Sem Respostas

O seu pequeno computador de mão voou e a proteção de plástico azul que o cobria se estilhaçou em vários pedaços no chão da sala. O visor do aparelho se fragmentou ao meio, escurecendo parte da tela no impacto e abrindo um feixe de luz com um mosaico de cores que reluzia como se fosse um prisma na linha danificada.

Ela sentiu um aperto muito forte na garganta e uma pancada, no mesmo momento, sentiu seus pés flutuarem. Seu corpo era arrastado pelo meio da sala. Puxou pelas narinas o ar o mais forte que pôde e tentou gritar sem sucesso. A boca balbuciou apenas fracamente “me larga”. Ela sentiu o gosto enferrujado na boca, era o sangue que fluía pelos lábios.

“Agora você está sobre nossos cuidados, vadia”. A voz rouca do homem que a arrastava sentenciou sua pena capital a arrastando para outro cômodo dentro da casa. “Você não queria saber tudo sobre nossa vida, agora sua vida é nossa até a gente dar no pé”, o rapaz baixinho de cabelo encaracolado e sem camisa rosnou para seu comparsa. Ela era uma refém perfeita para a fuga.

“Os homens estão na área e nós vamos sair agora, se não sair nós vamos matar geral”, a refém escutou como um berro distante, quando as cores começaram a embaçar, os olhos fecharam e os murmúrios entre os três homens naquele casebre agora faziam parte de um pesadelo. Foi quando ela apagou, como se estivesse em sono profundo.

A menina deu uma rápida olhada no seu telefone celular. Era onze e meia da manhã. Faltavam apenas mais duas visitas para ela encerrar seu trabalho na comunidade do Bola Sete. Eram oito e meia da manhã quando ela chegou até a vila de trabalhadores muito conhecida na cidade por ser local de gente operária dos curtumes da região, das empregadas domésticas e dos trabalhadores da construção civil. Isto sem falar nos nos ambulantes e no alto percentual de desempregados no Bola.

Ela dá uma olhada na sua planilha. Marcada a lápis estão as casas já visitadas. Nove foram as entrevistas concluídas. Em duas casas ela não conseguira achar moradores no local. Noutra casa uma criança a atendeu. Ela adentrou pelo pequeno portão no pátio interno, e se aproximou da porta. Sem achar a campainha ela deu duas pancadas na porta de madeira. Surgiu um menino pequeno que a espreitou pela pequena abertura da janela gradeada ao lado da porta e resmungou, “a mãe não está”. “Oi, eu sou do IBGE e estou fazendo uma pesquisa com os moradores da casa. Tem algum adulto em casa?”. “Já disse que a mãe não tá”. “Mas tem algum horário que eu possa achá-lo ou um número de telefone para que eu...”, o menininho bateu a janela rispidamente e puxou a cortina marrom escura cobrindo a metade da janela de vidro.

A pesquisadora esperou mais alguns segundos antes de desistir, ela sabia que muitas vezes os adultos estavam em casa e mandavam seus filhos darem qualquer desculpa. Depois de alguma insistência, eles podiam dar as caras. Surgiu entre a cortina e a janela um pequeno braço, magro e pequenino, um punho foi erguido junto a ele. Um pequeno dedo médio é levantado em riste calmamente com os outros dedos espremidos no punho infantil. A mensagem é clara, e a menina desistia pela primeira vez no dia, saindo pelo portão achando o gesto do menino pouco elegante, mas muito sincero e de certa forma divertido. Ele venceu.

