O Fim
Quando entraste ainda percebi nos teus olhos aquela mistura de amor, amizade, confiança. Destacavam-se, na alvura dos lençóis, os teus cabelos desalinhados e os olhos abertos mostravam uma luz intensa. – É da febre disse o enfermeiro convidando-me a sair. Venha amanhã. E saí. Quando voltei a ver-te, depois da cirurgia, estavas pior. Nuca abriste os olhos e a tua mão, abandonada entre as minhas, não respondeu a carícias nem às minhas palavras de amor. Depois veio o médico para me dizer que pouco havia a fazer e que, o melhor, seria mesmo que tudo terminasse porque, disse, não voltarias a falar, andar ou perceber se acaso sobrevivesses. E chorei. Mesmo ausente queria-te comigo. O meu amor escoava-se em ti e nunca precisou de reciprocidade. Mas, agora via-te sem futuro, sem qualquer esperança, assim, um corpo morto que respira, cego, surdo, mudo, inerte. E despedi-me de ti para que a noite viesse por inteiro à tua cama. E desligaram-te do mundo, de mim, da nossa história. Depois, quando enfim me recuperei e saí para a rua, era outra vez primavera. Os pardais que, mesmo em liberdade dizias serem teus, ensinavam as crias a voar. Ainda, amarelas, as flores de trevo animavam o jardim.