“Ed Maluco”
Ederaldo Gaudêncio Neto, ou simplesmente Éder, ou ainda “Ed Maluco”, era um tipo considerado muito estranho para o padrão de vida duma cidade industrial chamada Jardim do Santo Ofício. Ed não era dado a lida, isso o diferia muito dos seus vizinhos, que trabalhavam de sol a sol como máquinas nas indústrias ali instaladas. Na adolescência Ed assistiu ao filme “Hair”, e identificou-se com filosofia de vida hippie. Com ele já era um vadio, só faltava usar LSD, por conta do efeito desse alucinógeno, Ed acreditava piamente estar na remota década de 60, e vivia naquela de “paz e amor!” tocando um velho violão, praticando nudismo e sexo livre. Após ser detido várias vezes acusado de ato obsceno e libidinoso, Ed, foi considerado louco, e internado no manicômio judicial da cidade.
Em Jardim do Santo Ofício, havia uma célula da Igreja Evangélica Romana Ortodoxa Luz Que Nunca se Apaga, e esta, fazia trabalhos missionários nas periferias, hospitais, presídios etc. Numa dessas missões no manicômio judicial onde Ed estava internado, a austera irmã Hemengarda levou consigo a noviça irmã Selma. E foram de quarto em quarto levando palavras de esperança e alento, ao chegarem ao quarto de Ed, ele ficou maravilhado com a beleza da jovem irmã Selma, com cabelos cumpridos na cintura, um saião e um óculos redondo de grau, ela lhe lembrava Janis Joplin. Ed que tinha uma vida sexual muito ativa, mas não transava há meses, não se segurou e agarrou a irmã Selma. Foi um “pega pra capar”, até que irmã Hemengarda que era perita em exorcismo aplicou uma gravata em Ed, e, teoricamente expeliu o espírito mau que se apossava dele.
Depois desse episódio, Ed ficou calmo e sereno, a ponto de receber alta. Arranjou um emprego e converteu-se a “Igreja Evangélica Romana Ortodoxa Luz Que Nunca se Apaga”. Ed afastou-se de tudo que lhe disseram ser derivado do “Anhangá Tinhoso Canho do Pé Preto”, inclusive de sexo. Por ter atacado irmã Selma, Ed envergonhado, não lhe dirigia a palavra quando a via no templo. No entanto, um dia a “irmã Sel” [como era carinhosamente chamada] aproximou-se de Ed e disse-lhe para ele não se constranger, que ela tinha ciência de que sua atitude teve a influência dos maus espíritos, e que sabia que ele agora era um “varão de respeito”. Ed que ainda não estava habituado às terminologias utilizadas pelos fieis da igreja, achou que “varão de respeito” tratava-se duma cantada, referente ao tamanho do seu órgão genital.
Aquelas palavras começaram a reacender o instinto predador de Ed, inda mais depois que a irmã Sel o convidou para uma “cruzada” que ocorreria no seu portão. Ederaldo agora tinha certeza absoluta que era um convite para fazer sexo, e melhor, na rua, como ele gostava.
No dia da tal “cruzada”, Ed estava tão elétrico que se esqueceu de tomar sua dose diária de Prozac, não conseguia para de ouvir a voz aveludada da irmã Sel dizendo: “varão de respeito”, “cruzada”, “varão de respeito”, “cruzada”... Ed surtou de vez, e na hora marcada para a “cruzada” lá foi ele.
Já estava tudo pronto na porta da Sel, púlpito, cadeiras, óleo ungido, caixas de som etc. De repente chega o louco Ederaldo completamente nu. As carolas correram desorientadas, inclusive Hemengarda, que na confusão esbarrou na mesa onde estava o recipiente com óleo ungido e o derrubou no chão. Ao passar, Ed escorregou no óleo bateu com a cabeça na quina duma cadeira e morreu. Todos estupefatos observavam Ed sem vida no chão, de repente viram seu espírito deixar seu corpo e ascender aos céus. Céu? Como pode um sujeito com a vida tão torta ir para o céu? Indagaram. Foi a mesma pergunta que os santos fizeram quando o louco Ederaldo chegou lá em cima. Depois de um estrondo como dum trovão, todos os que estavam na terra e no céu ouviram uma voz delicada dizendo: hipócritas! Saibam que não há diferença nenhuma entre Ederaldo e qualquer outra pessoa que vós julgais ser apta para subir. Quem de vós é digno de vir para cá, quem? Lembre-se que o que permite o vosso acesso não são os seus feitos, e sim o meu feito naquela má fadada cruz.
Todos se calaram.