EMPRESÁRIO DAS LETRAS
EMPRESÁRIO DAS LETRAS - Autora: Karine Oliveira. Betim/Mg
Contato: Email:karinetchesinha@hotmail.com
Licença, poeta
Qual é a sua liberdade?
Seus poemas tem cheiro da roça,
No começo, um preconceito linguístico
No meio, um "êta, nós"
No final, as reticências [...]
Senhor, poeta, qual sua liberdade poética?
Você que tem ética
Tem prédios e dinheiro
Então, diga-me: por que perde seu tempo escrevendo?
Você que poderia viajar, ter quantas mulheres quisesse, mora num spar
Não entendo-te! Por que escreve, ao invés de estar em uma empresa?
Mandar naqueles míseros empregados
Sentar de frente o mar, degustar um belo vinho, vindo da Itália, França ou Paris
Mas, não! Você se dedica tanto a estes textos sem fundamentos, por quê?
Por que está calado? Responda-me!
(risos) Sabe, César, dediquei boa parte da minha vida as empresas mais conceituadas desse país, acordava mais cedo, para chegar cedo e planejar os mínimos detalhes ao ambiente, nas reuniões eu fazia de tudo para termos menos prejuízos em nossas ações. Em época de eleição, o povo queria vender seu voto, até convoquei uma palestrante para 'acalma-los'. Mas, tudo fora em vã. Poucos eram os que visavam o bem da empresa, pois, a maioria queria lucrar das mais 'idiotas' formas! Compravam peças falsas e vendiam do mesmo preço das importadas, pessoas faziam o possível e o impossível para comprar, conflitos com seus filhos - que queriam tanto uma viagem em família, passear, ou qualquer programa em família. Mas, seus pais não podiam, porque estavam invetando em um charlatão de peças falsificadas. Depois, fui trabalhar em uma empresa de automobilística na Europa, não fiquei um mês e já pedi pra sair. Só pra você ter ideia, você não podia ir com o mesmo terno, o sapato tinha que ser de marcas importadas, você não poderia conversar com os serviçais... E daí pra pior.
Até que um dia, eu estava andado na praça, encontrei um moço de vestes simples, com uma caneta na mão, algumas folhas -rascunhos, algumas já escritas e o mais impressionante - várias pessoas ao seu redor. Confesso que fiquei intacto ao ver aquela cena, as pessoas sorrindo, cantando, crianças, rapazes, vovôs e vovós, o público era misto! Fiquei super curioso para saber o que estava acontecendo, um homem tão simples, com uma caneta, umas folhas e um público enorme em sua volta, sorrindo, cantando, enfim... Felizes! Minha curiosidade foi aumentado quando ouvir uns ruídos de duas crianças conversando, quando uma delas disse: " atrás de prédios, sobrevive com remédios, um veneno de não se sentir livre, remédios estes, que é a pressão do patrão, que sempre está preocupado com a quantidade de papel em sua carteira e, depressa assim, o verdadeiro lucro em suas empresas, a mão de obra dos colaboradores". Aquilo foi um susto para mim! Parece que aquelas crianças entraram na minha cabeça e decifraram aquele amontoados de anos que passei pelas empresas. E o que me espantava mais ainda, é que eram apenas crianças que estavam dizendo aquelas coisas, no muito elas tinham uns dez anos. Quando pensei em aproximar daquelas criaturas dóceis, elas tinham ido. Foi amor a primeira vista, nunca me esquecerei das faces daquelas crianças. De repente, aquele moço, o centro das atenções, fala de um jeito meio da roça: " se não posso ir ao restaurante no fim de semana com minha família, não poderei ir a Paris a trabalho, pois, quando eu voltar, terei o emprego, mas perderei a família. Entre a escolha e a dúvida, eu prefiro a certeza, e mesmo que esta venha acompanhada de um prefixo 'in'." Não aguentei e