Meu primeiro automóvel
Antes de acomodar os glúteos no meu primeiro automóvel, um fusquinha 67, cor gelo, estofamento vermelho, comprado a um padre Pinto flertei, glúteos ainda a sonhar, com um bando deles, não hei negar.
Embora ardentes, foram flertes inconsequentes, não correspondidos, pois me faltava a grana, essa sacana, para que a transação pudesse ao menos ganhar perspectiva de negócio - de banidos e de brandidos.
O carro preto do Mixirica, estudante mais adiantado, foi dos primeiros a encher meus olhos. Devia ser um Ford 43 que, rodado pra danado, desenvolvera o hábito da domesticidade: já não podia ir muito longe, principalmente em subidas porque superaquecia. E aí, o navegante, onde estivesse, o esquecia. Até que o radiador ao normal voltasse. O que podia ser num novo dia.
A Simca Chambord do Nonato, com seu rabo de peixe e seus desenhos e desígnios afrancesados figurou também em minha lista. Mas nem aqueceu, o radiador seu, ou o coração meu. Era muito papagaiada e pouco fiel: só parecia ter ânimo quando via um mecânico. Deixando o Nonato em pânico.
O DKW verde escuro do primo Mundinho, seguidor do pai Leopoldo na fabricação e na distribuição de doces, com beijos, reunia pedigree a um enlaçamento de familiariade que desarmava. Motor bom, lataria, preço um pouco salgado, se via, mas o que nos livrou de ser companhia - já no fim da revisão - foi uma porta traseira que, no impacto do fechar da dianteira, quase despencar ao chão.
E houve um Gordini branco, flerte breve, tipo one-night stand que deixou de me pertencer tão-somente porque a chave de ignição, na demonstração, na mão de um pressuroso dono, em seu anseio e meu devaneio, partiu-se ao meio.
E hoje, logo o meu Toyota Corolla, me diz que fui - e sou - um tanto carola.