PIADA DA... OU TROPEÇOS LINGUISTICOS
 
 


Piada da memória. Hoje escrevi uma piada sobre a memória...
...Desculpem-me! Esqueci-me da danada da piada. Mas se vocês quiserem posso dizer os nomes de todos estados estadunidenses e suas respectivas capitais, só pra matar o tempo. Querem? Tá bom não vou dizer! O que digo então? Tenho que guardar o espaço que reservei para a piada que inventei. Vou enrolar aqui até lembrar da piada. Não contando piadas, sim escrevendo um conto cheio de piadas, não necessariamente engraçadas.

Então vou contar uma piada que não inventei, ela é bem fraquinha. Beirando a total falta de graça. Ele envolve dois governos: o brasileiro e o norte americano. Em 1945 o presidente brasileiro Gal. Eurico Gaspar Dutra recebeu a visita diplomática do presidente norte-americano Harry Truman. Um caipira do Mato Grosso e o outro um caipira do Kansas. Um, dizem, foi um grande General durante a Segunda Guerra, mas um péssimo presidente orientado por uma inteligência que beira a indigência. O outro, Truman, um grande e simpático presidente que parecia um dono de loja ferragens (isso talvez tenha algum sentido nos EUA), mas apesar disso mandou jogar duas famosas bombas sobre o Japão... viram que eu estou enrolando? estou tentando lembrar a piada. Ah sim!, no referido ano, 1945 (viram a embromação?), Dutra recebeu Truman ainda no aeroporto do Rio de Janeiro, que naquela ocasião era a capital federal.  Assim que desceu do avião Truman tête à tête com Dutra, todo simpatia, com um grande sorriso e charuto cubano aceso na mão. Viram o insólito da cena? Naquela época ainda era possível descer de um avião fumando um charuto e, mais surpreendentemente ainda, era permitido a um presidente dos EUA fumar legalmente um charuto fabricado em Cuba. O que mesmo eu estava contando? Ah sim! A piada. Não a história verídica que inventei. Mentira, aconteceu mesmo. Pois é, simpaticamente Truman cumprimentou Dutra:
_ How do you do Dutra? 
O que era aquilo? Uma frase Apache. Mais parecia uma declaração de guerra em gaguês.  Algum assessor mais sagaz que o presidente, furtivamente assoprou-lhe que aquilo era um cortês cumprimento e que competia-lhe retribuí-lo. Ele tinha entendido o "Duatra", que deveria ser ele. Então resolveru macaquear o cumprimento:
_ Rau tru iu tru Truman? (fiz um escrita quase fonética do que ele respondeu)
(...)

Ainda não lembrei da piada da memória. Então continua a tapeação. Algo parecido aconteceu aqui em Goiás, com um gorvernador de ástucia intelectual similiar à de Dutra, chamado Ary Valadão. Pelo menos é o que dizem. Corre na boca miúda que lá por 1980 ou 81, Valadão foi até os Estados Unidos "buscar recursos para alavancar o desenvolvimento de Goiás". Agendou um encontro com Ronald Reagan, o presidente do gigante do norte, um ex-cowboy do faroeste que também plantava bananas em Honduras, e que tinha uma delicadeza similar à do Arnold Zwartznegger. O presidente norte-americano recebeu o governo roceiro do Brasil nos jardins da Casa Branca, como habitualmente fazia com os políticos encrenqueiros do Oriente Médio, para ali emgambelá-los com um show de protocolos. Reagan cumprimentou-o, com estudada espontaneidade:
_ Ho! Great governor of Bolívia! How are you Ary?
_ ...
O secretário do governador, o Tobias, soprou-lhe alguma coisa no ouvido. Nem era necessário, ninguém ali, além dos dois, falava goianês. Entendendo a situação, Dr. Ary seguiu a grande tradição protocolar iniciada por Dutra, respondendo:
_ Rau Reagan iu Reagui?
(...)

Têm outras peripécias linguisticas desse Exmo. Govenador.
Essa, ao contrário da história anterior, comprovadamene aconteceu. Mentira, é piada mesmo. Antes de se encontrar com Reagan, no momento mesmo em que Ary descia do avião com seu indefectível Tobias, do alto da escada viram uma imensa faixa saudando o insígne governador (um pouco mais adiante conto também uma história envolvendo Ary e essa palavra), na qual estava escrito:
_ "Wellcome Ary!".
Ary não conseguiu ler. Tobias, sempre ele, leu então para Ary o que tava escrito sem traduzir. O governador ficou indignado com aquela explícita ofensa. Meio desconfiado, meio olhando de lado, parecendo temer todo mundo, desceu do avião e foi até a Casa Branca encontrar-se com Reagan.
Em 1982, durante a primeira campanha eleitoral pós ditadura, Ary convidou Reagan pra visitar Goiás, para que esse observasse os resultados dos investimenos norte-americanos decorrentes do encontro de 1980, bem como para que Reagan reforçasse a campanha de seu candidato a governador de Goiás, um certo Otávio Lage. Para tanto deu uma maquiada nas suntuosas instalações do Aeroporto Santa Genoveva, para receber com devido respeito o Air Force One. Por prudência, ou por vingança, mandou confeccionar uma faixa para impor respeito junto a um suposto auxiliar do presidente. A faixa foi pintada por seu Auxiliar Especial para Pintura de Faixas Oficiais (AEPFO), chamado Omar Souto, que a pintou enquanto o governador ditava o que queria ver escrito, para desespero do infeliz Tobias. E ali estava escrito:
_ "Ary come Uel!"
Pronto, botou banca e escapou ileso.

