O bar
Pedi a conta ao moço do bar, e sai. Não queria mais olhar nos rostos daquelas pessoas, que sinceramente? Só carregavam dor dentro de si. Caminhei por entre as mesas, e baixei a cabeça, eu estava farto de segurar os problemas de todos e esquecer os meus, e abri a porta. O ar da noite me invadiu, um ar frio, igual a minha alma, e sai caminhando pela rua sem rumo, buscando uma nova forma de me encontrar. E comecei a observar as pessoas ao meu redor. Primeiro foi uma menininha, que passara por mim correndo e gritando “mamãe! Mamãe! Cadê a senhora? Aparecera, por favor, não sei o que fazer! Mamãe...!” Em outra ocasião, eu teria parado e pegado a mão da pobre garotinha e a ajudado a encontrar a mulher que lhe pôs no mudo, mas essa não era “outra ocasião”, eu precisava encontrar o que procurava.
Andei mais alguns quarteirões, e avistei de longe um casal de velhinhos de mãos dadas, sorrindo um para o outro. Está ai uma coisa que não se ver mais, o amor. Continuei a andar, o pensamento nos senhores de idade ficara para trás, caminho mais um pouco e paro.
Cheguei onde queria, ou melhor, vi o que queria. Uma menina que trajava roupas sem vidas, sentada a ler. Ela era a coisa mais impressionante que já vira em minha vida toda - não estou falando de beleza, pois até a flor mais bela seca, e fica só - mas falo-vos de como ela sorria, ou como ela pegava uma mecha do cabelo e colocava atrás da orelha, enquanto viajava pelas páginas de algum livro.
Pouco a pouco, vou me aproximando desse ser. Ela parecia uma miragem.
Parei.
Ela parou, fechou o livro, e olhou para cima. Para aquele estranho garoto, que tanto a observava. E por incrível que pareça, ela sorriu; um sorriso deslumbrante, que chegou a tocar seus olhos negros como a noite. E simplesmente falou:
- Oi.
Eu devo ter ficado vermelho, umas das grandes desvantagens de ter nascido nesse corpo, corava com frequência.
- Olá, desculpe minha interrupção, não queria atrapalhar sua leitura; mas queria saber como a moça se chama? - ela olhou-me e, de novo, sorriu.
- Que graça há em saber meu nome, se não conheces minha história? Ou o que leio? - E sorriu novamente.
Eu poderia me acostumar com o sorriso fácil dela. Assim como o sol, ela enchia-me de calor.
- Gostaria de me falar então, sua história?
- O senhor por acaso gostaria de sentar-se? - e levantou-se do banco e convidou-me a sentar junto a ela. E assim fiz, sentei-me.
- Por onde quer começar, moço?
-Pelo começo, por favor.
- Vou contar uma história, que a principio não parecerá grande coisa, mas quando acabar de fala-la, o senhor preferiria ter continuado sua caminhada.
- Duvido muito, minha cara - e dessa vez, não fui eu que fiquei vermelho. Isso já era um bom sinal.
- Muitas pessoas passam por nossas vidas, umas ficam mais tempo, mas não fazem diferença alguma, mas outras? Chegam como um raio e desaparecem deixando os mesmos prejuízos. Minha história é de certa forma complicada moço - ela olha-me e sorrir, só que desta vez, o seu belo sorriso não atingem os olhos e continua - uma menina que desde pequena sonha com coisas grandiosas....
- Que mal há em sonhar com coisas grandiosas? O pior que poderá vir acontecer moça, é você realizar um sonho as alturas - interrompo-a.
- Sim bom argumento moço - sorrir e continua -, mas, nem todas as pessoas pensam assim. Como falava, eu era uma pessoa utópica. E isso gerou-me amigos, por um tempo. Depois percebi que não queria apenas sonhar, não queria apenas sentar atrás de uma mesa e sorrir diariamente para todos os ajudando a consertarem suas bagunças internas, quando na verdade eu era o furação e eles a calmaria.
“E assim foi, sabe? Pouco a pouco, os meus “amigos” foram me deixando, por que de certa forma, eu não era mais aquela menina alegre que sempre os estava ajudando e colocando sorrisos nos seus rostos, eu virara apenas mais uma garota que queria consertar sua bagunça interna, e não a das pessoas a minha volta, pois sabe eu segurara a vida, o mundo, de todos por bastante tempo, e esquecera de mim mesma, moço. E isso fez com que todos fossem para sua verdadeira casa.
Comecei a isolar-me, e planejar o amanhã e esquecer do hoje, comecei a estudar em demasia, e esqueci de sorrir hoje, comecei a ser analítica e crítica e esqueci de ser bondosa e gentil, transformei-me no que mais temia, uma pessoa normal. Abandonara meus livros de aventuras, por livros de história e anatomia. E isso, pouco a pouco, me destruía, me consumia de uma maneira que às vezes penso se eu realmente passei por isso.”
- Moça não existe problema em pensar em si mesma, pois até o sol cansa e se põe todos os dias, para poder se auto consertar.
- Oh moço, não sejas tão gentil. Não me compare com a grandeza do sol, por favor, - ela sorriu, mas dessa vez o seu sorriso veio acompanhado com uma coisa belíssima, suas lágrimas.
E disse-lhes: ei garotinha, não chores. Tuas lágrimas são de uma imensidão imensurável. Não derramastes o que tendes de mais precioso em ti, suas lágrimas. Pois sabe - prossegui sem nenhuma cerimônia de falar - lágrimas são pedaços indiscutíveis de sua alma, elas são diamantes e ao mesmo tempo dinamites, é amor e ao mesmo tempo ódio; é vida e ao mesmo tempo morte. Talvez elas sejam apenas água salgada que muitas vezes escorrem pelo teu belo rosto, ou talvez elas sejam o céu chorando ao ver a sua dor. Há várias interpretações, minha cara, porém, transforme sua dor em poesia e encha o mundo com incríveis histórias de amor e sofrimento, tire sorrisos de pessoas que há muito tempo não sabem mais sorrir, der conforto a quem está inconsolável, dê amor a quem nunca soube amar. E principalmente, aprenda a não desperdiçar essa preciosíssima parte de ti, com que não para pergunta-lhes o nome ou saber tua história.
E ela olhou-me, de uma forma diferente agora, olhou-me como se eu fostes a lua, longe, porém, amável.
- Por que me olhas assim? - questiono-a.
- Assim como, moço?
- Como se eu fosse à lua e tu o sol.
E ela sorrir novamente, levanta-se e curva-se diante de mim e fala:
- Tu és a lua e eu o sol, nós somos diferentes, foi um acaso bem agradável conhecer-te, meu caro. Foi como se todas as estrelas ao teu redor parassem e nos observassem, mas sebes de uma coisa?
- Sei de muitas coisas moça, talvez eu saiba, talvez não. Vai saber?
Ela balança a cabeça e sorrir novamente, era incrível como ela era cativante.
- O sol queima, ele deixa feridas incuráveis e assim como a lua, foi destinado a viver solitário e a observar a felicidade das pessoas, e nunca ser feliz. O sol pode parecer bonito, interessante e até mesmo cativante, mas ele machuca.
Não fiquei ali para ouvir o seu nome, o que me entristeceu, pois agora eu conhecia sua história e sua forma de viver a vida como poesia, levantei-me, acenei e sorri para ela dei meia volta e voltei ao bar onde todos eram tristes, afinal como a sábia moça dissestes, eu estava destinado a viver só. Mas o que ela provavelmente não saberá, é que o sol, mesmo machucando é a fonte vital para a vida de qualquer um.