Amigo e fornecedôr...
Era assim que começava aquele bilhete curtinho, vazado no papel branco, endereçado ao vendeiro Joaquim Jacuba. Letra bem cuidada, da ponta do lápis, circunflexizando o ô final que era para não restar dúvida que a ênfase era no -dôr.
Achei-o no chão, próximo ao armazém do Joaquim e, naquele final de tarde, a ação, se ação houvesse, já teria sido concretizada. O freguês, cujo nome se me esquece agora, era da vizinhança - cheguei a suspeitar, mas não achei com quem apostar - e ele queria fiar umas poucas mercadorias para o seu dia a dia. Coisa singela, que nem um Mistura Fina ou bebida mais grossa incluía. O portador terá sido algum petiz seu filho. Açúcar, acho que constava da listinha.
Não sei tampouco se o simpático Joaquim atendeu o pedido. Sei que ele manteve a cara de sempre, sem expressão maior ou menor de simpatia, como lhe soía, pois adentrei o armazém em seguida para cobiçar alguma guloseima. Não fiei, mas que ele fiava, bem sei. Afinal quase toda sua clientela dependia do ordenado da Companhia de tecidos que, era curto, mas satisfazia, mesmo quando algum nem pequeno atraso ocorria.
Dali a uns poucos anos, o comércio passou das mãos de Joaquim para um tal de Tide, com os haveres e os deveres. E não foi muito à frente dado, ao que diziam, a cara amarrada do novo dono. Mas o doce dele, bicolor, juntando leite e amendoim ao açúcar, a gente comia até com os olhos. Mas como nem tudo neste mundo é doce, o negócio fechou-se. Sem amigo ou fornecedôr.