aproximei daquele moço, mais uma vez ele me surpreendeu ao dizer: " Amar-te-ei como odiar-te os males". Fiquei impressionado com aquelas poucas e reais palavras daquele moço simples e de uma pureza imensa! Ele ao me ver, disse: seja bem vindo, aqui, rapaz! Eu agradeci e fiquei observando cada detalhe mágico daquele momento único, de pessoas felizes, encantadoras e humanas. Segundos depois, uma criança se aproximou de mim, com as mãos para trás e interrogou-me: moço, se adivinhar o que tem em minhas mãos, ganhará um prêmio! Eu então disse: ah, você tem cinco dedos em cada mãos... Aquela criança meiga e de sorriso iluminado disse: não, moço! Eu não tenho nem dedos, na verdade só tenho três dedinhos, nasci assim! Mas, moço, vou lhe dizer o que tem em minhas mãos com os três dedos... [e o garoto sorriu] Enquanto eu, admirado e arrependido por ter brincado daquela forma, não sabia desta história dos dedos do garoto. Aquela criança então, calmamente aproximou mais de mim e as mãos que estavam atrás, começaram a escorregar devagar e então ele disse: moço, não tenho todos os dedos, eu também não tenho todo o tempo, estou aqui de hora marcada, acabei de voltar do médico, e ele me disse: garoto, você só tem algumas horas de vida, aproveite-a! Então, vir para este lugar aqui, na praça, ao ar livre, aqui todos são diferentes, amam a gente do jeito que a gente é, seja com um só pé ou faltando dedos, e não é um amor em troca de dinheiro! Moço, aqui nesta praça todos nós estamos com hora marcada, veja aquela menina, com blusa de bolinhas, sabe ela? Então, morrerá daqui alguns minutos, aquele senhor de chapéu preto, daqui a alguns segundos, aquele bebê no colo da mãe, ele falecerá após duas horas, e eu daqui alguns minutos. Mas, moço, o que eu quero dizer é que vc ainda tem tempo para fazer as coisas, então, aproveite o máximo que vc pode, brinque com seus filhos, namora sua esposa, acampa no quarto com seus filhos, brincando de papai e filhinhos, moço, vai aos hospitais e diga "oi" as pessoas, moço, ame profundamente a vida, porque ela é única. Ei, moço, não chora, não! Você ainda tem vida, agora preciso ir, mas, jamais se esqueça de mim!
Ei, espera, menino! Ei, venha cá! Cadê você? E aquela criança então se pós ao chão, já gelada, e sem sentir seus puços, avistei um pedaço de papel em seu bolso, peguei-o e nele estava escrito: Se eu morrer antes de você, faça-me um favor:
Chore o quanto quiser, mas não brigue comigo.
Se não quiser chorar, não chore;
Se não conseguir chorar, não se preocupe;
Se tiver vontade de rir, ria;
Se alguns amigos contarem algum fato a meu respeito, ouça e acrescente sua versão;
Se me elogiarem demais, corrija o exagero.
Se me criticarem demais, defenda-me;
Se me quiserem fazer um santo, só porque morri, mostre que eu tinha um pouco de santo, mas estava longe de ser o santo que me pintam;
Se me quiserem fazer um demônio, mostre que eu talvez tivesse um pouco de demônio, mas que a vida inteira eu tentei ser bom e amigo...
E se tiver vontade de escrever alguma coisa sobre mim, diga apenas:
-"Foi meu amigo, acreditou em mim e sempre me quis por perto!"
Aí, então derrame uma lágrima.
Eu não estarei presente para enxugá-la, mas não faz mal.
Outros amigos farão isso no meu lugar.
Gostaria de dizer para você que viva como quem sabe que vai morrer um dia, e que morra como quem soube viver direito.
Amizade só faz sentido se traz o céu para mais perto da gente, e se inaugura aqui mesmo o seu começo.
Mas, se eu morrer antes de você, acho que não vou estranhar o céu.
"Ser seu amigo, já é um pedaço dele..."