742-A PROFECIA DE ZIRALDO-Gibis e meu encontro com Ziraldo.
Entre 1988 e 1991 estive literalmente mergulhado nas histórias em quadrinhos. Colecionador, ou melhor, ajuntador de gibis desde a meninice, possuía um número expressivo de revistas e álbuns de quadrinhos, cerca de quatro mil exemplares, que ficavam mal armazenados em dispensas e cômodos das diversas casas em que morei.
Em novembro de 1987 organizei a Biblioteca Nacional de Histórias em Quadrinhos, colocando os gibis à disposição dos leitores em sala especial no bairro Prado, em Belo Horizonte.
A divulgação da BNHQ foi intensa, pois despertou o interesse da mídia, não só pela importância de uma gibiteca (na ocasião, só existiam quatro gibitecas no Brasil) como também pela iniciativa e o esforço que pessoalmente eu dedicava à biblioteca de gibis.
Recebia correspondência de todos os estados do Brasil e até do exterior; doações e mais doações de editoras de gibis e de particulares, chegavam semanalmente às minhas mãos.
Convites para fazer palestras, dar entrevistas e participar de eventos eram constantes. Entre os diversos eventos da época, participei dos “Encontros de quadrinhos de Araxá”, nos anos de 1988, 1989 e 1990. Lembro-me bem de todos, mas especialmente do “2º Encontro”, por dois motivos.
Conheci Ziraldo e Patrícia Medina: e a Biblioteca Nacional de Histórias em Quadrinhos, minha criação, foi homenageada com troféu que mantenho em lugar de honra em meu escritório.
Patrícia Medina era estudante de design, moça simpática e cordial, que inaugurou, com seus desenhos elaboradíssimos e plenos de humor, as capas ilustradas do Repórter HQ e criou um logotipo para a Gibiteca, que usei nos papeis e no Fanzine a partir do número vinte e cinco.
Com Ziraldo, bati longos papos. À simpatia pessoal unia-se a elegância no falar e a maneira simples de tratar de seu trabalho, ele que é, sem dúvida, um dos melhores quadrinistas do Brasil.
Nas nossas conversas, mostrei-me entusiasmado com a atividade, editando o “Repórter HQ” – o “Único Fanzine Sobre HQs. do Brasil” e gibiteca crescendo sempre. Contei-lhe que passava meus dias na gibiteca, catalogando e administrando o acervo, recebendo os leitores, redigindo, editando e expedindo o fanzine mensal, enfim, fazendo tudo sozinho.
— Vá devagar com o andor, me aconselho Ziraldo. — você está indo com muita sede ao pote. Desse jeito, você não aguenta. Procure um patrocínio, da prefeitura ou de alguma entidade particular. Sozinho você não aguenta.
Eu estava tão tomado pelas atividades que não aceitei os comentários de Ziraldo (além de quadrinista, dono de uma vasta experiência como jornalista e também editor) como recomendações válidas, mas achei que ele estava mais para profeta ou oráculo, vaticinando dificuldades para mim e para a BNHQ.
Verifiquei não muito tempo depois que ele estava certo. Sua profecia acabou por se realizar.
Em 1991 tive de contratar uma secretária para me ajudar na administração da gibiteca. E no final do ano, talvez devido ao estresse (inconsciente, claro) tive de me submeter a uma cirurgia. Mesmo restabelecido, o nível de energia não era o mesmo, e encerrei as atividades da BNHQ em 31 de dezembro daquele ano.
O profeta Ziraldo estava certo.
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Nota - O destino do acervo da BNHQ – 4.850 volumes quando encerrei as atividades – está no conto # 144 – O Elefante Branco.
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ANTONIO ROQUE GOBBO
Belo Horizonte, 11 de agosto de 2012
Conto # 742 da série 1.OOO HISTÓRIAS