827-A FLOR DA ETERNA JUVENTUDE- História e Lenda

Após a descoberta do Novo Mundo, as lendas chegavam à Europa adicionadas de narrativas fantásticas misturadas com fatos reais, de tal forma que nunca cessava o interesse de aventureiros, soldados mercenários, marinheiros de última hora, exploradores e até mesmo criminosos, ansiosos em ficar o mais longe possível de autoridades e tribunais.

Eldorado, Fonte da Juventude, a Montanha de Esmeraldas, as Sete Cidades de Ouro e a Montanha de Prata são algumas das muitas lendas que atraiam milhares de europeus para o continente que ficou conhecido como América.

Ponce de León “encontrou” a Fonte da Juventude na Flórida. A Montanha de Prata foi localizada em Potosi, no Peru, o Bandeirante Fernão Dias Paes Leme morreu no norte de Minas Gerais pensando ter encontrado a Montanha das Esmeraldas e centenas de espanhóis se dirigiram para a costa do Pacifico onde hoje é a Califórnia, em busca das Cidades de Ouro.

Uma lenda, porém, jaz quase que esquecida e que, ao ser revelada, mostra como os europeus estavam convictos que os tesouros do Novo Mundo eram variados e inesgotáveis. Os exploradores espanhóis, que certamente eram os mais crédulos ou mais imaginativos e fantasiosos, acreditavam numa história bastante difundida entre os Incas: a existência de uma planta cuja Flor da Eterna Juventude, que daria longevidade aos Incas.

De acordo com a lenda, a tal flor misteriosa era cultivada em segredo pelos Incas nas encostas das montanhas, em locais de difícil acesso, só conhecidos dos sacerdotes.

A média de vida na Europa à época dos grandes descobrimentos era baixa, pois devido às guerras, pestes e péssimas condições de vida, poucas pessoas atingiam idades avançadas. Poucos anciões. Por isso, e pela observação de grande número de idosos entre os Incas, e geralmente usufruindo de boa saúde, a lenda foi reforçada.

Os conquistadores espanhóis ficaram impressionados com a grande quantidade de idosos e idosas na população dos Incas. Aparentemente sem função nem trabalho, os idosos eram respeitados e muito bem tratados. Isto veio reforçar a lenda da Flor da Eterna Juventude entre os europeus.

Pizarro, El conquistador e destruidor da civilização Inca e seus seguidores desconheciam que a longevidade dos Incas era produto de uma organização social que vinha desde os tempos do legendário imperador Manco Capac, em cujo período de governo (estimado entre 1070 e 1107) grandes mudanças foram feitas na sociedade inca.

A lenda de Manco Capac conta que ele reinou sobre Cuzco por aproximadamente quarenta anos, quando estabeleceu um código de leis que proibia o sacrifício humano, o canibalismo dos idosos e o casamento entre irmãos. Foi o último imperador a usar o titulo CAPAC, que pode ser traduzido como o senhor da guerra.

A nova organização social, pacifista e de certa forma, humanista, oferecia segurança aos idosos, demonstrando que a longevidade era norma. Um recenseamento a cada cinco anos classificava-os de acordo com idades e classes: dos 50 aos 70, dos 70 aos 80 e dos mais de 80 anos. As classes eram de certa forma bizarras: havia a dos “que andavam com dificuldade”, a dos “desdentados” e a dos que “só queriam comer e dormir”. Todos eram tratados com dignidade. Uma grande proporção de centenários que bebiam, fumavam e mantinham uma surpreendente atividade sexual. Eles, os idosos, eram os guardiões da memória e da história, pois os incas não tinham escrita. Quanto às mulheres idosas, importantes funções lhes eram atribuídas: desempenhavam funções de médicas, enfermeiras, parteiras e também sacerdotisas do Templo do Sol em Cusco.

Essa foi a organização que Pizarro e seus comandados encontraram. Pensaram naturalmente que tal longevidade era devida a uma poção que os incas tomavam, feita com uma flor misteriosa, cujo cultivo seria mantido em segredo pelos sacerdotes do Templo.

A destruição dos incas por Pizarro e a substituição da cultura pelos missionários espanhóis, colocou um fim na linda lenda, sem que fosse descoberta a Flor da Eterna Juventude.

ANTONIO ROQUE GOBBO

Belo Horizonte, 22.12.2014.

Conto # 827 da Série 1.OOO HISTÓRIAS

Antonio Roque Gobbo
Enviado por Antonio Roque Gobbo em 17/06/2015
Código do texto: T5280342
Classificação de conteúdo: seguro