692-A FÉ DO SAPATEIRO DE BAGDÁ-Histórias Fantásticas de Marco Polo- 2o.

Histórias Fantásticas de Marco Polo – 2º.

Em suas viagens pela Ásia, Marco Polo registrou com detalhes tudo o que observou. E entremeou seus registros precisos com histórias que ouvia contar, as quais, por serem contadas oralmente, eram fantasiosas e, como ele mesmo afirmou, maravilhosas.

Uma das primeiras cidades importantes que visitou foi Bagdá. Ali ouviu muitos causos, lendas e narrativas fantásticas, com as quais recheou suas memórias.

A estranha e miraculosa história do sapateiro de Bagdá é uma dessas que mostram como o desconhecimento de fenômenos naturais leva à crença exagerada e até à superstição.

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Quando Marco Polo visitou Bagdá pela primeira vez, havia naquela cidade uma grande comunidade de cristãos que viviam em boa paz com os muçulmanos. Por volta de 1275, o Califa de Bagdá, chefe supremo do islamismo no Império Árabe, era um homem cruel e odiava os cristãos. Pertencia à tribo dos Sarracenos, famosos por sua intolerância com os vizinhos e crentes de outras religiões.

O Califa, embora intolerante, era um estudioso e mandava que seus auxiliares lessem e interpretassem passagens de livros de outras religiões. Ficou particularmente intrigado quando ouviu, nos Evangelhos, a afirmação de Jesus com relação à fé:

Se tiverdes fé, direis a uma montanha “Mova-se daqui para lá” e a montanha se moverá.

Viu nessa passagem uma maneira de lançar um desafio aos cristãos. Mandou reunir os cristãos defronte ao seu palácio (e era uma multidão considerável) e lhes disse:

— Os sábios de Islã leram para mim os Evangelhos, livros de sua crença. Neles consta que se um cristão tiver fé, por pouca que seja, talvez menor do que uma tâmara, será capaz de remover uma montanha. Bastando apenas orar para o Deus de sua crença.

— Sim, é verdade, Jesus assim o disse. — respondeu um dos líderes dos cristãos.

— Então — falou o Califa — Deve existir alguém com bastante fé, entre vocês. Fé suficiente para fazer mover aquela montanha. — e apontou para um monte que se divisava do local onde estavam reunidos. — Vão rezar e façam com que aquela montanha se mova. Vai ser a prova de que as palavras de seu mestre são verdadeiras.

Do contrário, o seu livro sagrado é uma mentira, e todos deverão se converter ao islamismo. Quem não se converter, será morto. Estabeleço o prazo de uma semana. Se não conseguirem mover a montanha... já sabem o que lhes acontecerá.

Os cristãos encheram-se de pavor. Que fazer? Perguntavam-se.

Reuniram-se nos seus locais de oração e rezaram-se dias seguidos. No final do terceiro dia, um anjo apareceu ao chefe da comunidade, um homem muito piedoso, e disse:

— Procurem o sapateiro cristão que mora na beira do rio. As preces desse homem farão a montanha mover-se.

O sapateiro era um homem muito piedoso e humilde. Ninguém jamais pensaria que ele fosse tão cheio de fé. O líder dos cristãos foi à procura do sapateiro e lhe falou do desafio do Califa, da aparição do anjo e de sua escolha para mover a montanha.

— Não sou digno de fazer isso. Sou um pobre sapateiro, um pecador e nada sei de como remover uma montanha. — respondeu o homem. — Peço que me dispensem desse trabalho.

Os cristãos ficaram apavorados. Se o sapateiro, indicado pelo Anjo do Senhor, não se dispusesse a remover a montanha, os cristão seriam mortos pelos soldados do califa, os terríveis sarracenos.

Pediram rogaram e insistiram até que o sapateiro de prontificou a rezar para que a montanha se movesse.

Na manhã do dia combinado, o Califa, seus soldados e uma grande multidão que incluía cristãos e muçulmanos, se postaram defronte à montanha.

O sapateiro separou-se do grupo de cristãos, ajoelhou-se Diane da montanha e começou a rezar com fervor.

Daí a momentos, a terra começou a tremer e a montanha foi se inclinando e deslizando para um lado.

O Califa, tomado de um grande medo, gritou:

— PARE! PARE DE REZAR!

O sapateiro parou de rezar e levantou-se. A montanha ficou imóvel.

A fé do sapateiro havia movido a montanha!

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O Califa ficou impressionado e temeroso do poder da fé dos cristãos. Secretamente, continuou a leitura dos Evangelhos e converte-se ao cristianismo, sem dizer nada a ninguém.

Teve uma longa vida e faleceu em paz com sua consciência. Quando preparavam o corpo para as exéquias, descobriram que ele usava um cordão com uma cruz pendurada no peito, sob as magníficas vestes do Emir de Bagdá, Chefe Supremo de todos os muçulmanos.

Devido a isso, não foi enterrado na Grande Mesquita, no mesmo túmulo onde jaziam os outros Califas que o haviam precedido. E seu nome foi apagado de todos os documentos do Império Árabe.

ANTONIO GOBBO

Belo Horizonte, 28 de outubro de 2011

Conto # 692 da SÉRIE 1OOO HISTÓRIAS

Antonio Roque Gobbo
Enviado por Antonio Roque Gobbo em 08/03/2015
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