Veneno não é vacina

A pressa é a inimiga da perfeição, não a única, o tagarelar, gabar-se, e confidenciar também dão causa a jaças, naquilo tão metodicamente articulado.

Ser suspeito não significa, necessariamente, ser o autor do crime, até que a autoria fique comprovada, todos que rodeiam o ato criminoso são alvo de investigação.

É evidente que a morte do sócio o beneficiou, afinal ele se transformou no proprietário exclusivo da enorme empresa de adubos; como também ficou evidenciado que, antes da morte do co-proprietário, um irretocável contrato, que obedecia, rigorosamente, ditames legais, transferia a parte da vítima, ao dono remanescente da empresa, desfazendo, assim, que qualquer dúvida pairasse sobre aquela transação.

Uma das grandes preocupações, na cozinha, é evitar alimentos com sinais de agrotóxicos, cuidado que não tomou o empresário, que agora podemos chamar de ex-proprietário; ele foi vítima de uma overdose mortal, de um produto, que, regiamente, garantiu, por tantos anos, sua vida.

Ninguém ousaria afirmar, que ele fosse usuário de um produto tóxico, isso é ilógico, nem fazia sentido alguém imaginar que ele tivesse ingerido, de forma proposital, a substância que veio causar sua morte. No coquetel organizado para sua despedida da empresa, ele comeu e bebeu tudo o que todos comeram e beberam, mas só ele morreu, pelo menos naquela oportunidade.

Amendoins enormes e salgados foram servidos, em porções individuais, aos tradicionais bebedores de uísque, e a porção que caberia a ele, foi devidamente preparada pelo organizador do coquetel, o cabeça do crime; desnecessário dizer que o sal daquele amendoim, previamente, endereçado, disfarçava o sabor da substância agressiva; que acabou provocando a morte, planejada de forma tão traiçoeira. Em ato contínuo à ingestão do amendoim, tudo que estivesse ligado a ele desapareceu, como se em um passe de mágica.

No escritório de uma empresa de agrotóxicos, perguntas sobre veneno tornavam-se evasivas, nada de vestígio deixado pelo autor, se é que houve um autor, ou um lamentável incidente de percurso, resultara em uma vítima fatal; nada de cápsulas, nada de digitais, nada de resíduos, nada de nada, em uma festa frequentada por cem pessoas, sem que houvesse uma única testemunha.

Foi crime sim, e teria sido um crime perfeito, se o autor, fazendo apologia de si mesmo, não tivesse comentado com seu advogado, que atendia causas da empresa, ter sido ele o mentor do crime, assassinando aquele, com quem teria que dividir, se permanecesse vivo, os dividendos de um contrato milionário, que, sorrateiramente, mantivera na surdina, o gabão revelou ter matado a cobra, sem nunca ter mostrado o pau.

Nem os laços de amizade, nem o sigilo profissional, mantiveram o advogado calado, insidiosamente, trouxe o assassinato à luz da justiça, o que resultou na prisão daquele que foi o braço executor, além de agente intelectual do crime, assim como trouxera a ele, advogado, o comando administrativo de uma parcela da empresa, bem como uma substancial quantia, com a valorização das ações, promovida por aquele contrato gerador de todo o conflito.

Ciente de que seria preso, o assassino injetou, cuidadosamente, com seringa nova, uma dose cavalar do mesmo veneno usado na oportunidade anterior, em um litro de uísque, reserva especial, que degustava, todas as sextas-feiras, com seu advogado, e amigo particular, após o expediente, no escritório, onde trabalhavam.

Na sexta-feira seguinte, agora sozinho, o advogado ergueu o copo, do néctar de 12 anos, e fez um brinde a ele mesmo...confidente

Roberto Chaim
Enviado por Roberto Chaim em 08/12/2015
Reeditado em 08/12/2015
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