Meu Capitão das Areias

Muitos meninos poderiam encher o peito e dizer: “Obrigado, meu Deus, pelas minhas amizades!”. Considero-me um privilegiado em ter pessoas ao meu redor com quem gosto de conversar, estudar, confidenciar coisas de garotos e fazer estripulias que só os da minha idade sabem o quanto é gostoso.

Sou bastante tímido, mas descobri uma maneira de driblar a timidez: percorrer o mundo da fantasia. Vez ou outra me pego a fazer gracinhas, imitações, contar anedotas, provocar risos na garotada e, agindo assim, eu me acho o tal.

Porém, isso não escondo para ninguém, nada me faz saltar tanto o coração como a incomparável companhia do meu pai. Não troco os momentos em que ficamos juntos por nada deste mundo. Nossa, me faz tão bem! Incrível a facilidade que ele tem em se transformar num autêntico moleque e criar presepadas para fazer-me rir.

Jamais esquecerei a cena que intitulamos de “Capitães de Areia” e aconteceu nas areias da praia. Cavamos buracos profundos pertinho do mar e nos deitamos dentro deles, cobrindo imediatamente nossos corpos com a mesma areia retirada e escondemos nossas cabeças sob dois chapéus femininos.

Ali ficamos esticados, os braços colados ao corpo, uma vontade tremenda de achar graça, meu pai dizia psiu, cala a boca pivete, mas a vontade de rir era tão grande que eu quase não me conseguia conter.

Aí foi quando duas senhoras que faziam caminhadas viram os dois chapéus e tentaram cada uma por sua vez apanhá-los. Qual não foi o susto ao perceberem todo o chão em sua volta se movendo e dois marmanjos surgirem das entranhas da terra e dispararem numa corrida em direção às águas salgadas. Elas riram da brincadeira e aplaudiram quando meu pai me levantou acima de sua cabeça e desceu-me à altura de seu peito, dando-me um forte abraço e estalando um beijo em meu rosto.

Os garotos da minha rua têm a cara fechada, riem pouco e, quando o fazem, logo chegam a franzir o cenho. Eu confesso que tenho minhas carrancas quando algo me chateia ou me tira do sério, faço beiço de choro e ignoro minhas companhias, mas nada me faz tão feliz quanto à presença do meu capitão das areias.

Rui Paiva
Enviado por Rui Paiva em 28/07/2015
Código do texto: T5326890
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