O preço do Silêncio

Meu nome é Mariah, tenho 34 anos. Nasci em uma cidade do interior onde vivi a maior parte da minha vida. Quando completei 20 anos, me casei com Jonathan, um homem alto, de olhos claros, muito gentil com palavras e gestos, minha família o amava. Nos mudamos para a cidade grande onde eu fui trabalhar em um supermercado e ele, em uma mecânica. Exatos um ano após nossa mudança, Jonathan chegou bêbado em casa, ele chutou a porta do quarto, se arrastou até a cama onde eu estava deitado e gritou sobre meu rosto.

- O que eu vou jantar? Você não cozinha mais nesta casa sua imprestável?

Eu joguei minhas mãos sobre seu peito e o empurrei para trás voltando meu rosto para cama, seu odor de álcool me deixou enjoada. Ele agarrou meus braços e me puxou para a cozinha, me lançou sobre a cadeira. Ele gritava sobre meu rosto coisas que eu não entendia de repente eu fechei os olhos e senti meu rosto esquentar do lado esquerdo, meu corpo cedeu e eu fui ao chão. Apenas um tapa dele. Ele levantou o calcanhar e se preparou para me dar um chute, eu joguei as duas mãos diante do rosto na tentativa de me defender, e gritei o mais alto que pude.

- Estou grávida.

Ele ficou parado com o pé longe do chão, seus olhos exalavam ódio, ele inclinou seu corpo para frente e vomitou sobre o chão diante de mim. Depois ele apenas me deu as costas e foi dormir. Passei a noite limpando tudo que ele sujou e retirando partes da porta espalhadas pelo quarto. De manha, eu estava sentada a mesa, mordendo uma fatia de pão com os olhos presos na janela, e os pensamentos na minha mãe, meu pai, minha cidade. Eu estava nas mãos de um monstro, como vou dizer isso para meus pais?

Jonatahan surgiu na porta da cozinha, ele chorava desesperadamente, se ajoelhou em meus pés e pediu perdão, eu chorei junto com ele, não poderia acreditar que aquele homem que me deu um tapa ontem era o mesmo que ajoelhava diante de meus olhos. Ele estendeu a mão e alisou minha barriga.

- Me desculpa amor. Não vou beber mais. Por nosso bebê.

Eu acreditei em suas palavras, afinal, que escolha eu tinha? Eu o abracei e rimos durante o café da manha. Duas semanas depois eu estava sentada a mesa jantando, Jonathan abriu a porta violentamente, senti um frio subir a espinha, apertei meus braços ao corpo, ele atravessou a cozinha e jogou os punhos contra a mesa.

- Você contou para sua mãe que eu bebi? – ele gritou cuspindo sobre meu prato – você enlouqueceu?

Ele puxou a mesa e a jogou para cima, ficamos apenas eu e ele, e nada nos separava. Ele se aproximou e agarrou meu pescoço.

- Não Jonathan – resmunguei – o bebê, pensa no bebê.

Ele parecia não me ouvir, me arrastou até a parede e me bateu diversas vezes contra ela. Quando ele me soltou eu cai de joelhos, ele me puxou para cima pelos cabelos e me deu um soco no olhos. Meu corpo foi jogado para trás, bati a cabeça na parede e desmoronei ao chão. Ele agarrou uma cadeira e lançou contra mim, a parte de cima da cadeira bateu na parede, e as pernas bateram no chão, deixando um espaço entre mim e a cadeira. Ele não se conformou e se jogou sobre mim, agarrando novamente meu pescoço. Senti o gosto forte de sangue no fim da garganta, uma dor estalava de minha nuca e expandiu sobre minha cabeça toda. A única coisa que pude fazer foi chorar, deixei as lagrimas escorrerem em meu rosto, pois naquele momento tive certeza de minha morte. Ele se afastou e foi ao quarto me deixando no chão aos prantos. Não seu ao certo quanto tempo fiquei ali, mas eu não tive forças para levantar.

No dia seguinte minha mãe me ligou, ela parecia ter sentido que eu não estava bem, mas eu menti.

- Estou bem mãe. Estou enjoada, acho que é por causa da gravidez.

Quando Jonathan chegou em casa, se jogou aos meus pés outra vez, chorou, se desculpou, jurou que mudaria. Eu o perdoei, por medo. Desta vez ele ficou um mês sem beber. Eu ficava todos os dias sentada diante da porta, com o coração apertado, com o prato dele quente, e com a terrível sensação de não saber como ele abriria a porta. Como me cumprimentaria se com um beijo ou com um soco. Certo dia eu dormi antes dele chegar, e acordei com um chute. Ele estava alterado novamente, me balançou através do pescoço e gritava. Eu apertei a barriga e protegi a única coisa que me importava agora, meu filho. Ele me jogou ao chão e me chutou, eu girei meu corpo e me encolhi deixando apenas as costas para ele chutar. Não sei quanto tempo ele me chutou, mas pareceu uma eternidade. Depois ele apenas dormiu, eu chorava e segurava a barriga.

- Não morre filho – eu sussurrei com a voz falha – não me deixa sozinha nesta cidade.

No dia seguinte ele veio com as mesmas desculpas e choro. Desta vez eu jurei que iria embora, abria porta e corri para rua. Mas, para onde eu iria? Ele ficava com meu dinheiro, ele dominava minha vida. Durante todo meu tempo de gravidez eu apanhei encolhida protegendo meu bebê. Quando completou nove meses, Jonathan me jogou da escada, eu agarrei a barriga e desci os degraus rodando e batendo a cabeça, as costas e as pernas. Eu não vi o final da escada, pois desmaiei, acordei na ambulância e estava em trabalho de parto, os enfermeiros tentavam me manter consciente. Eu me lembro de entrar no hospital, sentir as dores do parto, ver minha filha por um segundo e sentir a vida ser retirada de mim.

Hoje minha filha tem 17 anos, ela ainda vem ao meu túmulo, fica horas sentada diante dele. Ela chora às vezes. Hoje ela me disse que Jonathan foi morto em uma briga de bar, que ela iria embora morar com meus pais, ela chorou e arrancou um pedaço de papel do bolso e o leu.

- Mãe, por que você não falou para ninguém que o pai te batia? Por que eu tive que descobrir a essa altura da minha vida que foi meu pai que te matou? Você poderia estar aqui comigo, poderia me ajudar a me entender, me dar conselhos sobre a vida, poderia ser real. Mas eu gostaria de te agradecer, pois naquele momento, em que ele te jogou na escada, você teve uma escolha, a minha vida ou a sua. E você escolheu salvar minha vida. Foi seu jeito de me mostrar que me ama, e isso me mantém firme até hoje.

Ela ajoelhou, colocou as duas mãos sobre o túmulo e chorou desesperadamente como se eu tivera acabado de morrer. Eu me afastei dela e de longe avistei uma grade escada até o céu. Naquele momento minha missão com minha filha terminou, eu caminhei e subi a escada bem de vagar avistando minha filha se afastar e entrar em um carro. Cada degrau eu me questionava se minha vida teria sido diferente se eu tivesse falado para alguém, se tivesse pedido ajuda. Talvez hoje eu estivesse com minha filha, abraçando e sendo a mãe que ela precisava. Mas eu não estou triste, pois mesmo que eu não possa estar com ela agora, eu dei um dos maiores conselhos que uma mãe poderia dar, mostrei para ela que o amor verdadeiro nunca te machuca, mas te protege contra tudo e todos, até o fim.

Ashira
Enviado por Ashira em 02/07/2015
Reeditado em 30/11/2015
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