VELAS DE NATAL

VELAS DE NATAL

As tradicionais velas eram vermelhas e douradas, que eu comprara para a decoração natalina, pensaram que eu gostaria que assim o fosse e fiquei surpresa como conseguiram adivinhar, só não precisavam tirar as bolinhas coloridas e brilhantes, sempre gostei de observar as luzes refletidas.

Não esperava que fossem interpretar meus desejos, deviam conhecer-me mais do que eu imaginava, também não guardava segredos, falava tudo que sentia.

Recordo antigos natais com o tradicional peru e leitão assado, decorado com bela maçã vermelha na boca que virou ritual por insistência de minha filha, muito pequena na época.

A partir deste natal, todos os outros ostentavam a saborosa fruta escarlate, escolhida e polida com muito cuidado para a ocasião.

Abraços apertados, desejos de Feliz Natal, toda a família, que não era grande, reunida, lindos filhos e sobrinhos. O menor, de cabelos loiros cacheados, escondido, com medo do Papai Noel.

Como não chorar de alegria diante destas cenas tão preciosas para mim que se repetiam ao longo dos anos?

As crianças cresceram são mães e pais responsáveis.

Quem chora, no momento, são os outros, estou tranquila, em meio às velas escolhidas por mim, que proporcionam um ar agradável ao ambiente, bem ao meu gosto, receber alegremente os amigos.

Foi tudo tão repentino que não tive tempo de falar, mas não gostaria que permanecessem sentados a minha volta, cansados e magoados, sentindo-se tristes. Queria mais alegria, como em nossas reuniões habituais. Meu consolo é que tudo passará rápido.

Só ficarão as lembranças boas, espero, porque discussões numa família que se ama, de origem espanhola com raízes basca são normais, e na nossa, todos tinham direito a opiniões e as expressavam de modo imperativo. Cada um com sua razão, sentindo-se a pessoa mais inteligente do mundo. Admito que foi um bom exercício para enfrentar a vida.

Sempre me gabei de não deixar dúvidas quanto aos meus pensamentos e opiniões, ser muito positiva e ética sobre todos os assuntos. Grande engano, sempre deixamos algo pendente.

A morte, por exemplo, nunca a encaramos verdadeiramente de frente, falamos de maneira otimista - seremos corajosos, tudo é mesmo passageiro, faremos uma viagem com destino agradável ao final.

Eu, particularmente, como boa taurina, que gosta das coisas organizadas, não me preparei para a derradeira transição.

O que farão com meu corpo? É o que me pergunto agora, não especifiquei meu desejo, sempre protelava a decisão. Nunca decidi se desejava ser cremada. Nesta questão deixei os familiares embaraçados. O que decidirão?

Estou na expectativa, um pouco ansiosa, é a primeira vez que alguém manifestará opinião por mim, mas ao mesmo tempo pacificada, esperando o veredito.

Enfim, consenso geral, aprovado por mim, eternamente, num túmulo de altura mediana, com acesso para colocação de flores, com bela vista para a cidade.

Inalva Froes
Enviado por Inalva Froes em 17/06/2015
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