Mulher

A vida corria lentamente na vida de Rosana. Acordava, cuidava da família, da casa, dormia em excesso. Mas uma coisa ela nunca deixava de fazer: separar algumas horas do dia para si mesma. Ela acreditava que isso lhe bastava. Todos os dias os filhos a criticavam: mãe, você não tem vida. Ela ria daquela baboseira que eles diziam.

O tempo foi passando e ela se desligando a cada dia mais e mais da vida no mundo exterior. Sim, tinha um interior rico, mas não suportava as pessoas, não conseguia confiar em ninguém.

Um dia a realidade lhe foi jogada na cara como uma bofetada que derruba. No chão, ainda caída, ela se deu conta de que nada fizera por si mesma. Muitos cursos, universidade, informações. Mas e daí? Sentiu-se, como ela costumava dizer, o H que antecede as palavras, como hora e hoje. Ou seja, na verdade, não faz falta alguma. Naquele momento se deu conta de que precisava zerar todo o seu interior e recomeçar, como uma nova Rosana, com planos e metas na vida. Precisava realmente viver.

Percebeu que, apesar da idade, ainda tinha uma certa beleza e frescor. E um grande potencial. Sim, ela poderia ser o que quisesse, havia um mundo em sua frente. Chega! Basta! Agora eu vou fazer por mim.

Como um parto nada doloroso, ela cavou seu interior, enterrou a antiga mulher e fez renascer outra, mais viçosa, mais participante e menos comprometida com os outros. Agora ela era o fator mais importante de sua vida. E sorriu, um riso largo, como não fazia há muitos anos. Sentiu-se alegre, cheia de vida e plena.

Mas isso não era tudo, precisava recuperar a autoconfiança que o outro minara. Afinal, quem era esse outro para achar que poderia destruir o que levara tantos anos construindo, o seu próprio ser? O outro? Não é ninguém. Eu sou alguém. Eu ainda não morri, ainda tenho traços de uma beleza que, outrora, fora tão chamativa. Eu tenho um cérebro repleto de informações e sentia que ainda havia muito a aprender e muito a ensinar sobre o que sabia. Não mais como professora, mas como algo diferente. Ainda precisava descobrir como. Mas confiava no fluxo positivo da vida e na força dessa mulher que acabara de renascer.

Essa mulher .... Mulher? Sim, precisava recuperar seu lado mulher, com desejos e amor. Um amor que jurava nunca ter sentido. Criatura, em que lugares você esteve durante tantos anos? Dentro de mim mesma, oculta, fechada, reclusa.

Rosana foi ao quarto, abriu a porta do armário, olhou-se no espelho e disse: eu tenho luz própria, aquela luz que nunca se apaga, aquela luz que é oriunda de um interior rico e que transcende o próprio tempo. A luz da vida, do ser radiante que ilumina seu próprio caminho e também os dos demais.

Olhou os cabides e disse para si mesma: roupas clássicas, ótimo, não preciso de muito para brilhar, para sorrir, para deixar brotar do meu interior a mulher completa e que será sempre muito feliz. A mulher realizada que cumpriu todas as suas missões junto à família de nascimento e à que criou.

Sou livre, liberta! Quebrem os restos de tabus e me deixem passar, plena e sem amarras!

Campos dos Goytacazes, 02 de dezembro de 2015 – 10:17 horas

Emar
Enviado por Emar em 02/12/2015
Reeditado em 02/12/2015
Código do texto: T5467652
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