Sono
Olhando fixamente para o texto, com as luzes todas apagadas, o ventilador ligado, que só fazia circular o ar abafado e sufocante daquela noite inquieta e quente.
Era a noite de um péssimo dia. Os seus pensamentos só indicavam na direção daqueles terríveis acontecimentos que antecederam a hora de dormir. Só restava tentar não encarar o teto, fechar os olhos e forçar um sono que não vinha.
Qualquer barulho no corredor, carro passando, transeunte na rua que falasse um pouco mais alto, o faziam virar para o outro lado na cama e adiasse um pouco mais esse relutante sono.
Até que adormeceu.
Sonhou com algo inquietante, mas nada relevante. O sonho seria esquecido em poucos minutos, a bem de verdade.
O problema foi ter acordado.
Abriu os olhos numa escuridão não tão profunda, de forma que conseguia enxergar tudo cinza ao seu redor. Tentou se movimentar, mas seu corpo não obedecia de forma alguma. Sentiu seus olhos se moverem nas órbitas, tentou mover a cabeça, e nada aconteceu.
Tentou gritar, sentiu o grito tremer em sua garganta, porém estava totalmente silencioso. Nesse momento, percebeu que seu quarto estava cheio de gente.
Tentava encarar aquelas pessoas, porém nenhum deles possuía rosto algum. Eles apenas estavam ali, parados, olhando para ele. Ele sentia como se cordas lhe envolvessem todo o corpo.
Tentou gritar novamente, e dessa vez com toda sua força, mas novamente de nada lhe adiantou. Era como se existisse uma mordaça invisível.
Começou a se desesperar (ou entrar em pânico, afinal, qual a diferença dos dois?).
As pessoas começaram a andar em sua direção. Cada vez que tentava se mexer, sentia que estava mais preso. Olhou para o teto e não o encontrou. Era como se o seu quarto de repente se abrisse para o infinito, e tudo que via lá em cima era um céu denso e sem estrelas.
Tentou gritar novamente, e a pessoa mais próxima estendeu a mão para lhe tocar, e nesse momento ele já estava certo de que tinha morrido e presenciava o ceifador que vinha lhe buscar para o último descanso.
Fechou os olhos, respirou fundo, começou a se conformar e se acalmar.
Quando abriu os olhos, não haviam pessoas, não havia corda. Conseguiu se mexer normalmente, e reparou que sua testa estava molhada de suor.
A vontade de gritar havia passado, mas ele disse "olá" em voz alta, só para garantir que ainda podia falar.
No final das contas, aquilo fora só um pesadelo.
É nisso que ele prefere acreditar.