UM PONTAPÉ PARA DESMANCHAR O DOMICÍLIO
Juca Marafiga era um arruaceiro conhecido de todos, mal tomava umas cangibrinas e saia logo procurando uma rusga.
Quase sempre tomava uns tapas e saia de fininho na direção do rio, pouco antes da barranca era o casebre que ele habitava. A cozinha dava de frente para o caminho dos barqueiros, assim ele bisbilhotava a vida de quem passava e por vezes ainda seguia a provocação iniciada nalgum boteco.
Naquele início de noite após ter sido fustigado como de costume, como paga ele arremessou uma garrafa no provocante. Pelo estrago feito na cabeça do adversário ele aligeirou-se em fuga, mas não tardou para que um mensageiro fosse até a cidade buscar o Cabo Navalhada, um quase índio que exibia uma cicatriz da boca até a orelha, resultado de uma navalhada num bochincho na zona de meretrício.
Chegando de pronto avistou o ferido que sentado numa mesa do canto com a cabeça coberta de pó de café para estancar o sangramento, que perguntado respondeu que fora o Juca o autor da agressão.
O Cabo Navalhada deu uma olhada e saiu xingando o pessoal, inclusive o soldado que o acompanhava. O xingamento era porque segundo ele, todos eram uns fracotes. Decidido mandou que todos o aguardassem que iria trazer o Juca.
Já no casebre gritou para que o agressor saísse. Como tomara algumas xícaras de café sem açúcar o Juca ficou grandão e apareceu na janela do puxadinho erguido ao lado da cozinha e saiu invocando direitos:
- Cabo Navalhada, já é quase meia noite, tens um mandado? Amassa e jogo para cá!
Navalhada pensou um pouco e deu um pontapé num pau que mantinha o puxadinho escorado e lá se foi tudo abaixo, passados 2 ou 3 minutos o Juca ergueu-se tapeando-se todo para afastar a poeira, nem bem tinha se levantado o Cabo passou-lhe uma soga atando-lhe as mãos.
Entre um gole e outro a impaciência levava os freqüentadores à janela e nada do Cabo Navalhada, até que avistaram dois vultos, na frente o Cabo puxando a tira de couro e arrastando-se na outra ponta vinha o Juca.
Pronto, está ai o malfeitor subdelegado! Gritou o condutor. Mas como o prendeste sem ordem judicial, sem flagrante? Invadiste o domicílio? indagou a autoridade.
Claro que não, ele estava escondido debaixo de alguns entulhos ao lado da cozinha. Foi a resposta da praça em serviço.