744-FUGA FATAL- História da II Guerra Mundial
Um Pouco de História
A Prússia Oriental foi um território da Alemanha, da qual estava separada geograficamente pelo Corredor Polonês. Situada no norte da Polônia, seus habitantes eram, na maioria, alemães, e as fronteiras, totalmente artificiais, estabeleciam o acesso da Polônia ao mar Báltico, além de estabelecer a cidade livre de Dantzing, hoje Gdansk. Foi uma das muitas confusões territoriais criadas pelo Tratado de Versalhes, após a Primeira. Guerra Mundial
A Prússia era considerada o estado principal do Império Alemão, após sua criação, em 1871. A separação nunca aceita pelo governo alemão, foi um dos estopins da Segunda. Guerra Mundial.
A Maré Vermelha
No final de 1944, o exército russo vinha do leste, em direção à Alemanha, como uma verdadeira onda de fogo e de crueldade. O exército alemão, já bastante reduzido em efetivos e armas, não foi capaz de deter a invasão. O ataque maciço de tanques e da infantaria causava uma devastação jamais vista no leste europeu. O terror acompanhava a posse dos territórios. As notícias das atrocidades cometidas pelos soldados do Exército Vermelho espalhavam o pânico entre os alemães. Nas primeiras investidas no outono daquele ano, o exército russo atravessou a fronteira da Prússia Oriental mas ficou detido pela chegada do inverno rigoroso. A lama nas estradas não permitia o avanço dos tanques, mas as ocupações das primeiras vilas e cidades mostravam a sede de vingança dos invasores. Em Nemersdorf, uma aldeia da Prússia Oriental, tomada no outono, os soldados russos haviam executado uma sangrenta vingança aos três anos de sofrimento infligidos pelos alemães na Rússia. Ali, os soldados estupraram todas as mulheres, de todas as idades, e em seguida as crucificaram nas portas das casas e dos celeiros. Os homens e as crianças foram mortos a pauladas, tiros ou atropeladas pelos tanques.
As notícias trazidas pelos soldados alemães em retirada eram apavorantes.
— Fujam! — diziam eles aos civis, — Ivã, o demônio, está chegando.
A Operação Hanibal
Hitler, que determinava todas as operações de guerra, deu ordens para a organização da Operação Hanibal, destinada a transferir os funcionários da administração civil (todos nazistas, claro) e os soldados feridos na retirada do exercito alemão. Centenas de navios foram enviadas para os principais portos da Prússia Oriental: Pilau, Dantzig, Gotenhafen, Zoppot e Hel.
Navios de todas as categorias disponíveis no Mar Báltico, sob bandeira alemã, foram convocados para a magna operação de resgate. Navios de passageiros e mercantes, e da Marinha Alemã se engajaram na operação. A maioria foi para Pilau que, por ser o porto mais oriental da região, ficou coalhado de navios. O cais era uma balburdia de passageiros com malas e bagagens, macas com feridos, gente chegando a toda a hora. Foi o porto que mais despachou refugiados. Estima-se que partindo deste porto foram transportados, em poucos dias, cerca de meio milhão de pessoas para a parte ocidental da Alemanha. Mais de 1.100 navios participaram da Operação.
O Navio Steuben
O Steuben foi um dos mais luxuosos navios de passageiros da frota da empresa de navegação marítima Lloyd de Bremen. Seu nome era SS General Von Steuben, importante militar do exército alemão. Sofisticado, era decorado todo em art noveau, nele havia salões para concertos e elegantes salas para fumar, além de amplos restaurantes nos seus três conveses. Tinha capacidade de folga para mil passageiros.
Quando a Segunda Guerra Mundial começou, o Steuben foi militarizado, isto é, passou a fazer parte da marinha de guerra alemã. Seu casco branco foi repintado com manchas verde e cinza, a fim de camuflá-lo. Canhões antiaéreos foram instalados nos conveses. Mesmo após adaptado para servir nas operações de guerra, o Steuben ainda exibia sua elegância nas linhas externas.
O Embarque de passageiros
O dia 9 de fevereiro de 1945 foi marcado pelo início da tragédia. O Steuben começou a receber os passageiros ainda na parte da manhã. O capitão Karl Homann tinha ordens expressas de Hitler de embarcar mil refugiados. O embarque era demorado, principalmente o de soldados feridos. Eles foram os primeiros a serem embarcados e ocuparam os salões maiores, transformados em enfermarias. Em seguida, quando foi dada a autorização para o embarque de civis, a ordem se desfez. Haviam chegado ao porto centenas de pessoas que não eram “funcionários civis” e foi impossível exercer rigorosa seleção. Os passageiros já lotavam o navio, ocupando todos os lugares possíveis: corredores, áreas abertas dos conveses, cabines e até os depósitos de gêneros e munições foram invadidos. Mas milhares ainda estavam no cais. Ante tamanha demanda e op desespero dos que desejavam fugir, o capitão determinou que fossem aceitos mais 1.000 refugiados.
