868-CRÉDITO: UMA MOEDA DE CONFIANÇA- Lição de Economia
As aulas do doutor Marcílio Rondom ficaram memoráveis nas mentes de seus alunos pela originalidade e pela maneira descontraída com que ministrava os ensinamentos básicos de Economia Política.
Era ao seu tempo um dos mais destacados advogados da cidade, atuante dinâmico no fórum de Paraíso e quando recebeu o convite para lecionar a matéria, confessou:
— Pouco sei do assunto, mas aceito o desafio.
Dedicou-se ao assunto com afinco e tornou-se tempo recorde o mais brilhante da de toda a Escola de Comércio. Suas aulas eram movimentadas, pois nos trazia problemas econômicos contemporâneos ao mesmo tempo em que nos animava a ler os autores clássicos. Juntos, destrinchamos a “Rerum Novarum” encíclica de 192 do Papa ... (com louvores do diretor Monsenhor Macini), “O Capital”, de Marx (para desgosto do diretor), “A Riqueza das Nações” e outros trabalhos que nos animavam a tomar gosto pelo assunto.
Animava suas aulas com exemplos interessantes, por vezes engraçados, outras vezes nem tanto. Lembro-me bem da história que ilustrou o assunto “O Crédito como Ferramenta de Desenvolvimento”.
— O crédito equivale a uma “moeda de confiança” e pode ser — ensinava ele – por si só motivo de progresso.
E contava a seguinte história, para confirmar a sua idéia:
“Em uma pequena cidade, os habitantes, que se conhecem e têm confiança mútua, estão todos vivendo à custa de crédito. Uma manhã chegou à cidade um viajante que procura o único hotel.
Colocando uma nota de R$ 100,00 sobre o balcão, diz ao gerente:
— Por favor, desejo me hospedar e antes quero ver o quarto e as instalações.
O gerente manda o atendente que mostre o quarto ao possível cliente. Enquanto o viajante vê o quarto, o gerente do hotel sai correndo com a nota de R$ 100,00 e vai até o açougue e paga suas dividas com o açougueiro.
O açougueiro pega a nota de cem e vai até ao criador suínos, a quem deve aquela importância, e liquida seu débito.
O Criador de porcos, por sua vez, pega também a nota e corre ao veterinário, a fim de liquidar sua dívida, que faz nos ato.
O veterinário, com a nota de R$100 em mãos, vai até a zona pagar o que devia a uma prostituta (que trabalhava “a crédito” para alguns clientes de sua confiança).
A prostituta pega a nota e sai, indo em direção ao hotel, lugar onde levava seus clientes. E como não havia pagado pelas acomodações nos últimos meses, paga seu débito que era justamente de R$100,00.
Naquele exato momento, o viajante desce da escada que leva aos quartos e diz:
— Não me agradei do hotel. Por favor, me devolva a nota.
O gerente devolve então a nota ao viajante, que a coloca no próprio bolso e sai do hotel e da cidade.”
Terminada a narrativa, o professor nos perguntou:
— Quem ganhou e quem perdeu nesta história?
Depois de muita discussão, chegamos à conclusão que ninguém perdera e nada, pelo contrário, todos ganharam, pois saldaram suas dívidas.
— Pois é. Ninguém ganhou um vintém, porém todos puderam saldar suas dívidas. Tudo porque houve confiança mútua entre devedores e credores. Vimos que o crédito facilitou a todos. E outra conclusão que se pode chegar e a seguinte: quando o dinheiro circula, não há crise!
Dessa forma, os ensinamentos de Economia Política, que poderiam ser áridos e árduos, eram afixados em nossas mentes com facilidade e aprendidos com satisfação.
ANTONIO ROQUE GOBBO
Belo Horizonte, 26 de novembro de 2014.
Conto # 868 da Série 1.OOO HISTÓRIAS