Conta-se ainda que durante a viagem aos Estados Unidos, depois do encontro com Reagan, o governador chamou o Tobias, sempre ele, deu um nó cinematográfico no forte esquema de segurança montado pelos norte-americanos, pegou um daqueles taxis amarelos para dar uma escapadinha até New York para beber uns chopis na Big Apple e para ver o King Kong ao vivo.
_ Tiu Nova Iorque, gae!
_ ...???
Disse para o taxista gastando todo o inglês que Tobias tinha lhe ensinado, durante os seis meses de preparação da viagem. Tobias disse alguma coisa para o taxista que Ary não entendeu. "Será esse o tal de Uel? Ele tá aliado com o Tubias". Pensou em voz alta, demonstrando medo e insegurança. Tem nada não, o taxi picou a mula até a "Bigue Epol". Foram parar num pub do SoHo. Um bar estranho, meio esmeraldino, tudo verde e branco, lotado por uns bebuns galegos pra lá de enferrujados. Havia um pequeno palco onde uma cantora suruca sozinha com uns instrumentos esquisitos tocava uma música também pra lá de esquisita. Tobias, bem entendido em todos as coisas, mesmo numa época que não existia ZapZap ou Facebook, explicou que aquela era Laurie Anderson, uma cantora que tinha acabado de lançar aquele música , Oh Superman, que virou um chiclete para essas bandas de Nova Iorque. Então estava lá aquela música com aquele "Rã râ rã" e a cantora dizendo "O Superman. O judge. O Mom and Dad. Mom and Dad". E o governador ouvindo aquilo e foi batendo uma saudade do Amilton Lelo e das Irmãs Freitas. Tudo bem, é preciso respeitar a cultura alheia.
_ Ô Tubias, chama o garção e pede umas daquelas que matou o padre, enquanto a gente ouve essa música de ripe.
Tobias, muito descolado, estalou os dedos, e logo chegou o tal garção. Ary fez o clássico sinal de "dois" com os dedos, depois opôs o dedo polegar ao dedo indicador, sinal universal de cagibrina. E o garçon interrogou Ary:
_ So, two beers?
_ Não! Eu sou o Ary, o Tubias é ele.
Respondeu Ary apontando para o infeliz do Tobias, que naquele momento dirfarçava, fingindo que ouvia o "O Superman. O judge. O Mom and Dad. Mom and Dad", que vinha lá do palco.
(...)