Ninguém sabe exatamente quantas pessoas subiram ao navio. Registro nos livros e nos comunicados relatam a presença de 4.200 pessoas, mas um oficial, Paul Niehaus, que assistia e de certa forma “coordenava” o embarque, estimou em pelo menos 5.200 pessoas.
A saída de Steuben do porto de Pillau
Ao entardecer, o Steuben partiu, finalmente, do porto de Pillau. Destino: Swinemunde, porto da Alemanha, a dois dias de distancia, navegando em condições normais.
— Acho que levaremos umas sessenta horas nesta viagem. — O comandante Homann comentou com o oficial Niehaus. — Vamos manter uma velocidade de 12 nós, pois os barcos que vão nos escoltar são velhos e dificilmente conseguirão nos acompanhar, se viajarmos a todo vapor.
A escolta foi feita, inicialmente, por um caça-minas, depois substituídos por dois torpedeiros. A noite estava sem vento, tranquila e até quente para aquela época do ano. O céu limpo permitia boa visibilidade, mas favorecia também os submarinos russos que rondavam o mar Báltico. O Steuben sulcava as ondas poderosamente, enquanto no seu interior os passageiros se espremiam. Salas de cirurgias foram improvisadas, onde os médicos atendiam os casos mais graves de soldados feridos e até três mulheres que deram à luz naquele anoitecer.
O capitão preocupava-se. O mar Báltico já não era mais um mar dominado pelos navios de guerra ou submarinos alemães. Submarinos russos apareciam aqui e ali, e alguns dias antes, isto é, em 30 de janeiro, o navio Wilhem Gustoff fora afundado ali naquelas águas, Participava da mesma operação de resgate e levava quase 11.000 pessoas, na maioria civis, mas também boa parte de soldados alemães feridos. Torpedeado pelo submarino russo S-13, afundou, levando consigo cerca de 10.000 pessoas (salvaram-se 960 dos onze mil fugitivos). E dezenas de outras embarcações tinham sido alvos de cachoeiras russas, que agora infestavam o Báltico.
Torpedeado!
Prosseguia o Steuben em sua rota, quando se ouviu um estrondo infernal. O navio estremeceu. Eram 2h50min. da madrugada de 10 de fevereiro, e apenas doze horas haviam se passado desde a partida do porto de Pilau. Seguiu-se outro estrondo. O Steuben havia sido atingido duas vezes por torpedos disparados de um submarino russo. Os torpedos atingiram a proa, matando cerca de 300 pessoas que estavam naquela área
A confusão se estabeleceu. Foi impossível manter qualquer ordem. No afã de saírem do navio (que começou afundar tão logo fora torpedeado) pessoas se atropelavam. Quem caiu ao chão foi pisoteado. Não haviam, obviamente, barcos nem bóias salva-vidas. Muitos soldados feridos morreram amarrados nas macas. Em menos de 20 minutos o Steuben desapareceu sob as ondas,
O Torpedeiro T-196 tentou em vão localizar o agressor, que, soube-se depois, foi o Submarino S-13, o mesmo que havia afundado o Wilhem Gustoff duas semanas antes. Comandava o S-13 o Capitão Alexander Marinezko.
As avarias foram tão precisas, e a força da água tão grande, que equipes de mergulhadores do National Geographic Channel, em expedição exploratória em 2002, encontraram o convés do navio completamente vazio, como se tivesse sido lavado antes de afundar.
Salvaram-se tão somente 659 pessoas, as quais foram resgatadas pelos navios de escolta das águas geladas do Báltico e levados para Kolberg (atualmente Kołoberzeg, Polônia). Considerando o número de sobreviventes, presume-se que morreram 4500 pessoas no que é considerado uma das tragédias marítima mais terríveis de toda a história a história da navegação marítima.
A Operação Hanibal foi uma das incontáveis tragédias ocorridas durante a II Guerra Mundial, que pouca divulgação teve e até hoje, os russos se abastem de vangloriar de tamanha crueldade, por parte dos capitães de submarinos da Marinha Russa, e os alemães procuram esquecer a imensa tragédia que foi uma fuga fatal para milhares de alemães civis e militares.
Com a derrota da Segunda Guerra Mundial, a Alemanha perdeu o território da Prússia Oriental, que foi dividida entre a Polônia, a Lituânia e a União Soviética.
ANTONIO ROQUE GOBBO
Belo Horizonte, 5 de setembro de 2012
Conto # 744 da Série 1.OOO HISTÓRIAS