CHUVA FINA
Fazia frio.
A chuva fina que caía sem parar.
As vidraças da casa grande ficavam todas fechadas para que o esborrifo da chuva não caísse dentro dos quartos e salas.
A casa grande ficava na encosta do morro das esmeraldas, usufruindo de uma visão panorâmica para o vale do Mucurí.
De dentro da sala de leituras, Valquíria abria apenas uma pequena parte da cortina de linho fino, de cor marrom, que cobria desde o alto até ao rodapé da grossa parede onde jazia a janela envidraçada.
Pelo pequeno espaço que a jovenzinha abria naquela vasta cortina, ela observava a chuva fina e prolongada que cobria todo vale, deixando as pastagens tremendamente irrigadas.
Chuva fina que molhava os fios de arames farpados das cercas da fazenda.
Chuva fina que deixava as taboas e folhas de inhames totalmente molhadas nas beiras do riacho do taquaral.
Chuva fina que deslizava pelo vasto terreiro do engenho de cana.
Chuva fina que deixava o paiol de tábuas e o estábulo calçado de pedras, envolvidos pelas gotas de água que caiam sem parar.
Chuva fina que esbranquiçava os cafezais e molhava toda a mata verde no cume do monte dos sauás.
Chuva fina que aumentava o brejo na baixada de terra preta do seu Paulino.
Chuva fina que banhava o gado concentrado debaixo das árvores exuberantes da colina de dona sinhá.
Chuva fina de verão que esfriava toda campina e fazia Valquíria silenciar dentro daquela sala tão antiga e tão nova, tão penumbra e tanta solidão.
Chuva fina que molhou tantos sonhos naquele tão longínquo verão.
Chuva fina que cai hoje e traz tanta saudade de tantos verões e tantos lugares.
Chuva fina está pairando lá fora!
Chuva fina está aguçando a minha memória!
É isso aí!
Acácio Nunes