Passagem no Tempo

Um casal que se agride num bosque público

No verbo e nas mãos

Na face e na alma.

Gritos ecoaram e adentraram

A sua janela de flores recém nascidas.

E ela que não queria ouvir

Este barulho do mau tempo.

Olhou para as folhas das árvores

E o verde bosque inteiro parou pra olhar:

- Folhas de bocas abertas.

Chorava uma mulher.

Gritava uma mulher.

Gritava um homem.

Começou a chover lá fora

E era chuva que vinha das folhas e do céu.

E era chuva broto do olhar.

E os cães começaram a ladrar desamor.

Confessou-me ela que se pudesse lá ir

Assim... Como um sopro de brisa cochicho

E contar das tantas cicatrizes,

Na alma e no corpo.

Das tantas contas coloridas perdidas

No seu chão de tempo

Do fio de contas partido que chamava-se amor...

Deste amor inteiro rasgado e mal remendado.

(Remendos são sempre trapos mentais).

Ela silenciou e ela choveu.

Falou-me sobre um tempo quase perdoado.

Falou-me sobre um tempo nunca esquecido.

Um casal que se agride num bosque qualquer.

Folhas verdes ternas choram chuva e inundou(me) ela.

E a ternura do verde não conseguia tocá-los.

Fio partido e contas coloridas espalhadas pelo chão.

Ela fitou-me e disse-me:

- Abriu-se uma passagem no tempo.

Um mau tempo... Um mau tempo.

Karla Mello

07 de Julho de 2015

#TragoVersos

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Karla Mello
Enviado por Karla Mello em 07/07/2015
Reeditado em 07/07/2015
Código do texto: T5302334
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