A jovem estudava na Universidade Federal do Estado, ela estava no terceiro período no bacharelado de psicologia. Ela sabia que o trabalho em vilas, favelas e comunidades populares tinha duas características distintas. A primeira delas, os endereços a serem visitados podiam em poucas horas de uma manhã serem completados, e o entrevistador realizar boa parte das entrevistas planejadas naquele curto período de tempo. Normalmente, a amostra dos setores habitacionais assinalavam uma dúzia a duas dezenas de endereços para entrevistas na mesma região. Nos bairros populares, a maior parte das casas contava com a presença de pelo menos algum adulto em casa. Quase sempre ela encontrava uma dona de casa, um desempregado ou um agregado da família que a atendia. Ao contrário dos bairros de classe média onde normalmente as famílias eram constituídas por um número reduzido de moradores, onde todos tinham atividades laborais ou de estudos na maior parte do dia, e nas noites e finais de semana quase sempre os membros da família saíam de casa para viagens, lazer, e, além disso, era mais corriqueiro ela ouvir um sonoro e retumbante “não” daqueles que não estavam muito suscetíveis a entrevistas para os agentes do Estado. Para essas famílias, o Estado é lugar de “políticos corruptos”, e as famílias justificavam com generalizações do tipo: “pagamos os nossos impostos”, “não queremos dar informações de nossa vida particular”, ou “não somos obrigados a falar para quem quer que seja, muito menos para um estranho”. Eram tantas modalidades de negativas e insucessos que ela sempre pedia os setores habitacionais menos abastados. Mais rápidos e de trabalho mais simples, menos encaroçados de realizar.

Por outro lado, era sempre uma aventura encontrar todos os tipos de pessoas e comportamentos nas vilas. Na maior parte das vezes, ela era tratada com muito respeito e com simpatia. Serviam-na cafés, batiam papo, e contavam fofocas do bairro, dos vizinhos e de suas vidas pessoais. Frequentemente ela servia como assistente social ou dava orientações psicológicas informais e gratuitas. Outras vezes ela era tratada rispidamente com desconfiança como se fosse um agente do governo secreto para subtrair das pessoas suas pequenas posses. Muitos achavam que o agente de pesquisa descobriria suas dívidas na praça, tiraria seus benefícios dos programas assistenciais do governo e exigiria documentos, ou o que era mais temeroso, seu registro de posse do imóvel ou o pagamento de impostos atrasados. Era preciso desmistificar todo o mal entendido antes de cada série de perguntas. Nos casos mais graves, ela entrevistava bêbados, mal humorados e maridos agressivos com suas esposas. Mas nada que a assustasse, até aquela sexta-feira.

Ela dobrou a esquina da mais longa e íngreme subida da comunidade do Bola Sete. O Beco dos Amigos estava marcado na sua prancheta. Duas casas. A rua estava tranquila e tinha pouco barulho vindo dos domicílios; apenas um rádio se escutava ao longe tocando alguma música popular ao som de uma série de batidas esparsas. O Beco era uma viela sem saída que começava no ponto mais alto da Rua da Igreja, e descia a colina longamente até o seu final, onde a rua estreitava e não tinha mais a presença das modestas calçadas de pedras cruas. As casinhas mais simples de madeira reciclada ficavam na beira de um pequeno arroio repleto de sujeira e de lixo a céu aberto. O emaranhado das casinhas ao fundo do beco, fazia com que as casas não parecessem ter limites entre umas e outras, ficavam como que debruçadas sobre as paredes vizinhas e sem numeração organizada, o que sempre dificultava o trabalho em aglomerados de habitação irregulares.

Com o aparelho digital nas mãos com que ela realizava as entrevistas, mochila nas costas e jaleco de cor azul escura no corpo ela chega até uma casa de tijolos, uma das melhores da rua, que ficava na parte baixa de um terreno que tinha um grande desnível. O portão ficava na parte de cima, um longo caminho de terra seguia até a porta da frente que estava apenas encostada, indicando a possível presença de pessoas em casa. As janelas estavam com persianas fechadas, e ao fundo da casa se via uma fumaça espessa. Quando a jovem pesquisadora começa a bater palmas na frente do domicílio, ela leva um grande susto com um inesperado latido. Um grande cachorro escondido por detrás da pequena mureta coloca a cabeça para a fora da parte mais alta das grades, e ataca uma das barras de ferro do portão a meio metro do seu braço esquerdo.

“Wolverine, quieto! Oi moça, é do Censo não é?”. A jovem assinala com a cabeça para um homem gordo e com um grande sorriso ao fundo, e antes mesmo de responder ele convida. “O portão tá aberto, pode descer. Ele não morde não, é mansinho”. “Wolve, quieto”, o bichano sai com o rabo entre as pernas e se afasta para os fundos do terreno por um alto capim.

