Tinha uma árvore no meio do caminho

Homem de hábitos simples, Arquimedes da Silva durante mais de 25 anos trabalhou na gessaria, onde conquistou os patrões e os clientes. Todas as manhãs pegava a marmita e ia a pé para o trabalho. Mantinha o itinerário. Às margens da estrada, a floresta... Arquimedes, sem sonhos, vivia a felicidade dos simples, que não cobram da vida mais que a própria vida... Numa manhã de outono, ele pegava a estrada quando um amigo lhe ofereceu carona. Carona? Pra quê? Chegaria muito cedo, e ele gostava de caminhar, e pensar, e viver o lirismo da vida. Na caminhada, mochila às costas, ele se recordava dos pais, que a vida lhe roubou tão cedo, e seu coração se enternecia com a lembrança de que tinha o irmão, a cunhada, o sobrinho, pessoas que o amavam. Não ventava, não chovia... Apenas a aragem da floresta visitava-lhe a face. De vez em quando, um ou outro veículo transitava... No mais, a tranquilidade da solidão antes da lida... De repente, caprichosamente, uma árvore de grande porte despenca e atinge-lhe em cheio o crânio. Um motorista, também conhecido, o vê caído e providencia os socorros. Nada mais podia ser feito. A família se lembrou de que ele não queria seus órgãos desperdiçados. Aos 41 anos, Arquimedes da Silva não plantara árvores, não tivera filhos e escrevera só com os olhos muitas cartas de amor. Mas salvara vidas...