O FAROL DE GEREMIAS
 
Por Paulo César Felipazzi
 
 
O Farol de Alexandria é uma das sete maravilhas do mundo antigo. É lendário. Mas o Farol de Geremias não. Não é lendário. Era e ainda é real em minha mente!
A casa era modesta, simples, pequena. Apenas um quarto e cozinha sem reboco, sem forro, com acomodação precária para uma família também pequena. A mobília da cozinha era constituída por uma mesa grande e forte, um fogão a carvão e um pequeno armário. No quarto, as camas, um guarda-roupa, uma cômoda e só. Não, havia também uma máquina de costura. O ano era 1952. Não tínhamos luz elétrica e as fumarentas lamparinas a querosene emprestavam sua luz amarela para alumiar o nosso jantar.
Mas, tínhamos Geremias. Certa tarde, este chegou em casa vindo do serviço, carregando dentro de um saco de estopa, uma bateria de automóvel usada, bem velha, que havia conseguido na empresa onde trabalhava. Conseguiu também um farol de carro, um "silibim" que mais tarde vim a saber que se chamava "sealed beam".
Geremias subiu na mesa e com grande esforço, colocou a bateria sobre a parede que separava a cozinha do quarto. Com dois pedaços de fio, pendurou o tal farol numa viga do telhado e ligou na bateria.
Nesse instante, fez-se a luz e todos viram que isso era bom! Jantamos sob aquele facho de luz improvisado que iluminava nosso semblante, nossa comida, nossas almas. Me lembro de ter olhado várias vezes para cima e nada comentado. Tínhamos luz, era só no que eu pensava! Foi só na hora da janta. O farol foi desligado e as lamparinas reinaram novamente. Sua luz amarela e trêmula encheu novamente o ambiente enquanto minha mãe lavava a louça numa bacia. A cena se repetiu por várias noites. A pesada e velha bateria já não aguentava muito tempo, e a nossa luz tornou-se intermitente. Às vezes a tínhamos numa noite, e depois ficávamos duas ou três sem ela. Entretanto, o orgulho era grande. Só nós tínhamos luz elétrica no bairro!
O tempo passou e a luz de Geremias se foi com o tempo, mas a luz no olhar de quem viu o sorriso nas faces iluminadas não se apagou. Persiste ainda que amarela, fraca, teimosa a iluminar o tempo e o espaço, gravada na alma, gravada nas mentes de quem viu a luz do Farol de Geremias.
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Paulo César Felipazzi nasceu em Coroados, SP - 1946. Define-se como” Apenas alguém que olha o cenário e tenta ver algo além, uma quarta dimensão, talvez. Apenas um cidadão comum.” . E-mail: pcfelipazzi@ig.com.br