As Vozes

Desde criança sempre soube o que seria quando crescesse:

-uma psicóloga.

Todos achavam estranho uma criança de apenas seis anos escolher esse tipo de profissão, e por muitas vezes me questionavam se realmente sabia do que tratava,quando isso acontecia eu prontamente dava a explicação que minha mãe me dera.

Uma psicóloga é uma medica que cura as doenças da cabeça e da alma.

Continuei firme no meu propósito de ser curadora de pessoas, me dedicava aos estudos, sem tempo para amigos ou namorados e para ser sincera achava tudo aquilo um atraso de vida. Infelizmente hoje percebo o quanto devo ter chateado minha mamãe ela parecia bastante entusiasmada na época, mas eu vivia no meu mundo e isso não era ruim... pelo menos para mim.

Na noite em que completei 16 anos, fomos jantar em um restaurante super chique do outro lado da cidade, com a promessa que chegaríamos antes do inicio do ultimo capitulo da novela. Promessa essa prontamente atendida por meu pai.

Chegamos junto com a abertura da novela e um suspiro de alivio de minha mãe ao notar que nada havíamos perdido, como de costume sentamos cada um em seu lugar pré determinado há anos e começamos nossa maratona de debates sobre a novela tudo cursava seu roteiro de sempre com exceção de um click que me invadiu a cabeça e me acompanhou ate a hora de meu sono.

A partir daquela noite e por todas as noites seguintes fui acometida por pesadelos terríveis.Neles meus pais eram assassinados por uma pessoa que eu não conseguia identificar.

Depois de alguns meses eles finalmente cessaram, mas meu alivio durou pouco, pois em seu lugar surgiram vozes. Inicialmente vieram em tom de sussurros perdidos no vento em seguida vieram os gritos ensurdecedores escondidos na sombra.

Algo precisa ser feito eu não queria e nem poderia conviver com aquilo por muito mais tempo, então escolhi obedecê-las e quem sabe assim me deixariam em paz.

Esperei meus papais dormirem caminhei lentamente ate a cozinha e peguei a faca de cabo branco (a preferida de minha mãe).

-Ande faça logo- Me assopravam as vozes, enquanto entrava no quarto de meus papais.

Observei por alguns instantes mamãe dormindo,ela parecia tão serena, em breve ela encontraria a vovó e assim poderia matar a saudade que tanto reclamava que sentia.

Ergui a faca na altura de minha cabeça e a atingi no peito, minha mãe abriu os olhos, mas não tinha a expressão de alivio que eu esperava, pelo contrario seu olhar era de surpresa. Devo ter me deixado hipnotizar por sua expressão, porque mal pude sentir meu pai me arrancando a faca das mãos e me arremessando de encontro à parede me causando uma dor aguda nas costas.

Depois daquele dia meu pai me trouxe para esse lugar cheio de curadores de almas e de pessoas que precisam ser curadas.

Todo final de semana ele me visita, o engraçado é que a mamãe nunca o acompanha e quando pergunto por ela, meu papai muda de assunto.

Às vezes sinto falta de minha mãe, mas ao menos tenho as vozes para me fazerem companhia, essas sim tenho certeza de que nunca irão me abandonar.

Raquel Cardozo
Enviado por Raquel Cardozo em 23/08/2015
Reeditado em 23/08/2015
Código do texto: T5356450
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2015. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.