisso o galego botou as mãos na cabeça e gaguejou:

__ Meu Deus! Mataram o pobre do Brad Pitt.

Antes mesmo que os cães destroçassem o coitado, o galego, transpirando de preocupação saiu em sua tardia defesa. Com o cuidado que o momento requeria, agarrou Brad Pitt com delicadeza e, ao mesmo tempo com dó e piedade. Levo-o para o chuveiro, deu-lhe um último banho e o secou demoradamente com o secador de sua filha. Passando a escova em seu pelo por longos minutos. Coisa que ele jamais havia feito com seus rottweiler. Brad Pitt ficou como se nada houvesse acontecido, eu diria: “novinho em folha”.

Ao cair da noite, o galego, meio que assustado jogou o pobre do Brad Pitt, já morto, de volta para a casa do seu dono. Não comentou nada com sua mulher e nem tão pouco com suas filhas. Ninguém viu nada, ninguém percebeu nada de anormal em sua casa.

Os dias passaram e nada do “sindico” reclamar da morte do seu cachorro tão estimado e querido, algo estranho estava acontecendo. O galego, intrigado com tanto silêncio, resolveu procurar o “amigo” para passar a pratos limpos o que havia ocorrido. Isto, depois de uma semana de severas preocupações.

__ Prezado amigo, não tenho lhe visto passeando com o Brad Pitt, ele está doente?

__ Nem lhe conto, minha mulher está para ficar maluca.

__ Eu entendo.

__ Imagine, há dias que ela não come direito.

__ Mas eu não tive culpa.

__ Eu sei.

__ Mas nós poderíamos ter evitado.

__ Essas coisas acontecem com qualquer um, basta estar meio vivo.

__ Com certeza...

__ Já não sei o que fazer com minha mulher.

__ Se você achar necessário, posso falar com ela.

__ Não, não é preciso, isso vai passar.

__ É uma pena!

__ Ela está achando que vai ficar louca, que não vai agüentar.

__ Eu entendo.

__ Tudo isso por conta de um cachorro que nem era lá essa coisa.

__ Mas era um animal de estimação.

__ Sim, era um animal que gostávamos muito. Mas ela não precisava rezar tanto. Todo dia vai para a igreja, está pagando promessa.

__ Que coisa triste!

__ Ela já foi até ao psicólogo, mas eu confesso que também fiquei preocupado, só que não posso deixar que ela perceba, senão o estado dela pode piorar.

__ E mesmo?

__ Sim, ela pode até morrer.

__ Credo! Nem me fale uma coisa dessas.

__ Veja bem, o quê você faria se seus cachorros fossem enterrados e na outra semana eles aparecessem em seu quintal limpinhos, como se nada houvesse acontecido?

__ O que foi que você disse?!

__ É isso mesmo, o quê você faria se os seus cachorros aparecessem de repente depois que você os tivessem enterrado? Nós enterramos Brad Pitt no fundo do quintal e depois de uma semana ele apareceu limpinho no nosso jardim? Isto não é uma coisa de maluco?

__ Realmente... isto é mesmo uma coisa de doido. Agora quem vai procurar um médico sou eu.

Pedro Cardoso DF
Enviado por Pedro Cardoso DF em 03/07/2007
Reeditado em 25/08/2017
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