Uma final de copa do mundo no "Aldeias"

Nós, condôminos das quadras pertencentes à Rua “C”, tínhamos o saudável hábito de mensalmente nos reunirmos na casa de um dos condôminos dessa rua, para estreitar ainda mais nossos laços de amizade e jogar conversa fora. Quando não era na casa de Gildásio, era na de Cléber, na minha casa, na de Barreto, na de Fidel e assim por diante. Até caramanchão nas festas juninas fazíamos nas quadras. Nossos filhos eram pequenos e adoravam essas patuscadas, porque não só jogávamos conversa fora, jogávamos também, muita água que passarinho não bebe e petiscos para dentro do bucho. Na final da Copa do Mundo de 1994, entre Brasil e Itália, por exemplo, a patuscada foi na casa de Fidel. Ele preparou o ambiente a capricho. A decoração verde e amarela não podia faltar, bem como os comes e bebes. Nesse item o anfitrião foi bastante generoso. A mesa foi farta. Todos preparados para assistir ao jogo, a torcida bissexta (a mulherada que só torce pela seleção, a cada quatro anos, durante a realização da Copa do Mundo) se fez presente, todos os participantes trajando verde e amarelo, aflitos e ávidos por uma vitória canarinha. Mas o jogo foi difícil. A nossa seleção contra a seleção Azurra não encontrou moleza. O resultado final, após o tempo normal e prorrogação, levou a partida para a disputa por pênaltis. Também uma disputa duríssima e angustiante. O nervosismo era tanto que alguns torcedores roíam as unhas, outros bebiam e comiam sem parar, outros apresentavam tiques nervosos diversos. Começou a cobrança das penalidades. Um gol do Brasil, um da Azurra, mais um do Brasil, mais um da Azurra, até que ficou pela última e decisiva cobrança nos pés de Baggio para a Itália. Se ele fizesse o gol, o Brasil seria eliminado. Se perdesse a cobrança, o Brasil seria o campeão. O que se viu, a partir desse momento, foram mãos cobrindo os rostos, gente saindo da sala para não ver a cobrança, Gildásio, então, foi parar na rua principal! Baggio se preparou para a cobrança. Como faz todo jogador que vai cobrar penalidade, ajeitou a bola na marca penal e, todo senhor de si, ostentando o seu famoso rabo de cavalo, partiu em direção à “gorducha” e “pimba”. O que se viu a partir desse esperado e angustiante momento foi uma onda ensurdecedora de pipocar de fogos e gritos de: “É campeão! É campeão! É campeão!”. O Brasil sagrava-se tetracampeão mundial. E a patuscada continuou até quando acabaram todos os comes e bebes.

Salvador, 12 de junho de 2014.

Valmari Nogueira
Enviado por Valmari Nogueira em 02/03/2015
Código do texto: T5155951
Classificação de conteúdo: seguro