O ERRANTE

Pegou o seu farnel abarrotado de lembranças e partiu mundo afora, assoviando canções de partida. Não tinha em mente para onde ir... Só queria ir, ao sortilégio das canções que assoviava.

Vagueou em terras estranhas, abastecendo-se de belezas não vistas, de ventos não tragados, de distâncias nunca antes percorridas. Ladeou vales e mergulhou em lagos densos de refrigério.

O farnel não lhe pesava tanto, visto que pegara somente lembranças leves, daquelas que se escondiam tímidas, no fundinho da sacola.

Aos poucos, notara que as lembranças se consumiam lentas, definhavam humildes, percebendo no errante a aflição das pernas aventureiras.

Já não tinha muitas canções a serem assoviadas, então, passou a caminhar em silêncio, vestindo-se, taciturno, de seus próprios barulhos.

No entanto, quanto mais caminhava, mais sentia o peso do embornal lhe arqueando os ombros e assombreando seus olhos extasiados, até então, das novidades estrangeiras. O volume da sacola não era mais o mesmo... crescia a cada quilômetro percorrido, a cada silêncio bebido que já lhe amargava a boca.

De repente, sentiu algo transbordando da sacola, escorrendo frio por suas costas, trazendo cheiros e sons tão conhecidos... tão perdidos no tempo.

Sentindo o gelo em suas pernas e seus pés, parou à beira da estrada, assustado, aflito, embaciando os olhos, sentindo as vistas turvadas.

De suas pernas para o chão, foi um átimo!

Sentiu a terra revolver-se sob seus pés e, estarrecido, deixou-se consumir pela saudade gorda que se fez areia movediça, mordendo seus pés, envolvendo seu corpo, consumindo sua alma.

Não mais tão pródigo, sufocou-se dessa saudade visguenta e amargou a boca com o pranto a babujar-lhe a língua e o céu da boca.

Voltou nos próprios passos, recolhendo as lembranças expurgadas da tristeza.

...Retornava para os abraços ternos até então preteridos!

Paulo Pazz
Enviado por Paulo Pazz em 13/06/2015
Código do texto: T5276237
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2015. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.