670-O CONDE D'EU NA GUERRA DO PARAGUAI- História do Brasil
Na sala de aula, Professor Leandro era rigoroso, exigia dos alunos muito mais do que ensinava.
— Não acreditem em tudo que digo. Vão pesquisar. Se encontrarem algo diferente do que está nos livros, tragam para a sala, para discutirmos. Ainda há muita coisa para ser descoberta na História.
Mas fora da sala de aula, e quando estava animado por algumas cervejas, era outro. Muito mais interessante.
— História... ora, a História... Detrás de cada fato histórico registrado nos livros e documentos, há muitas versões, muitas omissões, muitos segredos e mistérios.
Quatro discípulos do eminente mestre privavam de suas conversas, eu no meio deles. Nós bebíamos cocas e guaranás enquanto ele tomava todas. No começo, ainda sóbrio, o professor respeitava alguma coisa da história. Mas à medida que os eflúvios etílicos lhe subiam à cabeça, não tinha a menor complacência.
— Vocês pensam que a História está nos livros? Nada disso. Nos livros não está nem a metade, nem um terço do que realmente aconteceu.
Era um péssimo exemplo, não há duvida. Mas aí é que residia o interessante do professor Leandro.
— A história do Brasil está cheia de fatos mal contados, de lapsos, de acontecimentos mal interpretados.
— Na Guerra do Paraguai... — um dos ouvintes começou a dizer.
— Guerra do Paraguai! Nunca ninguém terá conhecimento do que aconteceu realmente naquela guerra.
Quando se entusiasmava, ele tomava as rédeas da conversa e não deixava ninguém mais falar.
— Vamos ver um episódio daquela guerra. O que vocês sabem da participação do Conde d‘Eu na guerra do Paraguai?
Antes que um de nós respondesse, ele prosseguiu:
— Foi um desastre. Substituiu Duque de Caxias no Comando Geral das forças brasileiras contra Solano Lopes. Foi cruel nas batalhas em que participou. Também com seus subordinados. Caxias havia prometido alforria aos negros escravos que participassem da guerra. O Conde simplesmente mandou degolá-los. É a fato mais cruel de uma guerra que primou pela violência gratuita e por mortes desnecessárias.
— Caramba! — exclamou Joselito. — Mas existe registro desse fato?
— Claro que não, meu filho! Imagina se isto é de se deixar registrado. Houve mais: por sua influência direta, as promessas de recompensas e indenizações feitas aos Voluntários da Pátria, isto é, combatentes (nem sempre totalmente voluntários), deixaram de ser feitas ao término da guerra.
— Então o Conde era terrível! –Comentei.
Mas não houve resposta do professor, que entrara instantaneamente num cochilo etílico.
ANTONIO GOBBO
Belo Horizonte, 30 de maio de 2011
Conto # 670 da SÉRIE 1.OOO HISTÓRIAS