Tem mais, pois ainda estou esquecido de minha piada memória.
Isso aconteceu depois de um tempo após o retorno a Goiás, já descansado do esgotamento intelectual demandado pela viagem a Whashington e Nova Iorque. Eram aproximadamente 2:00 da tarde. Ary estava tranquilo em seu gabinete, lá no Palácio das Esmeraldas, sentado meio deitado na cadeira e com os pés sobre a mesa, compenetrado e... lendo um livro! Isso mesmo, lendo um livro! Quando ouviu um toc-toc na porta.
_ Pode entrar Tobias! Tô fazendo nada.
Autorizou o Exmo. Governador. Tobias entrou meio ofegante com um monte de papéis nos braços. Tentanto resolver os pepinos ligados aos projetos Rio Formoso e Alto Paraíso. Quando viu Ary naquela situação insólita, deixou a papelada cair no chão e exclamou:
_ Uai Ary! Lendo um livro? Bebeu?
_ Não! Eu não bebo desde o almoço. Eu não bebo durante o trabalho.
Tobias recolheu os papéis e os colocou sobre a mesa do governador, para que esse quando tivesse tempo desse uma olhada e, se fosse o caso, assinasse. Aproveitou e deu uma espiadela no livro que o governador lia, lá estava escrito "Mini-dicionário Aurélio da Língua Portuguesa". O secretário deixou cair os ombros numa expressão de desânimo.
_ Para que o Senhor está lendo esse livro!
_ Sabe Tubias, num aguento mais essas piadas que o povo faz comigo. Agora quero virar um telectual igual ao Sarney, que manda e desmanda lá no Maranhão. Aqui é só detonação. E agora tá aparecendo esse coisa ruim do Íris Rezende, que o povo trata como se fosse o rei da cocada preta.
_ Mas governador, isso aí não é um "livro" não, é só um dicionário!
_ É claro que eu sei Tubias! Pensa eu nasci onte. Eu nasci foi em Anicuns ("Que lógica é essa?" Pensou  Tobias com seus botões). Escolhi ele porque os capítulos são pititinhos e tem muita palavra diferente, para eu aprender a falar mais bonito.
_ Só por curiosidade, em que "capítulo" o senhor está?
_ No Abacaxi! Só vou parar quando chegar no "Pepino".
_ Mas Dr. Ary, dicionário não é pra ler, é só pra consultar conforme a precisão.
_ Para de bobagem, Tubias. Quando preciso de consulta eu num leio livro não, eu vou é até Goiás Véio me consultar com o Dr. Brasílio.
_ Então porque o senhor - Tobias começava a se divertir com a situação - não lê a lista telefônica de São Paulo? Tem uma ali na Secretaria de Comunicação.
_ Qual o que Tubias. Pensa que eu sou um Bocoió? Esse "livro" é muito maior. Além do mais o Maluf nem atende os meus telefonemas.
_ (...)
Tobias jogou a toalha. Nada podia contra a poderosa lógica do governador. Então Tobias resolveu fazer um chiste, para se divertir a custa da lógica do chefe maior do governo do Estado de Goiás.
_ Governador!
_ Sapeca, Tubias. Só não vem com mais pepino pra eu resolver.
_ Tubo bem governador. Mas o senhor sabe que as pessoas dizem que o dicionário é o "Pai dos burros"?
O governador, com cara de sarcasmo (o governador ainda não tinha chegado nesse "capítulo", mas sem querer sabia fazer uma cara sarcástica). Então "sapecou" uma resposta:
_ Êta Tubias. Você tem cada uma. Acredita em tudo que essa ignorantaiada desse povo que nunca leu um livro diz. Todo mundo sabe, até você, que o nome do meu pai não é Dicionário, ele é Ary igual a mim.
_ (...)
Tobias desistiu. Pôs a viola no saco, e foi lá para cozinha do palácio descascar alguns pepinos para espairecer.

