560-A LONGA VIAGEM PELO DESERTO-História de Jesus-3o. cap.

A LONGA VIAGEM PELO DESERTO -História de Jesus - 3o. cap.

À luz crua do meio dia, entre as reverberações causadas pelo calor das areias o contorno distante de Alexandria marcava o horizonte. Baltazar falou com José, que ia ao seu lado:

— Veja lá longe. Já podemos ver a alta torre do farol.

José olhou para o oeste, na direção da mão de Baltazar. Colocou as mãos em concha sobre a testa, firmou a vista e viu no horizonte uma elevação minúscula mais parecendo uma agulha.

— Ainda estamos muito longe. Chegaremos lá amanhã. — avisou Baltazar.

À noite, quando acamparam, era bem visível a luz do farol. A portentosa construção que servia de guia seguro para as embarcações que se dirigiam ao porto, era também um marco orientador para as caravanas que vinha pelo deserto, rumo à importante cidade.

Baltazar, Gaspar e Melquior reuniram-se, como faziam todas as noites, ao redor da fogueira e conversavam entre si. José. Muito considerado pelos três comerciantes do deserto, era convidado a participar do grupo. onde permanecia mais como ouvinte, e assim tomava conhecimento de tudo que os caravaneiros falavam.

Através deles, ficou sabendo que Alexandria tinha sido fundada por Alexandre o Grande á mais de 300 anos. Fazia parte do Império Romano e pelo seu porto passava a maior parte do arroz produzido no Egito, com destino a Roma.

— Se Roma ficar sem o arroz do Nilo, o império morre de fome — explicou Melquior. — De Alexandria grandes navios levam o cereal para a capital e para outras partes do império, às margens do Mediterrâneo. O farol foi construído para orientar as embarcações que se dirigem ao porto. Sua luz pode ser vista de muito longe. Para nós e para todas as caravanas que se dirigem a Alexandria também é um marco seguro de orientação.

Mais tarde, descansando ao lado de Maria e do menino adormecido, não conseguia esconder a ansiedade pela iminência da chegada ao destino.

A difícil jornada já se esvaia em recordações. O deserto era um inimigo com o qual convivera, sempre atento ás mudanças do vento. O calor era outro perigoso desconforto. Chegou a padecer sede em alguns dias, antes da chegada aos oásis.

Vieram por uma rota bem ao norte do deserto, paralela à costa do mar. O deserto era pedregoso e ao sul eram vistas colinas e montanhas igualmente despidas qualquer sinal de vida. Os oásis, que serviam de pontos de referências, constituíam paradas obrigatórias para descanso e reabastecimento de água em odres feitos de bexigas de animais. Passaram por uma estranha região inundada, que atravessaram a vau, e cujo canal central dava passagem a pequenas embarcações.

— Chamam este isto aqui de Canal dos Faraós. — explicou Baltazar.

Mas, enfim, tudo estava chegando ao final. Maria também se animou e naquela última noite no deserto dormiram mal, agitados ante o termino da viagem. Até o burrinho, que viera com a família desde Belém, estava inquieto, batendo com suas patas durante toda a noite, amarrado ao esteio da tenda de José.

No dia seguinte, a aproximação da caravana à cidade de Alexandria foi lento, retardada pelo movimento de outras caravanas, de muitas pessoas, de animais. Todos se dirigiam para o centro da cidade e mais além, para o porto. Uma coluna de poeira se levantava no caminho que levava ao porto.

A cidade agitou-se com a chegada da importante caravana vinda da Judéia. Trazia mercadorias preciosas do Oriente e os três caravaneiros eram bons comerciantes. Todos queriam ver e comprar.

Alexandria era uma grande cidade à beira do Mare Nostrum e só perdia em tamanho, em grandeza e importância, naquela ocasião, para Roma. Grandes embarcações, trirremes de até cento e vinte remos movimentados por escravos, chegavam e saiam todos os dias. Barcos de carga e passageiros levavam para Roma e suas colônias ao redor do Mar Mediterrâneo grandes carregamentos de cereais, além de pedras semi-preciosas, papiro para ser usado como um tipo de papel, muito procurado pelos escribas e quem lidasse com a escrita; escravos da Núbia e da Etiópia, soldados e oficiais do exército de Roma, negociantes com as mercadorias mais diversas.

José nunca vira nada igual, nem mesmo nas raras visitas que fizera a Jerusalém. Extasiava-se com a enormes construções de mármore, pedra vermelha do Egito ou tijolos. Templos de todas as religiões, para deuses e deusas de todas as crenças, erguiam-se nas vias principais. Esbarrava nas pessoas, misturando-se à multidão das ruas. As feiras estendiam-se pelas beiradas dos edifícios, ocupando todos os cantos disponíveis, deixando apenas estreitos caminhos para os passantes.

Após separar-se da caravana, agradecendo a Baltazar, Melchior e Gaspar pela proteção que recebera durante a árdua e cansativa viagem, ainda de posse dos camelos mais o burrinho, José dirigiu-se com Maria e o menino ao bairro dos judeus. Sabia que grande numero de patrícios viviam em Alexandria, num setor habitado somente pelos judeus, que viviam em perfeita harmonia com os habitantes de outras origens. Jamais pensara, entretanto, em encontrar aquela cidade dentro da cidade, um enclave que se constituía de dezenas de ruas, algumas praças e o templo, naturalmente. As casas, construídas dentro das características das residências judaicas, tinham o teto plano e as repartições usuais. Andando pelo bairro judeu de Alexandria, José sentiu-se como em uma cidade de sua distante pátria.

José encontrou, com alguma dificuldade, uma casa apropriada para abrigar a família, e com um telheiro onde podia trabalhar. No segundo dia após a chegada, descansados, José levou Maria e Jesus ao templo. Fez então sacrifício de agradecimento por ter saído de Belém antes da terrível matança das crianças e pela viagem na boa companhia dos três sábios mercadores do Oriente.

ANTONIO GOBBO –

Belo Horizonte, 10 de setembro de 2009 Conto # 560 da Série Milistórias.

Antonio Roque Gobbo
Enviado por Antonio Roque Gobbo em 01/12/2014
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