The Storyteller Crow: O Poeta e a Musa

Muito boa noite, meus amigos que se mantém despertos sob a luz da Lua que jaz lá no alto. Não vim para falar de Lenora e tampouco para atormentar-lhes a alma, a mente ou ainda para atacar alguma carcaça jogada ao chão... pelo menos, não agora. Vim lhes contar, com esta minha voz rouca, a história de um poeta jovem.

Tenho o hábito de sobrevoar as matas profusas que cercam o lago Baikal e lá, constantemente, eu via um jovem em um barco no meio do lago ou encostado em alguma árvore, com um bloco de papel e uma caneta. Rabiscava ferozmente o papel, preenchendo-o com linhas e mais linhas de palavras diversas, formando frases e estrofes tão belas que encantaria mesmo o maior dos poetas. Por curiosidade resolvi pousar em um galho baixo, para observar aquele poeta escrever e recitar os poemas ao vento. Acho que ele notou minha presença mas não pareceu se incomodar com esta ave que, para muitos, é sinal de mau-agouro. Ele lia o que havia escrito e as lágrimas escorriam, mas ele tentava abafar o choro... como se aquilo fosse humilhante. Lembro-me do que ele dizia, com a voz levemente trêmula:

"... e esta bela alma me faz chorar.

As lágrimas são a pura expressão do sentir

E eu sinto que te amo, minha menina.

E esse amor me faz lutar por ti, mas

Esta luta parece consumir minha vida.

Eu vejo dentro de você, vejo a sua alma

E a vejo porque ela está enlaçada à minha alma..."

Ditas as palavras, ele desenhou o rosto dela no papel e deitou-se na relva verde, fechando os olhos molhados pelas lágrimas. Aquilo me encantou e eu voei, com a imagem daquele rosto em minha mente e, com toda a capacidade espiritual que nós corvos possuímos, encontrei aquela face desenhada tão apaixonadamente. Entrei pela janela aberta, assustando a musa de meu poeta e ela pôs a mão sobre o coração, que rufava descompassadamente pelo susto.

- Bom dia, Musa do meu poeta!

- O que desejas, Asa da noite? Já é hora de levar a minha alma?

- O que dizes, tola menina?

- Meu corpo jaz morto e minha alma beira o penhasco, pronta para cair...

- Oras, não anseie pela morte pois venho trazer-lhe a vida em meu bico, tão acostumado com a morte.

- Sejas claro, ave soturna, pois não compreendo o que dizes. Por que chamaste-me de musa?

- Tens o coração de um jovem, minha menina. Este coração começa a fraquejar. Ouça os versos que tenho a lhe cantar:

"... e esta bela alma me faz chorar.

As lágrimas são a pura expressão do sentir

E eu sinto que te amo, minha menina.

E esse amor me faz lutar por ti, mas

Esta luta parece consumir minha vida.

Eu vejo dentro de você, vejo a sua alma

E a vejo porque ela está enlaçada à minha alma..."

- Por Svarog! Eu reconheço isto como se eu mesma houvesse escrito e pronunciado!- seu rosto se

iluminou de alegria - Vamos, ave-mensageira, leve-me a ele.

- Ele está na floresta, próximo ao Baikal... - ela saiu correndo. Tão veloz e tão graciosa quanto

uma corsa.

Pois digo-lhes que o Poeta encontrou sua Musa e que eles não mais ocultaram-se um do outro. No lugar em que se encontraram, estas estrofes em homenagem à garota foram gravadas em uma árvore e todos os dias vejo-os caminhando entre as árvores, como dois elementais que ali habitam...