Alguns meses depois, houve uma crise de abastecimento no Estado. E o governo muito preocupado resolveu intervir para sanar a situação. Um dos outros produtos, que estava em falta era o sal, isso mesmo, NaCl com adição de um pouco de iodo pra não dar papeira no povão. O governador destacou um caminhão da Secretaria de Transportes para buscar sal lá em Macau no Rio Grande do Norte, pois diziam que lá tinha muito sal, e um fusca buscar iodo em São Paulo. Depois era só misturar tudo. Fez até umas pesquisas sobre Macau na enciclopédia que tinha na sua estante. Quem iria para o RN era o José Francisco das Chagas Rabelo Dantas, um cearense mais conhecido por Zé das Couves, pra cumprir a importante missão salgada. Fez uma pomposa solenidade na frente do palácio, com palanque, imprensa escrita, falada e televisada, base de apoio político, autoriades civis, militares e eclesiásticas, show do Amilton Lelo e do Ângelo Máximo, descerramento de placa comemorativa, fita e tesoura. Ary, dispensando os serviços do Omar Souto, escreveu ele próprio numa faixa a palavra "Sal", que Tobias amarrou na lateral do caminhão. Que ficou transtornado com o que ali estava escrito: "Será que ele ainda não chegou no capítulo sal do livro que ele tava lendo?", pensou desanimado o secretário. Mas desistiu de intervir na questão, pois bem sabia da poderosa lógica de Sua Excelência.
_ Sapeca até a China, Zé.
_ !!!!
Exclamaram todos, exceto o motorista. Lá se foi o Zé das Couves rumo ao Rio Grande do Norte, com a nobre tarefa de redimir o Estado da situação salgada... digo, sem sal em que se encontrava. Passou-se um mês e nada do Zé das Couves despontar ali na Avenida Goiás com o caminhão Fenemê carregado de NaCl. O fusca com iodo já tinha chegado. Depois mais 2 dias  e o "sal" chegou. O governador montou a mesma solenidade da partida e até abriu a porta do caminhão para o Zé das Couves apear.
_ Boa Tarde Senhor Doutor Exmo. Governador Ary Valadão Filho.
_ E aí Zé, trouxe o sal?
_ Claro Senhor.... Trouxe sim. Mas deu uma trabalheira danada. Por isso demorei. Primeiro o Senhor... me mandou pra China. Só lá em Santos descobri que num tem jeito de ir para a China de Caminhão. Não tem nem estrada de terra. O Senhor... sabe que sou analfabeto de pai e mãe, desde a época de Adão e Eva. Falei pruns chapas de Santos que queria sal, e eles falaram que sal tinha que ser buscado lá no Rio Grande do Norte lá no norte do Brasil mesmo...
_ O Rio Grande do Norte não fica na China não? Droga, eu devia ter lido o "livro" até a letra R. Fala Zé!
_ Pois é Senhor..., parece que é no Brasil mesmo. Fui até Macau lá no RN. Mas eu tava cansado. Mandei os pião lá de Macau encher o caminhão até a tampa, falei que era só ler o que o Senhor... escreveu na faixa. Eu fui dar uma dormida num hotel que tinha lá mesmo. Tava tão cansado que dormi 2 dias! Acordei e fui correndo buscar caminhão. Aí os pião falaram que lá não tinha aquilo não, e que eu tinha que buscar lá em Pernambuco. Então eu piquei pro Recife. Mas antes dei uma desviadinha até Canindé no Ceará pra glorificar São Francisco das Chagas, meu Santo de proteção, depois fui até Juazeiro do Norte pra acender umas velas para Santim Padim Ciço, meu "Santo" de afeição. Antes de ir embora fui até Quixadá, para matar a saudade de umas parentaiada de minha mãe, os Rabelo. Então pisei no Fenemê para Pernambuco ("Êta conserva demorada, Sô!", pensou Sua Excelência). Cheguei em Recife e os cara lá do porto disse que aquele troço escrito no caminhão não era lá não, era só em Araripina, lá no finalzinho do Pernambuco, bem pertinho de Juazeiro do Norte que é no Ceará. PQP!, eu falei alto meio sem querer. Fui pra lá. Foi num posto lá de Serrinha, que é no  meio do caminho, quee descobri que Exu era pertinho de Ariripina, a terra do Gonzagão. Cheguei em Araripina. Deixei o caminhão lá e falei "Carrega!", e fui a pé em romaria até Exu, pra ver a terra do "Rei do Baião. Mas não era esse pertinho de buscar fogo não, demorei uns cinco dias pra ir, ficar e voltar. Cheguei de volta em Araripina e o caminhão tava carregadinho de sal. Peguei a estrada, só que errei o caminho e fui parar lá em Caxias no Maranhão, então embiquei pra Goiás. Aí, tô aqui. Por isso demorei tanto. 
_ Tem problema não, mas trouxe o sal?
_ Claro, o caminhão tá lotadinho. É só conferir.
Ary subiu até o topo do caminhão, pegou um pouco de sal pôs na boca e bradou:
_ Ô Zé, isso não é sal não, é outra coisa que queima na boca. Tobias sobe aqui e dá uma olhada.
_ Governador, pode descer, eu já sei o que aconteceu.
O governardor desceu, assessorado por uns 15 assessores e um bando de PMs. Então Tobias falou:
_ Dr. Ary dá uma lida no que o Sr. escreveu na faixa!
Ary leu:
_ Ih! Tobias. Fiz m... Eu escrevi CAL. É que esqueci de puxar o rabinho no C, eu queria escrever ÇAL.
(...)

Agora uma curtinha. Sem digressões ou grandes explicações. Pois estou começando a ficar com preguiça de escrever. Conta-se que houve um encontro  entre Ary e o ex-presidente Jânio Quadros. Não sei bem onde foi. Talvez no Pantanal. Mas o Tobias me contou que na despedida, o JQ despediu-segovernador dizendo: 
_ Boa viagem! Insígne viajante!
Ary entendeu quase tudo, exceto esse tal de "insígne". Parecia um xingamento. Por via das dúvidas resolveu adptar o cumprimento do ex-presidente para a sua situação de viajante:
_ Boa ficagem! Insígne ficante!

(...)

E tem mais... Mas vou deixar para outra vez, porque agora me lembrei da piada da memória. Isso mesmo. 
Eureka! Lembrei da piada. Mas pensando bem não vou contar. Primeiro que ela é muito sem graça, tipo aquela do cara que vai até a padaria comprar pão e deliciosos sonhos... Além do mais percebo que ela envolve um balaio de preconceitos. Dos quais até me envergonho de lembrar, lembrar-me de que criei uma piada dessa categoria. As histórias que contei, tem uma série de preconceitos, mas pelo menos não fui eu quem inventou (ou + ou - isso). Por isso tudo, vou me aposentar da minha profissão de inventor de piadas. Junto também vai minha pouco promissora carreira de contador de piadas. 

P. S.: primeiro classifiquei esse texto como "Humor". 
Vou mudar, não sei se pra crônica ou conto. Será conto mesmo. Pronto.