A recenseadora desce o pequeno caminho de terra batida que formava ligeiros degraus forrado com britas até a parte baixa do terreno. O homem tinha uma bela barriga saliente por sobre a camiseta, uma barba rala e cabelos crespos e gordurosos. Na mão direita ele estava com uma faca de açougue. “Quer entrar?”. “Podemos fazer aqui mesmo, são poucas perguntas, é rapidinho”, ela se apressa em pegar seu aparelho nas mãos e abrir a entrevista da Rua do Beco dos Amigos, casa 11A.

“Ah, estou fazendo um churrasquinho lá nos fundos, está convidada”, e mostra a faca com cabo de madeira com linhas de sangue bovina.

O homem vira-se de costas e entra no ambiente, escuro e frio. Passa no meio de uma cozinha armada entre a mesa e pia recheada de alimentos e pratos sujos e jogados por todos os lados. Aos fundos do ambiente uma porta é revelada, a fumaça sai por detrás da abertura, “vamos aqui nos fundos, junte-se a nós”. A jovem avança por dentro da cozinha e chega até o quintal dos fundos. Por lá estavam mais dois homens em volta de uma churrasqueira de tijolos armadas no chão, com uma grelha quebrada e ajustada na parte alta do forno improvisado. “Pode falar, quer uma carninha?”. Ele puxa para si um mocho de madeira no chão do quintal. Os dois homens a analisam de forma detalhada, e olham-se um para o outro, depois de um curto silêncio. O homem corpulento que a atendeu, dá uma leve gargalhada para quebrar o gelo, e verifica que ela está parada em frente a porta, já pontuando com uma caneta metálica com ponta seu aparelhinho moderno.

“Então, quantas pessoas moram nesta casa?”, ela começa. “Nenhuma”. “Ela é de outro morador, parente?”. “Ela é nosso escritório de trabalho”. A pesquisadora tira o computador de frente do rosto, e já preparada para encerrar a entrevista, já que se tratava de um suposto caso de estabelecimento comercial, ele solta mais uma risada constrangedora, “É brincadeira, eu moro aqui. Só eu, eles estão de visitas”, e olha para os dois homens que a analisam sem ao menos soltar um sorriso. “Mas porque você não visitou as outras casas?”, ele pergunta empolgado. “Esta pesquisa não é o Censo, a contagem da população. Estou fazendo a pesquisa de empregos, ela é por amostragem e só algumas casas são sorteadas, estão aqui na planilha”, ela indica com a mão os endereços que estava marcados na folha de ofício impressa.

“Ah, deixa eu ver”, o homem analisa alguns endereços falando o nome de cada uma das pessoas entrevistadas no Bola Sete. Cita quase que uma por uma as pessoas moradoras dos endereços indicados. “Ah, já foi nesta aqui?”, e marca com os dedos gordurosos a casa de número 45 do mesmo beco. “É o Moacir, ah você vai lá, tem certeza?”, os outros dois homens caem numa longa gargalhada, que faz com que o Wolverine se assuste levantando-se de uma leve soneca que tirava aos pés da churrasqueira. “Ele é louco. E tarado”, fala um dos amigos do dono da casa, “como ele também, mas um pouquinho menos” indicando com o dedo o anfitrião que disfarça.

“Bom, vamos lá”, e tira a planilha das mãos do homem. “Seu nome, data de nascimento”. “Nome? Meu nome cê quer saber pra quê, e data de nascimento porquê? Bota aí, José da Silva, dia trinta e um de fevereiro de setenta. Hahahahahaha!” Os dois homens sorriem e um deles diz, “ele não vai dizer nome não, ainda mais agora que tá procurando se livrar de umas encrencas”. “Então, o senhor é empregado, dono do negócio?”, marca no aparelho algumas opções batendo a canetinha no visor. “Estou procurando novos trabalhos, bota aí”, ela sente exalar um bafo quente de álcool vindo de suas entranhas, seus dentes amarelados e quebrados ainda tinham pequenos pedaços de carne que ele insistia em tentar tirar com a ponta da faca numa cena que beirava o grotesco.

