ESTAR SÓ

A vida é feita de opções e devemos usá-las de acordo com nossas necessidades, que nascem a partir do que nos aconteceu durante a nossa existência. Maturidade é poder fazer as escolhas de acordo com a máxima budista: “Se algo te faz mal, afaste-se!”. Vejo nesta frase a saída para manter a sanidade, o caráter, a nossa personalidade, sem que precisemos nos prostituir aderindo ao que os outros “acham” que deveríamos fazer.

Todas as pessoas que possuem opiniões fortes, personalidade marcante e à prova de persuasões e argumentos que não fazem parte de nosso Ser, sofrem muito. É daí que nasce a inveja dos fracos; a maledicência dos que não são completos e nem felizes; o ódio dos que não suportam sua própria companhia e vivem se corrompendo diante da opinião alheia, dos modismos, dos “achismos”, para serem aceitos. Ninguém precisa ser aceito e muito menos mudar para que isso ocorra.

A maldade humana é fruto da infelicidade dos que não podem ser a sua essência, maculando-a ao agirem como camaleões.

Eu não preciso e não quero fazer parte da massa de humanoides vazios e fúteis. Por isso fiz minha opção: ficar só. O que não significa ficar solitária. As pessoas fazem muita confusão em relação a isso. Ser só é gostar de sua própria companhia e não despejar em cima do(s) “outro(s)” suas expectativas de realização.

Não, a felicidade não está à venda em lojas de grife, em joias, em festas repletas de futilidades, onde um quer ser mais do que o outro, quer aparecer e se destacar, como se isso garantisse uma boa noite de sono e a felicidade.

Ser só é não dar mais a outra face aos que não souberam amar, se solidarizar, serem amigos. Ser só é se preservar em meio ao mundo atual, frequentado por bestas feras que somente sentem prazer acreditando que humilharam o outro. Mas quando não conseguem alcançar seu intento e percebem que não conseguiram atingir seu alvo, que continuou a manter seu jeito de ser e ignorou os algozes, são capazes das maiores baixezas. Ah, como anda pobre este nosso mundinho!

Estar só é estar em paz, fazendo o que quer e na hora em que desejar, sem que tenha que seguir tendências, se submeter aos “achismos” dos demais. É ser íntegro, inteiro, completo por amar de forma intensa a si mesmo.

Perdi meu pai há 28 anos, mas o tenho em meu coração e em minha mente. A minha estranha sensibilidade permite que eu me conecte, em pensamentos e sonhos, com meus amores que já se foram, como ele que, em sonho, me disse para eu não ceder em relação aos que nada fizeram por mim e que ainda pisaram no momento de minhas maiores dores, pois poderiam causar mal ainda maior. Isso traduz o meu pensamento de que não posso perdoar, mas posso esquecer; não quero ferir, mas sim ignorar. O outro, que me causou mal, eu apago de minha vida, como se nunca tivesse existido. E, para minha própria sobrevivência, não sou capaz de estender as mãos. Sou humana e, por ser assim, me reservo o direito de virar as costas aos que não me acrescentam nada.

Meu velho índio era um sábio de poucas palavras, mas tinha a mesma inclinação que sua filha, viver a vida dele, no canto dele, afastando-se de todo o mal. Amém!

Saudades eternas.

Laís fechou carta que acabara de receber de sua amiga, que não via há tantos anos. Ela fora testemunha da vida que a amiga teve, marcada por solidariedade, lágrimas, decepções e muita dedicação aos que amava e a amavam. Mas todos eles se foram e a amiga se isolou. Laís sempre acreditou que este isolamento se devia ao sofrimento pelas perdas, à doença emocional que a acometera por ocasião das piores fases. Mas a carta desmentia o que ela sempre pensara.

Laís pegou a bolsa e resolveu dar uma volta, perto da natureza, onde pudesse refletir sobre tudo o que acabara de ler. Sim, a amiga amadureceu e continuava, ao mesmo tempo, a mesma: nunca cedendo aos demais, sendo sempre autêntica.

Sua vida também não fora fácil, mas ela não suportava estar só. Precisava se cercar de pessoas, mesmo sabendo-as falsas, para se sentir viva.

Ultimamente estava lendo alguns dos excelentes livros da Lya Luft e, de uma forma diferente, sentia que a amiga possuía a mesma lucidez da autora.

Não, sua vida fora uma sucessão de erros, cheias de amizades fúteis; amores vazios; copos e mais copos de bebidas para entorpecer lhe a alma, para não “sentir”. Por dentro estava cheia de feridas e nutria uma tristeza que os anos aumentavam ainda mais. As rugas, a vista cansada, a perda do viço juvenil, tudo isso a fazia sofrer demais. Sua amiga estava certa, não deveria se permitir seguir as normas sociais para ser aceita. E agora?

Laís emborcou de dor, uma dor intensa que vinha do fundo de sua alma. Por que não procurara a amiga antes? Talvez, ouvindo-a, tivesse tomado outro rumo e não fosse o rascunho do humano flagelado intimamente.

A carta de Luísa parecia uma despedida, mas havia telefonado para a casa dela e constatou que não somente a outra estava feliz, como cheia de saúde. Por que “saudades eternas”?

Como um autômato seguiu em direção a um penhasco de onde vislumbrava uma paisagem de sonhos. ... “saudades eternas”? .....

E, como um fantoche, o que nunca deixara de ser, despencou rumo a uma possível completude.

Campos dos Gpytacazes, 12 de novembro de 2014 – 11:39 horas

Emar
Enviado por Emar em 12/11/2014
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