Pelos cabelos

Vinha no ônibus a caminho do trabalho quando no banco da frente uns cabelos molhados de banho não me eram estranhos. Quando os olhos daquele anjo miraram a rua pela janela, reconheci a minha namorada pela metade do rosto que inteiro me encantava. A namorada que nada sabia de mim. Que nem de longe imaginava que era a minha amada. Vi o seu rosto de frente apenas três ou quatro vezes e nada mais. Em uma dessas vezes seus olhos apenas resvalaram nos meus. Encontro de olhares que não lhe causaram senão indiferença, o que não se pode dizer de mim que fiquei a imaginar mil histórias, um milhão de dias ao lado dela.

O ponto estava perto e eu sabia que ela desceria ali. E desceu levando consigo o meu coração apressado. Levando os meus olhos e o meu pensamento. Depois, só o meu pensamento, pois, o ônibus dobrou a esquina.

Por muito tempo tomei o mesmo ônibus a caminho do trabalho e no banco da frente uns cabelos dourados, outros cabelos quebrados, espinhados, lisos, loiros, falsos, estranhos. Nunca mais os cabelos molhados de banho.