A entrevistadora acelera o ritmo das perguntas e já vai marcando algumas delas para se livrar logo daquela situação. O homem não iria colaborar, e estava somente rindo de suas perguntas. Era o tipo de entrevista que não ia dar em nada, o melhor era desistir e falar para seu supervisor que a casa estava desocupada, como é de praxe para solucionar o problema e não ser cobrada logo depois para retornar ao lugar e retomar a entrevista. Mas ela decide tentar pelo menos mais uma vez, promete para si mesma que a última.

“Até quando o senhor foi a Escola, sua escolaridade?”. “Eu fui até a terceira série, tá. Mas eu sei escrever”. “Só o nome e olhe lá, mas ler só se for número, e nota de dinheiro, mais de cinquenta”, se diverte um dos homens ao fundo, para a brincadeira geral. “Sua cor de pele?”. “Olha para minha pele, não tá vendo, é esta”. “Branca, preta, parda?”, ela tenta ajudar. “Oh, dizem que eu sou moreno, mas pode botar branco aí porque pra preto eu não sirvo”, e aponta para um dos amigos, “preto é ele, parece um carvão, e é safado que só”. “Sou preto não”, se defende o amigo, “no máximo marronzinho”. “Marrom é merda de gente, seu verme, você foi cagado pela sua mãe, hahahahahahahaha”. Um dos homens a ameaçou: “Para que tanta pergunta?”. “É um interrogatório esta tal de pesquisa de emprego? Eu não quero trabalhar, não. Vá embora”.

A jovem entrevistadora já estava cheia daquela situação. Reparou que ao fundo havia vários engradados de cerveja e muitas latinhas jogadas ao chão, assim como uma garrafa do que parecia alguma bebida destilada barata aberta pela metade próximo à parede lateral. Enquanto os homens se divertiam com as perguntas, ela virou-se para a frente do terreno, focou o portão de saída, e pensou em dar o fora como resposta. Ela viu no seu aparelho digital as perguntas que abririam para os desempregados, do tipo, há quanto tempo estava sem emprego, e qual foi seu último trabalho considerando mesmo aqueles sem carteira assinada e de trabalho informal? Quando ela iria desligar seu aparelho e jogá-lo dentro de sua pequena mochila, estouros de fogos de artifício pipocaram no céu, e ao longe ela ouviu gritos vindo de casas vizinhas, “sujou, sujou, a polícia, polícia, os canas tão subindo”.

Os dois homens sentados no caixote se levantam e se entreolham preocupados, um deles puxa por debaixo de uma almofada onde estava sentado um revólver pequeno com cano curto. O homem entrevistado, a empurra para dentro da cozinha, e corre para a porta da frente a fechando. “Todo mundo quieto, entrem”. A entrevistadora tenta correr para a porta e abri-la quando um dos homens se coloca na frente dela, trava a porta retirando a chave do trinco. Coloca a chave no bolso e olha ameaçadoramente. “Deixa eu sair, eu resolvo lá fora”, suplica a moça com a primeira insistência. “Você não vai sair nada, você tá com a gente, e vai sair depois que a poeira baixar”. A sirene ininterrupta soava estridentemente, e cada segundo que passava ela aumentava de volume. Os fogos pararam de pipocar, e agora só se ouvia latidos de cachorros e um choro isolado de uma criança de berço. “O que que está acontecendo?”, ela se vira para um deles e tenta entender o porquê de tanta agonia e desespero entre os homens. “Para de fazer pergunta, chegaaaaa! Cala a boca, silêncio, sem perguntas”, fala o mais baixo deles, diminuindo o tom do pedido no final da frase a tornando quase que imperceptível.

Em menos de um minuto a sirene barulhenta cessa. Os lancinantes latidos dos cachorros na rua dão lugar ao rosnar compulsivo de toda a matilha do beco. O homem corpulento se aproxima da persiana ao lado da porta e olha entre as frestas das placas de plástico. Os pequenos buracos denunciam. “Ih, caralho, eles estão no portão”, anuncia com sussurros. “MARCÃO, BOLA e EDGAR, temos informações que vocês estão aí, saiam com as MÃOS levantadas e calmamente”, uma voz grave anuncia num megafone que preenche a cozinha. A jovem entrevistadora sabia que estava na maior enrascada que havia se metido. Com a mão no rosto ela fica acocorada ao lado de um fogão e começa a rezar baixinho. Vê que suas mãos tremem compulsoriamente e começa a choramingar. O pânico a deixa tão nervosa que ela não percebe que um dos homens está apertando seu braço com muita força pedindo para ela parar de soluçar, para não chamar a atenção dos canas.

