ALMOÇO DE FAMÍLIA
Ah, almoço de família. A fome corroendo o estômago, disfarçada por horas enfadonhas. Enquanto o homem vai ao banheiro (de certo é o dono da casa) as cunhadas jovens fazem comentários capciosos sobre o volume da virilha. Quatro crianças entre cinco e dez anos brincam de pique. Dois homens se beijam às escondidas na garagem. Uma mulher prepara o arroz.
A velha vai ao galinheiro fazer o serviço. Sinal de morte à vista. Fácil pegar a presa. Com a cabeça em punho dá meia dúzia de voltas no pescoço. A degola está feita. Duas partes desprendidas, independentes. A galinha vai cair em si; quando descobrir que está morta morrerá. Pulando, pulando. Passam-se minutos. O relógio estica-se. Duas horas. A galinha ainda está viva.
Como salvar o almoço? Partiu de uma criança a idéia genial: vamos almoçar fora! Todos concordaram. Os dois carros saem deixando a galinha. Bota um ovo. Aos poucos foi se habituando a viver assim. Percebeu que sua cabeça era inútil.