“Vou contar até três, se não saírem nós vamos invadir, vamos invadir”. O homem que há poucos minutos respondia a entrevista, vai até um armário aos fundos e de dentro dele tira uma pistola reluzente. “Nós não vamos cair de novo, não vamos, vamos lutar!”. A menina percebe que um deles vai para os frisos da persiana e gesticula com os outros comparsas, indicando que os invasores já estavam dentro do terreno.

A pesquisadora percebe que a porta dos fundos está ligeiramente aberta, era sua chance de escapar. Num movimento, ela tira das costas a mochila e dispensa seu aparelho e planilha em cima do fogão. Levanta-se bruscamente, e percebe que o braço que a segurava agora estava livre. Calcula quatro largos passos até a saída, e olha em volta. Dois homens estavam na porta com as armas em punho, o terceiro estava do lado dela mas olhava para o chão como que planejando sua próxima ação.

“TRÊSSSS”, os policiais gritam de dentro do terreno, ela dá um salto para a porta dos fundos e sente um braço a pegar pelo pescoço. Ela ainda tenta agarrar o fogão para se desvencilhar da chave apertada no pescoço, mas percebe que agarra apenas o aparelho digital de pesquisa. Ela começa se debater para se desvencilhar, e sem sucesso, tenta lançar o aparelho no rosto do seu agressor. Erra feio o lançamento e ouve o pequeno objeto se espatifar ao meio da sala, e sente junto a isto uma pancada forte no rosto de um objeto que não sabia precisar se era uma mão ou um pedaço de madeira. Ela ouve os gritos de dentro e de fora da casa e as ameças dos seus agressores. Balbucia algumas palavras enquanto é arrastada para os fundos da sala. Desvanece...

Ao abrir os olhos lentamente, sua visão embaçada começa a perceber que algo ainda estava acontecendo. Ela sentia uma dor enorme na cabeça e sentiu que estava deitada. Uma mão acomodada no seu ombro a surpreende e quando ela dá um salto para tentar se desvencilhar dos homens que antes a cercavam, ela nota que estava dentro de um carro. “Calma, moça. Você está numa ambulância. Já passou, passou”. “O que aconteceu, e os homens que me agrediram?”. Ela tenta levantar-se de uma maca, e surpreende-se ao perceber que as duas mãos de uma moça de avental branco a seguram. “Calma, precisa descansar, vamos averiguar você no ambulatório, mas achamos que está tudo bem”.

A menina percebe a porta aberta da ambulância vermelha, e de dentro da cabine ela enxerga o homem corpulento e lustroso agora sem camisa, algemado com as mãos nas costas e sendo conduzido por dois homens fardados. “Como acabou?”, ela indaga. “Eles se entregaram depois de uma negociação, disseram que você estava dentro da casa”. “Mas teve tiroteio ou algum ferido?”. “Parece que não, eles queriam garantias que sairiam ilesos. Você ficou dentro da casa com um deles como garantia, até todos se entregarem”.

Na entrada da van, um policial se aproxima e pergunta, “Ela está bem?”. “Está. Mas ainda está um pouco assustada com tudo”. “Tudo bem, são só algumas perguntinhas”. Ele se vira para a jovem, “pode responder algumas rápidas perguntas?”. Com a tala no pescoço que a imobilizava, a menina levantou o punho e com o polegar direito em riste sinalizou ao oficial afirmativamente.

“Qual seu nome, data de nascimento?”, e ia anotando as respostas. “Com quantas pessoas você se deparou nesta casa? Que horas eram?”, “O nome que eles deram para você”, “Que tipo de respostas eles davam para suas perguntas?”, “Você viu algum objeto que pudesse ser suspeito?”, “como eles reagiram quando foram surpreendidos. Como eles te agrediram?”.

“Desculpe policial, eu sei que é seu trabalho, mas para que tantas perguntas?”.